Boiardo é como esta fortaleza marítima da Rússia, situada a dois quilômetros de Kronstadt (cidade nos arredores de São Petersburgo), costuma ser chamada. Foi construída 20 anos antes do famoso forte francês – em 1845 – e nunca foi usado como prisão. Também não ficou famosa como estrutura de defesa. A história do forte acabou sendo mais… intrigante.
Um forte de ilha
Kronstadt é uma cidade fortificada situada na Ilha de Kotlin, que, por sua vez, é cercada por toda uma rede de fortes situados em ilhas. Estes fortes começaram a ser construídos um ano após a fundação de São Petersburgo, em 1704, até ao início do século 20. A cidade é protegida por 21 fortes, dos quais 17 estão no Golfo da Finlândia e o restante, no continente.
Este forte, que recebeu o nome do imperador Aleksandr 1º, foi construído entre 1838 e 1845 em uma ilha artificial. Era grande o suficiente para acomodar uma guarnição de até 1.000 homens e mais de uma centena de armas de grande calibre foram implantadas nele. No entanto, durante toda a sua existência, só foi colocado em alerta de combate três vezes: durante a Guerra da Crimeia em 1855; em um confronto potencial com o Império Britânico em 1863; e, em 1877, durante a Guerra Russo-Turca. O Forte Aleksandr 1º nunca esteve envolvido em ação militar e, em 1896, foi desativado. Mas não ficou parado por muito tempo.
Laboratório de pestes
No final do século 19, a ameaça de uma epidemia de peste pairava sobre o mundo. A doença mortal é geralmente associada à Idade Média, mas, na época, tornou-se uma realidade novamente. Com o avanço dos trens e navios a vapor, a praga começou a se espalhar dos países asiáticos para áreas no sudeste da Rússia, e as autoridades temiam que se espalhasse pela Europa. Em 1897, o imperador Nicolau 2º estabeleceu uma comissão especial sobre medidas “para evitar a propagação da infecção da peste”, presidida pelo duque Alexandre de Oldemburgo.
O duque era uma pessoa altamente educada, que se correspondia com o microbiologista francês Louis Pasteur e o médico alemão Robert Koch; fundou o Instituto Imperial de Medicina Experimental, encarregado de criar uma vacina contra a peste e um soro antipeste. Para o soro, foi utilizado sangue de cavalo com anticorpos contra o bacilo da peste. A produção de medicamentos biológicos era perigosa, então o duque conseguiu obter o deserto e, mais importante, isolado Forte Aleksandr 1º para seu uso. Encanamento, eletricidade, aquecimento a vapor e drenagem foram instalados.
Gradualmente, o edifício passou a ser apelidado de forte da “peste”, embora cólera, tétano e tifo também fossem estudados no laboratório. Todos os anos, produzia até meio milhão de doses de soro, que eram enviadas tanto para a Ásia quanto para a Europa (por exemplo, em 1900, milhares de doses foram enviadas para Glasgow, depois que casos de peste foram diagnosticados).
Cerca de 40 funcionários viviam permanentemente no forte. As cargas do “continente” eram entregues por um pequeno navio chamado ‘Mikrob’ (‘Micróbio’) e deixadas no cais. Os cientistas não deixavam a ilha, pois isso poderia espalhar a perigosa doença. Sabe-se que dois médicos morreram após serem infectados durante o trabalho em 1904 e 1907.
As pesquisas continuaram até a Primeira Guerra Mundial, quando a maioria dos cientistas foi convocada para o Exército. Após a Revolução de 1917, o duque Alexandre de Oldemburgo teve que deixar seu posto e o país. A nova gestão do instituto o transferiu para Saratov (no sul da região do Volga), onde o Instituto AntiPeste ‘Mikrob’ foi estabelecido em 1918.
De prédio abandonado a museu
Ator francês André Bouchet em visita ao forte
Aleksêi Dánitchev/SputnikA partir de 1923, o forte foi usado como depósito de equipamentos de desminagem, mas, no início da década de 1980, estava praticamente abandonado. A própria Kronstadt era uma cidade militar fechada até 1996, embora uma exceção tenha sido feita para uma equipe da Lenfilm. Em meados da década de 1980, serviu de cenário para as filmagens de ‘Pólvora’ (1985), um filme ambientado na Grande Guerra Patriótica. Um incêndio realista durante as gravações acabou deixando o edifício severamente queimado e suas paredes carbonizadas se tornaram seu novo “cartão de visita”.
No final da década de 1990, passaram a ser realizadas ali festas rave de verão e, posteriormente, os turistas começaram a chegar de passeios de barco. O prédio pegou fogo pela segunda vez em 2017. O forte está agora em restauração e um museu dedicado à sua história deve ser inaugurado em 2025.
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