A maior derrota das tropas dos EUA na Rússia

US National Archive
Russos e americanos raramente se enfrentaram no campo de batalha, e os confrontos mais sangrentos ocorreram durante a participação dos Estados Unidos na Guerra Civil Russa.

Na clara e gelada madrugada de 19 de janeiro de 1919, na vila de Níjniaia Gorá, no norte da Rússia, soldados americanos acordaram com uma poderosa canhonada de artilharia. Ao correr para a rua, eles viram que, a apenas algumas centenas de metros de distância, fileiras de soldados do Exército Vermelho vestidos de branco se aproximavam. Foi assim que começou a batalha que determinou, em grande parte, o destino da intervenção estrangeira na Guerra Civil Russa.

Soldados americanos em solo russo

Soldado norte-americano faz  pausa para tirar fotografia enquanto carrega suprimentos em navio com destino à Rússia em 1918.

O principal motivo que levou Estados Unidos, Grã-Bretanha e França a iniciar uma intervenção na Rússia foi a conclusão do Tratado de Paz de Brest-Litovsk, em 3 de março de 1918, entre as Potências Centrais e o governo bolchevique, que acabava de assumir o poder no país. Após a saída da Rússia da guerra, os alemães puderam lançar uma perigosa ofensiva contra os franceses — algo que os aliados não podiam permitir.

Posto avançado dos EUA no remoto Extremo Norte da Rússia.

Os bolcheviques não eram vistos pela Entente como uma força verdadeiramente capaz de se manter no poder por muito tempo. Eles eram considerados seguidores do Kaiser que agiam segundo os interesses da Alemanha.

Assim, Washington, Paris e Londres decidiram fornecer apoio militar e financeiro aos adversários dos bolcheviques, o Exército Branco, que declarou abertamente seu desejo de continuar a guerra contra a Alemanha até o vitorioso fim. Além disso, uma enorme quantidade de carga militar, anteriormente fornecida pelos aliados ao exército russo, tinha sido acumulada nos portos russos. Era importante não deixá-la cair nas mãos dos comunistas.

Americanos com camuflagem de neve.

A primeira e única intervenção militar americana na Rússia começou em 27 de maio de 1918, quando o cruzador americano "Olympia" chegou ao porto de Murmansk, no norte do país, que já estava sob controle britânico. Alguns meses depois, 5,5 mil soldados americanos desembarcaram em outro porto do norte da Rússia, na cidade de Arkhânguelsk. Outros oito mil soldados americanos chegaram ao Extremo Oriente russo para conter o Japão.

No terceiro trimestre do mesmo ano, o Exército Branco, com o apoio de intervencionistas estrangeiros, principalmente americanos e canadenses, avançou 300 quilômetros, de Arkhânguelsk ao sul, e ocupou a cidade de Chenkursk, nas margens do rio Vaga, adentrando profundamente o território controlado pelos bolcheviques. 

Operação Chenkursk

Prisioneiros bolcheviques alimentados com arroz por um soldado dos EUA em janeiro de 1919.

Os comunistas não conseguiram retomar Chenkursk rapidamente e planejaram o ataque principal da 18ª Divisão de Infantaria do 6º Exército soviético para janeiro de 1919. Assim, cerca de 3 mil soldados do Exército Vermelho se preparavam para atacar 300 americanos e 900 outros soldados, entre canadenses e fileiras do Exército Branco.

O Exército Vermelho, com o apoio dos guerrilheiros, teve que atacar simultaneamente de três lados, sem ter nenhum meio confiável de comunicação entre si. Resistindo a geadas de quase 40 graus negativos, o Exército Vermelho levou armas de artilharia. 

Bolcheviques capturados.

A fim de garantir a surpresa do ataque, os soldados precisaram vestir suas roupas íntimas sobre os sobretudos. Camisas e ceroulas brancas se transformaram em camuflagem na neve, permitindo que eles se aproximassem a cem metros das posições inimigas.

O surgimento das tropas do Exército Vermelho, com artilharia pesada, em terreno considerado intransitável foi um choque para o inimigo. Os bolcheviques, porém, precisaram de cinco dias para expulsar os soldados do Exercito Branco, americanos e canadenses das aldeias.

Oficiais da Força Expedicionária Aliada em Arkhânguelsk, em 1919.

"A neve, que chegava até a cintura, era um verdadeiro pesadelo e, a cada novo passo, um de nossos desafortunados camaradas caía morto ou ferido. Era impossível ajudá-los, todos estavam lutando por suas vidas”, escreveu o tenente americano Harry Mead.

Derrota amarga

Os soldados do Exército Vermelho, que ocuparam a cidade, encontraram 2 mil fuzis, 60 metralhadoras e grandes reservas de alimentos. Segundo historiadores, foram os alimentos que ajudaram o inimigo a fugir com sucesso: os famintos soldados do Exército Vermelho corriam mais para comer que para perseguir o inimigo.

Túmulos americanos recém-cavados na Rússia.

Como resultado da operação Chenkursk, as forças do Exército Branco e dos intervencionistas tiveram que fugir, indo parar 90 quilômetros ao norte. Apenas as tropas americanas e canadenses perderam quase 40 pessoas, além de ficarem com cerca de 100 feridos —um golpe duro, já que eles tentavam ficar longe das áreas de hostilidades.

Para efeitos de comparação, o corpo de 8 mil soldados americanos na Sibéria perdeu apenas 48 soldados, enquanto 52 ficaram feridos, durante os 18 meses de batalhas no Extremo Oriente russo.

Tropas dos EUA fazem fila para inspeção antes de deixar a Rússia, em junho de 1919.

A catástrofe de Chenkursk minou a moral dos intervencionistas, e os soldados deles não queriam morrer em uma guerra estrangeira que não lhes dizia respeito. O governo dos Estados Unidos, por sua vez, decidiu reavaliar o custo de manter suas tropas em território russo.

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