Anistia Internacional denuncia passividade perante abusos dos direitos humanos

Garoto que pertence a grupo nômade brinca entre escombros de casas demolidas Foto: Mugur Varzariu/Anistia Internacional

Garoto que pertence a grupo nômade brinca entre escombros de casas demolidas Foto: Mugur Varzariu/Anistia Internacional

Relatório da ONG analisa a situação em 159 países e destaca que este ano na Rússia foram aprovadas leis que restringem a liberdade de expressão, associação e agrupamento. A própria entidade está enfrentando uma situação difícil no país após a promulgação da nova lei sobre as ONGs.

A Anistia Internacional apresentou nesta quarta-feira (22) o relatório anual sobre a situação dos direitos humanos (DH) no mundo. O documento descreve a situação em 159 países ao longo de 2012 e início deste ano. Em nível global, a ONG destaca que a “passividade mundial no campo dos direitos humanos está transformando o mundo em um lugar cada vez mais perigoso para os refugiados e imigrantes”. Nesse sentido, a organização acredita que tem sido mais difícil para os refugiados atravessarem fronteiras do que os armamentos.

O relatório afirma que “o Conselho de Segurança da ONU deve sempre enfrentar os abusos que destroem vidas e obrigam as pessoas a deixar suas casas, e que o respeito pela soberania do Estado não pode ser utilizada como um pretexto para a inércia”.

A apresentação realizada em Moscou contou com a participação de Serguêi Nikitin, diretor do escritório da ONG na capital russa, junto com Eduard Nizirski, seu homólogo holandês. Segundo o último, “todos os anos milhares de pessoas são detidos não porque violaram a lei ou cometeram algum crime, mas para facilitar sua expulsão do país ou impedir sua permanência. Apesar de existir alternativas, a detenção é uma prática generalizada”.

Números


Tortura foi exercida em 112 países

Liberdade de expressão foi limitada em 101 países

Julgamentos injustos em 80 países

15 milhões de pessoas registradas como refugiadas

Nesse contexto, Nizirski recordou o suicídio do russos Aleksandr Dolmátov em um centro de deportação da Holanda em meados de janeiro. Esse ativista da oposição havia solicitado asilo político, porque temia ser detido após participar do protesto em maio do ano passado. A Anistia Internacional pede uma investigação independente e questiona “a atual política de imigração da UE, pois considera que todas as pessoas devem ser tratadas com dignidade”.

“Fatores econômicos, bem como as medidas antiterroristas e a pressão imigratória, dificultam a situação. Há inúmeros fatores. De um modo geral, no precário equilíbrio entre o mercado e os direitos humanos, parece que tendem mais para o primeiro e, na minha opinião, a ascensão da China tem a ver com essa tendência”, disse Nazarski, ao ser questionado se a piora na defesa dos direitos humanos na Europa tinha relação direta com a crise financeira pela qual passa o continente. 

Situação na Rússia

Serguêi Nikitin, diretor do escritório da ONG em Moscou, falou sobre o “deterioramento da situação na Rússia ao longo do último ano”. Segundo ele, “foram aprovadas várias leis que restringem as liberdade de expressão, associação e agrupamento”. Assim, denunciou a sentença contra o grupo punk feminino Pussy Riot e a discriminação sofrida pela comunidade LGBT no país.

A nova lei sobre ONGs, que obriga essas organizações a se registrar como “agentes estrangeiros” caso recebam financiamento do exterior e estejam ligadas à atividades políticas, também foi outro tema de destaque. Nazarski relembrou que a Anistia Internacional assinou um manifesto de solidariedade com outras organizações e “continua se esforçando para o desenvolvimento da sociedade civil russa”.

Nikitin relatou como agentes de fiscalização estiverem presentes na sede da ONG em Moscou em meados de fevereiro. Um material extenso foi apreendido após uma visita surpresa que durou cinco horas, e em que também estava presente o canal de televisão NTV. “Essa é uma campanha nacional para estreitar o cerco às ONGs”, disse.

“Não trabalhamos para derrubar o governo, mas para defender os direitos humanos. Isso é universal e não se pode dizer que é uma questão exclusivamente interna”, acrescentou Natalia Táubina, diretora da ONG Veredito Público, que se dedica à assistência jurídica a cidadãos em sua comunicação com as autoridades.

Táubina explicou as dificuldades e incertezas que muitas organizações enfrentam hoje em dia. “Declarar-se como ‘agente estrangeiro’ é como dizer que você é um espião, mas nós trabalhamos na e pela sociedade russa. Essa medida nos marginaliza, além de ser uma mentira.” Paralelamente, a diretora da ONG falou sobre o quão complicado é obter financiamento privado na Rússia. “Vai ser praticamente impossível obter subsídios, porque somos independentes. Embora, na teoria, seja possível conseguir financiamento privado, há muitos sinais que nos desestimulam, como o caso de Khodorkóvski.”

A advogada recordou ainda que sua organização aguarda a resposta do Tribunal Europeu de Direitos Humanos de Estrasburgo, depois da reclamação apresentada pela ONG em fevereiro passado. Mesmo assim, Táubina explicou que a Rússia “não dá atenção devida às sentenças, de modo que o tribunal acaba perdendo seu poder”.

A Anistia Internacional também declarou que “ao longo do ano não foram adotadas medidas eficazes para garantir a independência do poder judicial e há inúmeros casos de julgamentos injustos”.

Notícia esperançosa

Serguêi Nikitin falou de um “importante avanço ao longo do ano”. O Tratado sobre o Comércio de Armas, adotado pela ONU em abril, no qual apenas três países votaram contra, pode colocar um freio às transferências de armas que seriam usadas para cometer atrocidades. “Isso mostra que o trabalho conjunto entre ONGs, instituições internacionais e governos ao redor do mundo pode dar frutos. É um processo lento, mas necessário”, finalizou.

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