Por que (não) boicotar Sôtchi-2014?

Ilustração: Niiaz Karim

Ilustração: Niiaz Karim

Pretexto muda, mas mecanismo de boicote é sempre movido a política.

aprovação da lei que proíbe a “propaganda de relações sexuais não tradicionais para menores de idade” foi acolhida negativamente pela comunidade LGBT internacional e entidades de defesa dos direitos humanos. 

A reação era esperada e não preocupa o Kremlin. Cerca de 76% dos russos são favoráveis à nova norma e apenas  17% são contra. Leis estaduais semelhantes foram aprovadas em 11 das 83 unidades federativas russas. Mas a norma só foi aplicada quatro vezes na região de Arkhanguelsk e uma em São Petersburgo. As decisões judiciais tomadas em Arkhanguelsk, porém, foram contestadas na Corte Suprema da Rússia, que esclareceu, em um despacho especial, que nem todo ato público é propaganda. 

Mas os críticos da Rússia não querem saber. Acusam o país de seguir o caminho da Alemanha nazista e comparam o Holocausto à perseguição a gays na Rússia. Assim, sugerem transferir os Jogos de Inverno de 2014 para outro país. Pelo menos é exatamente isso o que pede o escritor e ator britânico Stephen Fry em carta aberta ao primeiro-ministro do Reino Unido e ao COI (Comitê Olímpico Internacional). 

Mesmo sendo um dos críticos mais duros do presidente Pútin, o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov é contra a campanha de boicote. “Como atleta profissional, não posso saudar o boicote aos Jogos de Sôtchi. Tais ações prejudicam injustamente os atletas, independentemente de suas opiniões pessoais”, disse em entrevista a uma emissora de rádio. 

Em um editorial de 27 de junho do "The New York Times" lê-se: “Os crescentes apelos de boicote às Olimpíadas de Sôtchi ganharão força. Isso não permitirá que os jogos se tornem o triunfo de Pútin”. 

A campanha é ativa, e os sites da grande mídia pedem incessantemente que usuários enviem histórias sobre problemas com homossexuais russos. Mas a tentativa de apresentar como protesto o beijo de duas corredoras russas é fruto da imaginação dos jornalistas. Ambas mantêm casamentos heterossexuais. 

Já que o problema dos gays preocupa tanto a grande mídia, por que a imprensa ocidental mantém silêncio em relação à situação dos homossexuais na Arábia Saudita, no Qatar, ou no Iraque, cujo novo governo foi criado sob o controle dos EUA? 

A ideia de boicotar os Jogos Olímpicos não é nova. O boicote aos Jogos de Moscou em 1980 devido à intervenção militar soviética no Afeganistão e a retaliação da URSS em relação aos Jogos Olímpicos de Los Angeles são exemplos claros das campanhas de boicote. Os pretextos eram diferentes, mas o mecanismo, sempre o mesmo. Não é nada pessoal, apenas política.

 

Andrêi Iliachenko é jornalista e colunista da rádio “Voz da Rússia”

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