Illustração: Javier Aguilar
Durante a Guerra Fria, a propaganda soviética era um poderoso veículo de confronto global. Com o fim do mundo bipolar, a Rússia encerrou quase todos os instrumentos de comunicação com o público estrangeiro. Afinal, o país estava à beira da falência e havia outros itens da agenda mais urgentes a serem tratados.
Essa situação mudou há alguns anos, quando os novos líderes russos perceberam que suas ações eram mal compreendidas no Ocidente. O presidente Pútin deu início ao renascimento da agência de notícias estatal RIA Nóvosti e criou um novo canal de TV internacional, Russia Today.
Com o estabelecimento de reuniões anuais entre especialistas do grupo de discussões Clube Valdai e Vladímir Pútin, e a nomeação da cidade russa de Sôtchi como sede dos Jogos Olímpicos de Inverno 2014, o número de projetos de comunicação voltados para o público externo continuou a crescer.
Em 2007, a fundação Russki Mir (Mundo Russo, em português) foi criada para promover a língua russa no exterior. Mais tarde, foi unida a uma fundação de diplomacia pública, cujo nome homenageia o chanceler russo do século 19, Aleksandr Gortchakov.
O projeto de mídia Russia Beyond The Headlines (Rússia Além das Manchetes, em português), do qual a Gazeta Russa faz parte, também se tornou parte fundamental do sistema de comunicação externa da Rússia.
Todas essas agências reportam sucesso significativo em suas tentativas de estabelecer contatos com grandes massas estrangeiras. No entanto, não há nenhuma evidência de que a imagem internacional da Rússia melhorou nos últimos anos, o que levanta dúvidas sobre a eficácia dos esforços de diplomacia pública.
De acordo com Ígor Balk, membro executivo da Global Innovation Labs, a indústria de TI é uma das raras no setores da economia que não está sendo danificada pela desfavorável imagem internacional da Rússia.
Mas quando um mecanismo não está funcionando da maneira como se esperava, há duas perguntas a fazer. Primeiro, está funcionando? Segundo, ele está sendo usado da maneira certa?
Os mecanismos de diplomacia pública parecem estar funcionando bem em termos de números absolutos, já que a imprensa escrita e canais de televisão russos estão atingindo cada vez mais pessoas ao redor do mundo. Contudo, é difícil dizer que a imagem da Rússia está melhorando, apesar dos crescentes esforços.
A razão é óbvia: a mídia pode ser usada como uma ferramenta para compartilhar certa perspectiva e acabar com mal-entendidos, mas e se não houver mal-entendidos?
Os Estados Unidos enfrentaram um problema semelhante logo após a tragédia de 11 de setembro. Tentando melhorar as atitudes dos muçulmanos em relação os EUA, o país multiplicou seus esforços de diplomacia pública no Oriente Médio. Entretanto, o problema não era apenas uma percepção distorcida, como os políticos americanos haviam pensado. Muitos públicos árabes admiravam a cultura e o modo de vida norte-americana, mas discordavam da política externa dos EUA na região. O que os EUA precisavam era uma mudança na política, não uma explicação dela.
O mesmo pode ser o caso da Rússia. A cultura russa foi classificada no top 10 (de 50) pelos entrevistados da edição de 2009 do Índice de Marcas das Nações Anholt, enquanto a governança russa sequer ficou entre as 20 primeiras posições (ocupando o 43° lugar).
Ironicamente, a diplomacia pública russa não está focada na cultura e valores, o que poderia desenvolver uma atmosfera de confiança. Em vez disso, os esforços estão concentrados, sobretudo, na cobertura política, que pode ser útil, mas é insuficiente.
De acordo com o instituto mundial de pesquisa sobre opinião pública Pew Research Global Attitudes Project, o número de pessoas dizendo que são amplamente favoráveis em relação à Rússia diminuiu em 17 países entre 2007 e 2012, e aumentou em apenas três dos 27 considerados.
Na tentativa de reviver a experiência de comunicação internacional da época soviética, a Rússia moderna esquece uma parte muito importante. Não foi a propaganda que fez a União Soviética popular em certas partes do mundo, mas as políticas de desenvolvimento internacional, construção e educação. As ferramentas de comunicação eram apenas um meio de difusão da mensagem.
Reconstruir mecanismos de comunicação sofisticados podem ajudar a Rússia a promover sua cultura e valores, mas não suas políticas. É preciso refletir visões de outros países para as iniciativas de poder brando produzirem resultados. A Rússia construiu um mecanismo eficaz de distribuição de mensagem. Agora o país precisa melhorá-lo pelo desenvolvimento de uma comunicação de duas vias com os públicos estrangeiros e considerar opiniões de fontes externas no processo de desenvolvimento das políticas.
Aleksêi Dolinski é sócio da consultoria Capstone Connections. Ele passou vários anos trabalhando na diplomacia pública russa e lecionava sobre o assunto na Universidade Estatal de Moscou. Sua experiência de pesquisa inclui contribuições para o Centro Berkman para internet e sociedade, da Harvard, e para o Departamento de Operações de Manutenção da Paz das Nações Unidas. Atualmente trabalha com diplomacia corporativa na região Ásia-Pacífico e Europa. Dolinski concluiu o mestrado em Direito e Diplomacia pela Escola Fletcher e posteriormente defendeu tese de PhD em ciência política.
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