“O mais corajoso entre nossos humildes comandantes e o mais modesto entre os bravos” — foi assim que o ditador Ióssif Stálin descreveu Grigóri Kotôvski, herói da Guerra Civil Russa e famoso líder militar do Exército Vermelho, cujo nome foi dado a ruas e até cidades na União Soviética.
No entanto, por incrível que pareça, esta pessoa tinha sido um bandido e um dos reis do submundo do Império Russo.
Assaltante destemido
Kotôvski nasceu perto de Chisinau, na Bessarábia (atual Moldávia), em 1881; era russo por nacionalidade, embora, segundo algumas fontes, tivesse raízes polonesas.
Depois de se formar pela escola agrícola, trabalhou como assistente na administração de propriedades agrícolas locais. O jovem, porém, não trabalhou por muito tempo em lugar algum, foi diversas vezes acusado de roubar dinheiro ou de molestar as esposas dos fazendeiros.
Após a eclosão da Guerra Russo-Japonesa em 1904, Kotôvski se escondeu da mobilização nas cidades de Odessa, Kiev e Carcóvia, mas, no ano seguinte, foi detido e enviado para o exército, do qual logo desertou e regressou à Bessarábia.
Durante a Primeira Revolução Russa de 1905-1907, Kotôvski começou a carreira de gângster. Criou e liderou uma gangue que roubava comerciantes, fazendas, apartamentos e lojas.
Às vezes, também libertava camponeses detidos por tumultos — o que mais tarde permitiu que a propaganda soviética o chamasse de combatente feroz contra o regime.
O futuro “herói soviético” gastava dinheiro em mulheres, restaurantes, álcool e corridas de cavalos, mas também distribuía parte do valor roubado com pobres para criar a imagem de “vingador do povo”.
Em 1907, Kotôvski foi preso e sentenciado a trabalhos forçados na Sibéria, mas escapou do campo cinco anos depois. Ao retornar para casa, voltou a ser o líder da gangue e ganhou fama de bandido ainda mais arrojado.
“Kotôvski adorava exibir sua destreza altruísta, seu incrível destemor [...] Vivendo com um passaporte falso, ele caminhava calmamente pelas ruas de Chisinau, sentava-se por horas na varanda do café local Robin e ocupava um quarto no hotel mais elegante", lê-se no jornal “Notícias de Odessa” de 1916.
Em pouco tempo, porém, o “Robin Hood da Bessarábia” foi detido novamente e condenado à morte; a sentença acabou sendo substituída por trabalhos forçados perpétuos.
No entanto, a Revolução de 1917 lhe devolveu a liberdade.
Famoso comandante
O bandido só poderia deixar o campo de trabalhos forçados se fosse imediatamente enviado para a guerra. Em maio de 1917, Kotôvski foi parar na frente romena, juntou-se aos bolcheviques, liderou um destacamento de cavalaria e lutou contra as tropas romenas que ocupavam a Bessarábia. Ajudou os vermelhos a sair de Chisinau e até infligiu uma derrota sensível aos intervencionistas.
No início de 1918, Kotôvski foi para Odessa, onde, como parte da resistência local, lutou contra regimes que se sucederam: austríaco-alemão, dos brancos e franceses. Há informações não confirmadas de que, durante sua estada na cidade, ele retornou periodicamente às práticas de gângster.
Em pouco tempo, Kotôvski provou ser um dos comandantes mais capazes do Exército Vermelho durante a Guerra Civil. “Destreza, força e instinto animal eram combinados em Kotôvski com grande coragem. Ele controlava a situação mesmo nos casos mais arriscados, quando estava à beira da morte”, escreveu o publicista Roman Gul sobre o ex-bandido.
Kotôvski comandou formações de infantaria e cavalaria, lutou contra os brancos, “petliuristas” (combatentes do Exército da República Popular Ucraniana), “makhnovistas” (combatentes do Exército Insurgente de Nestor Makhnô), participou da guerra soviético-polonesa e da supressão da revolta camponesa na cidade de Tambov.
O ex-gângster recebeu três Ordens da Bandeira Vermelha.
Assassinato
Após o fim da guerra, Kotôvski mudou-se para a Ucrânia central para comandar o 2º Corpo de Cavalaria e se tornou um dos iniciadores da República Socialista Soviética Autônoma da Moldávia. O comissário do povo (ministro) para Assuntos Militares e Navais da Rússia Soviética, Mikhail Frunze, até queria transformá-lo em seu vice.
Mas essa nomeação jamais ocorreu. Em 6 de agosto de 1925, Kotôvski foi morto por seu antigo conhecido da gangue de Odessa, o ex-proprietário de um bordel Mayer Seider.
Seider havia ajudado Kotôvski a escapar da polícia e, desde então, eles prestavam vários tipos de serviços um ao outro. Em 1922, o comandante Kotôvski nomeou Seider chefe da segurança de uma fábrica de açúcar perto da cidade de Uman, onde estava estacionado o 2º Corpo de Cavalaria.
Após a sua prisão, Seider admitiu sua culpa e afirmou que matou o comandante do corpo por não promovê-lo. Mas acredita-se que motivos políticos estariam entre as causas mais prováveis.
Mayer Seider recebeu uma sentença leve, de 10 anos de prisão, mas foi libertado após apenas três anos. Em 1930, ele foi morto em Kharkov por um grupo de cavaleiros que tinham servido sob o comando de Kotôvski.
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