"É difícil de imaginar pelo que os EUA estão sendo guiados, mas é possível pensar que quando tudo vai mal, eles acabam apertando qualquer botão que surge pela frente" Foto: Reuters
Em entrevista, Aleksandr Iakovenko, embaixador russo no Reino Unido, falou sobre crise na Ucrânia.
Gazeta Russa – De que forma a Rússia pretende colaborar com a investigação internacional referente ao acidente do Boeing?
Aleksandr Iakovenko – A Rússia foi a primeira a pedir uma investigação internacional independente. A resolução especial 2166 do Conselho de Segurança da ONU, referente a esse assunto, foi aprovada com a nossa participação ativa. Em uma entrevista coletiva especial no Ministério da Defesa [realizada em 21 de julho], apresentamos dados obtidos a partir de recursos técnicos de controle objetivo russo referentes ao que estava acontecendo no ar, no espaço aéreo sobre a Ucrânia, no momento do desastre do Boeing da Malásia. Na verdade, foram apresentadas informações da inteligência. E nós pensamos que o lado americano faria o mesmo, o que, infelizmente, não aconteceu.
Até que ponto pode ser cumprido o disposto na resolução do Conselho de Segurança da ONU referente à interrupção das hostilidades na área adjacente ao local do acidente? Quem irá fiscalizar o cumprimento das disposições?
O cumprimento dessa disposição depende inteiramente da vontade das partes envolvidas no conflito armado civil. As milícias propuseram repetidamente um cessar-fogo. Porém, somente no quarto dia após a catástrofe, Kiev anunciou o cessar-fogo, que, no entanto, não foi respeitado. Os ataques de artilharia aos assentamentos urbanos situados em áreas próximas ao local do acidente continuaram, inclusive com a utilização de morteiros.
Seria natural supor que algum tipo de fiscalização da aplicação da citada disposição poderia ser assumido pelos observadores da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa), que já se encontravam no território da Ucrânia. O seu mandato poderia ter sido ampliado adequadamente. Outra coisa é que o governo ucraniano, com pretensão de ser legítimo, tem total responsabilidade pelo que está acontecendo no país e pela criação dessa condição de guerra civil, sendo que apenas em seu contexto é que poderia ter ocorrido essa tragédia com o avião.
Qual foi o impacto do acidente do Boeing na situação política entre a Rússia e a UE? Novas sanções ameaçam a Rússia [esta entrevista foi realizada antes do anúncio das novas sanções por Washington e pela UE, na terça-feira (29)]?
Infelizmente, o acidente com o Boeing levou à exasperação da retórica voltada para a Rússia por parte de uma série de países da UE. Tentativas de impor novas sanções contra a Rússia estão sendo realizadas sob pressão dos EUA, sendo que isso acontece na ausência de quaisquer provas do envolvimento russo e das milícias nessa tragédia, como foi demonstrado pelo resultado de uma reunião fechada para a troca de informações das agências de inteligência dos EUA [realizada em 23 de julho].
A Europa está se transformando em uma jogadora independente no cenário internacional ou permanece na esteira da política dos EUA? Quais são os fatores que estão influenciando?
Gostaríamos muito de ver a Europa, a União Europeia, tornar-se uma jogadora independente nos assuntos internacionais. A Rússia está disposta a fazer parte de uma Europa assim. Outra coisa é toda a história com a crise na Ucrânia, supostamente desencadeada por um "projeto técnico" da burocracia de Bruxelas referente à associação da Ucrânia com a UE, e que está sendo vista como uma conspiração declarada contra a autonomia da Europa.
É difícil de imaginar pelo que os EUA estão sendo guiados, mas é possível pensar que quando tudo vai mal, eles acabam apertando qualquer botão que surge pela frente. É claro que está sendo sentido o impacto da situação atual, sem precedentes, quando de uma só vez “chegam” todas as consequências do fim da Guerra Fria adiadas no tempo. Na minha opinião, está se manifestando o despreparo geral das elites ocidentais diante de semelhante desenrolar dos acontecimentos, seja do ponto de vista político-psicológico ou na esfera intelectual.
Por que a Rússia é solidária com as milícias das autoproclamadas República Popular de Donetsk e República Popular de Lugansk (respectivamente DNR e LNR, nas siglas em russo)?
Nós nos solidarizamos com a DNR e a LNR não só porque se trata de cidadãos que falam a língua russa e com quem vivemos por um longo tempo em um contexto de Estado único e aos quais estamos ligados por diferentes laços: históricos, familiares, econômicos e outros. Simplesmente, essas pessoas estão se manifestando em defesa dos seus direitos reconhecidos na Europa, incluindo os direitos das minorias, e que estão lhes sendo negados pelo atual governo ucraniano. Eles querem apenas uma coisa – resolver todos esses problemas por meio de negociações políticas com Kiev. Se Kiev estivesse disposto a negociar e tivesse dispensado o uso da força para reprimir a população dessas regiões, em princípio, não teria ocorrido qualquer guerra civil no sudeste da Ucrânia.
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