Novos votos, novos dilemas

Ilustração: Andrêi Popov

Ilustração: Andrêi Popov

A política russa tem situações bem específicas que afloraram no pleito de 8 de setembro.

As eleições regionais e municipais realizadas no dia 8 de setembro puseram em evidência as especificidades da política russa. Os eleitores chegaram a ver o que são eleições com a máquina administrativa quase desativada, que os moscovitas possuem uma maior liberdade de escolha do que os provincianos, que a apatia política é geral e que as autoridades são incapazes de mobilizar seus apoiadores. Como resultado, ficou claro que o poder pode ser tomado por pessoas antes consideradas não aptas a governar. 

O dia único de votação para as eleições regionais e municipais revelou cinco problemas. Cada um deles precisa, pelo menos, ser discutido e, na melhor das hipóteses, solucionado. As eleições para prefeito de Moscou mostraram que uma campanha eleitoral, da candidatura à contagem de votos, pode ocorrer sem pressão administrativa maciça, o que é completamente novo para a Rússia pós-soviética. O uso muito limitado de enormes recursos administrativos à disposição do Poder Executivo deixou confuso o próprio Executivo e a oposição. O prefeito em exercício Serguêi Sobiânin e sua equipe ficaram surpreendidos com seu resultado relativamente baixo, suficiente para a vitória, mas pequeno para demonstrar a credibilidade incondicional do atual governo da capital russa junto à população. O candidato oposicionista Aleksêi Naválni, indicado pelo partido RPR-Parnas (Partido Republicano da Rússia - Partido da Liberdade do Povo), e seus apoiadores também foram surpreendidos. Uma coisa é falar sobre supostas fraudes, outra é apresentar provas convincentes. Diante das violações e fraudes detectadas nas eleições anteriores, as irregularidades registradas nas eleições para prefeito de Moscou parecem pequenas. Quando a máquina administrativa é desativada, é hora de pôr em ação uma política que pressupõe a busca de alianças e a luta de verdade com os oponentes. Nem o governo nem a oposição estavam preparados.

O segundo problema é um hiato relevante entre as práticas eleitorais em Moscou e no resto da Rússia. Ilegalidades como o cancelamento injustificado do registro de candidatura, o uso generalizado do “filtro municipal” para colocar contra o favorito concorrentes notoriamente fracos, pressão sobre os adversários fortes e o uso ativo da máquina administrativa para a coleta de votos – de um banal“carrossel” em que grupos de pessoas são transportadas em ônibus e automóveis fretados para votar em várias mesas eleitorais à pressão sobre os funcionários públicos e retirada dos observadores – não faltaram nas unidades da Federação durante o único dia de votação. 

As desigualdades entre a capital e as unidades da Federação, inclusive no que se refere à liberdade de escolha em Moscou e na província, tornou ainda mais evidente o hiato entre a situação jurídica dos moscovitas e dos demais habitantes do país. Isso pode ter um impacto negativo não tanto durante as campanhas eleitorais, mas no período posterior. Moscou e os moscovitas são encarados negativamente nas províncias por serem considerados mais ricos do que as outras regiões do país. Agora podem causar uma antipatia maior por possuírem maior liberdade de escolha. 

O terceiro problema é o baixo comparecimento às urnas. Em Moscou, isso favoreceu Aleksêi Naválni e a oposição; nas demais regiões, os candidatos governistas. No entanto, independentemente dos resultados, a recusa de muitos cidadãos em ir às urnas mostra a indiferença para com o sistema político. O fato de a população encarar a política como algo estranho deve preocupar o governo e a oposição. É comum atribuir o baixo comparecimento às urnas à apatia do eleitor. Na verdade, os políticos são incapazes de gerar ideias que interessem à população. A lacuna não pode durar para sempre. Mais cedo ou mais tarde, surgirão pessoas capazes de oferecer à população coisas inteiramente novas, o que levará ao colapso do atual sistema político, como aconteceu nos anos 90 na Bielorrússia e na Itália. A natureza política não admite vácuo. Quando os políticos oficiais não podem oferecer à população nada de interessante, surgem outros para formar um novo sistema. A vitória de Evguêni Roizman nas eleições para prefeito de Iekaterinburgo e o sucesso dos candidatos pelo partido Patriotas da Rússia em Krasnoiarsk são exemplo disso. Políticos como eles não foram admitidos a governar durante longo tempo. Agora, têm seu caminho desimpedido. Esse é o quarto problema. 

O quinto problema é o de que os governantes não estão conscientes de que as regras de jogo por eles impostas não agradam à minoria ativa nem mobilizam a maioria conservadora. As fortalezas caem quando não têm quem as defenda. O governo deve estar interessado em revelar uma iniciativa política, mas, a julgar por aquilo que foi feito nos últimos anos, ele não deseja revelá-la nem discutir esse assunto.

 

Gleb Tcherkassov é vice-editor-chefe do jornal Kommersant

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