Síria e Irã: um balanço da diplomacia russa em 2013

Diplomacia russa alcançou sucessos em muito devido ao fato de os seus interesses coincidirem com os interesses básicos dos principais atores mundiais Foto: Reuters

Diplomacia russa alcançou sucessos em muito devido ao fato de os seus interesses coincidirem com os interesses básicos dos principais atores mundiais Foto: Reuters

Em 2013, diplomacia russa teve algumas vitórias importantes, embora não sem reveses, analisa Andrêi Iliachenko.

Com o fim da Guerra Fria, as ameaças se transferiram para o nível regional e a principal conquista de 2013 é que o mundo conseguiu, precisamente, evitar novas guerras regionais. Na agenda do dia constava uma guerra "humanitária" contra a Síria e um ataque de desarmamento ao Irã. No entanto, pela via da diplomacia se conseguiu, pelo menos, adiar esses conflitos.

Tanto em um como em outro caso, Moscou teve um papel importantíssimo, ditado por seus interesses nacionais.

No que diz respeito à Síria, a posição básica da Rússia foi a de que o conflito interno não deve se tornar um pretexto para uma mudança de regime feita a partir do exterior, mesmo que em forma de sanções da ONU, como aconteceu, por exemplo, na Líbia. A ONU não foi criada para isso. O futuro político da Síria deve ser decidido pelos próprios sírios, com a ajuda, o apoio e a mediação da comunidade internacional em diálogo político. Com base nisso, a Rússia, juntamente com a China, vetou três vezes no Conselho de Segurança da ONU resoluções que na sua essência visavam a derrubada do atual presidente Assad.

Paradoxalmente, se juntaram o restante dos países do Grupo dos Oito à Rússia. Esse foi precisamente o resultado da cúpula do G8 na Irlanda, onde foi atingido o consenso quanto à necessidade de uma solução política na Síria.

É verdade, no entanto, que o motivo que moveu os outros parceiros da Rússia foi um pouco diferente. No verão se tornou claro que a principal força de oposição armada a Assad eram agora organizações islâmicas radicais que compartilham os princípios e métodos do Al Qaeda. Isso não é do interesse nem do Ocidente nem dos regimes árabes seculares e da Rússia. Para a Rússia, onde poderosas comunidades muçulmanas estão concentradas não só no Volga e no Cáucaso, mas também em Moscou, a importação espontânea do Islã radical da Síria constitui uma ameaça direta. Por isso, Moscou e Washington concordaram em realizar rapidamente a conferência de paz sobre a Síria.

No entanto, o uso de armas químicas nos arredores de Damasco, cuja autoria se atribuiu às forças do governo, forçou Obama a ir por um caminho que ele evita cuidadosamente –o militar. E foi Lavrov quem salvou a situação.

Sem entrar na questão de quem utilizou ou não as armas químicas, Moscou convenceu Assad a aceitar a eliminação total de seus arsenais químicos. Isso neutralizou os argumentos daqueles que gostariam de puxar os EUA para um conflito regional. Neste momento está precisamente sendo efetuada a destruição do complexo químico-militar da Síria. O que recebeu o mundo com isso?

No Oriente Médio, conseguiu se manter a estabilidade estratégica. O regime de luta contra a proliferação das armas de destruição em massa ficou mais fortalecido e ficou também mais reforçado o papel do Conselho de Segurança das Nações Unidas na manutenção da paz. Esses resultados podem ser utilizados por toda a comunidade internacional.

O cenário militar foi evitado também no caso do Irã. Moscou, apoiando as sanções da ONU contra o Irã, exigiu sempre, no entanto, que a questão nuclear iraniana fosse resolvida à mesa de negociações. A Rússia, tendo fronteira terrestre com o Irã, além de defender os princípios das Nações Unidas, tem como objetivo evitar não só o desenvolvimento do programa nuclear militar, mas também os tumultos populares causados ​​pelas sanções ocidentais e o caos gerado por um eventual ataque militar.

Neste espírito surgiu ainda há dois anos o Plano Lavrov, que apresentava um projeto de eliminação progressiva do programa nuclear do Irã, em troca de um levantamento gradual das sanções. Passo a passo, para nos afastar da "linha vermelha". Este princípio acabou entrando na base do acordo provisório entre Teerã e o G6, alcançado em novembro. Por enquanto os acordos estão limitados a um período de seis meses. E nada preveem as pequenas negociações sobre o acordo fundamental que deve eliminar as principais preocupações da comunidade internacional e permitir ao Irã desenvolver com segurança a sua indústria nuclear civil e, o mais importante, eliminar a ameaça de conflito na região. Muita coisa vai ser decidida em 2014.

Deve se ressaltar que a diplomacia russa alcançou esses sucessos em muito devido ao fato de os seus interesses coincidirem com os interesses básicos dos principais atores mundiais. No entanto, às vezes isso não é suficiente.

O ano de 2013 ficou também marcado pela crise nas relações russo-americanas. Formalmente, ela deveu-se à fuga para Moscou de Edward Snowden, que expôs alguns dos segredos da NSA (agência de segurança americana). É evidente que Washington ficou extremamente irritada e preocupada por aquele “procurador da verdade” norte-americano se encontrar fora do alcance da justiça americana. No entanto, fica difícil de acreditar que este tenha sido o verdadeiro motivo para o cancelamento da visita de Obama a Moscou. Isso aconteceu apenas na era dos confrontos entre Khrushchev e Eisenhower durante a Guerra Fria.

Muito provavelmente, o governo norte-americano compreendeu que se Obama regressasse de Moscou sem Snowden, isso seria mais um motivo para acusá-lo de fraqueza. E Pútin, ante todo o desejo de restabelecer o diálogo com o presidente norte-americano na sequência da cooperação no caso da Síria e do Irã, não tinha de todo o desejo em se dobrar perante os Estados Unidos. Relações com base na igualdade –esta é a posição doutrinária da atual política externa russa.

No entanto, não é possível dizer que o diálogo russo-americano tenha parado. Pútin e Obama conversaram em privado na cúpula do G20, em São Petersburgo, após o cancelamento da visita a Moscou. É óbvio que eles têm novo encontro, desta vez em Sôtchi, no verão de 2014, onde será realizada a próxima cúpula do G8. Talvez por essa altura, os diplomatas dos dois países consigam encontrar base para um compromisso.

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