Rússia deve endurecer tom no cenário internacional

Ministro das Relações Exteriores da Rússia. Foto: AFP

Ministro das Relações Exteriores da Rússia. Foto: AFP

Como Pútin ainda não aprovou nova redação do Conceito de Política Externa, fontes do Gabinete da Presidência não descartam que algumas de suas disposições sejam reformuladas e saiam mais duras.

Em entrevista coletiva na última quarta-feira (23), o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguêi Lavrov, fez o balanço de 2012 e falou sobre a nova redação do Conceito de Política Externa do país. O documento será publicado logo após ser sancionado pelo presidente Vladímir Pútin.

Como Pútin ainda não aprovou o documento, as fontes do Gabinete da Presidência não descartam que algumas de suas disposições sejam reformuladas e saiam mais duras.

A nova redação do Conceito de Política Externa redigida pela diplomacia russa foi enviada ao Gabinete da Presidência no final de novembro do ano passado para ser aprovada e divulgada até o final de 2012. Na entrevista coletiva, Lavrov disse que o documento ainda permanece no Gabinete da Presidência.

Segundo informações disponíveis, ele ainda está sendo analisado por Pútin. De acordo com uma fonte do Kremlin, o presidente está dando atenção especial ao tema, fundamental para a política externa russa.

"É possível que algumas de suas disposições sejam reformuladas e saiam mais duras, porque devemos aumentar a luta contra as tentativas de intervir em nossos assuntos internos", disse a fonte.

O porta-voz da Presidência, Dmítri Peskov, confirmou que o documento está com Pútin.

"O presidente precisa de tempo para decidir sobre sua aprovação", disse o responsável, não descartando que Pútin possa fazer algumas alterações no texto.

Lei Magnitsky e Washington

Especialistas não excluem que a posição do presidente tenha sido influenciada pelos recentes desdobramentos nas relações com Washington e a aprovação da Lei Magnitsky. Na coletiva, Lavrov confirmou indiretamente essa hipótese.

"Ao escudo antimíssil se acrescentou um novo fator irritante, a Lei Magnitsky. Seus autores exploraram cinicamente a tragédia humana para ‘punir’ a Rússia e intervir no processo julgado pela Justiça russa, que ainda não está concluído", disse Lavrov.

"Os legisladores estadunidenses assumiram o papel de juizes em matéria vinculada a nossa vida interna", completou.

Ao se referir à retaliação russa, o chanceler disse que o governo da Rússia "tinha de reagir".  

"Essa não foi nossa escolha. Fomos forçados a fazer isso porque existem certas leis de relacionamento internacional que obrigam a não deixar ações como essas sem resposta", disse o ministro.

Lavrov advertiu que a Rússia continuará reagindo firmemente às "tentativas de interferir em nossos assuntos internos e nos pregar atitudes corretas em um momento em que os próprios pregadores não são impecáveis em muitos aspectos".

"Esperamos que a nova administração de Barack Obama tire conclusões dessa experiência triste e venha a agir conforme o combinado, ou seja, em pé de respeito recíproco, igualdade e vantagem mútua sem tentar intervir nos assuntos internos da outra parte", concluiu o ministro.

De acordo com o diretor do Centro Carnegie de Moscou, Dmítri Trênin, as declarações ásperas  do chanceler russo contra os EUA "ilustram a nova doutrina de política externa de Pútin".

"Cada mandato presidencial de Pútin foi marcado por uma nova política externa. Entretanto, a presente doutrina é fortemente direcionada ao cenário político interno e é mais isolacionista em relação ao Ocidente", disse o especialista.

Segundo ele, a tendência para o endurecimento da política para os EUA era observada já antes da aprovação da Lei Magnitsky e foi provocada pela nova frustração em relação aos EUA e ao Ocidente sofrida por Pútin, entre outras coisas.

A aposta do Ocidente em Dmítri Medvedev foi interpretada pelo Kremlin como tentativa de intervir nos assuntos internos do país, disse Trênin.

"Quando, após as eleições, na Praça Manejnaia, Pútin disse ‘vencemos’ com lágrimas de alegria, ele se dirigiu não só à oposição interna mas também àqueles que são considerados seus patrocinadores estrangeiros", disse Dmitry Trenin.

Segundo ele, a aprovação da Lei Magnitsky foi a última gota, que levou Pútin a "soberanizar" ainda mais a política externa do país. O especialista atribui a demora na aprovação da nova redação do Conceito de Política Externa ao fato de o Kremlin ter achado a versão proposta pela diplomacia russa como demasiadamente suave e não adequada às novas realidades no cenário internacional.

Uma fonte da diplomacia russa disse que, se o ministério receber novas orientações do presidente, ele fará ajustes necessários no documento tão logo que seja possível.

 

Publicado originalmente pelo Kommersant

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