Três teorias para a morte de Stálin

Cena do filme 'The Death of Stalin', de Armando Iannucci, ainda sem previsão de estreia no Brasil

Cena do filme 'The Death of Stalin', de Armando Iannucci, ainda sem previsão de estreia no Brasil

Free Range Films
O lançamento do filme The Death of Stalin (A Morte de Stálin, em tradução livre) em países europeus provocou intenso debate sobre as abordagens do tema e novamente levantou questões acerca da morte do líder soviético. Ainda envolto em mistério, o assunto é terreno fértil para aqueles que duvidam da versão oficial de mortal natural.

Não são poucas as pessoas que duvidam da versão oficial da morte de Iossef Stálin, em 5 de março de 1953. A ideia de que sua morte se deveu a um acidente vascular cerebral causado por uma doença grave partiu do próprio Kremlin.

Segundo o historiador Guennádi Kostirtchenko, Nikita Khruschov disse a uma jornalista francesa em 1956 que Stálin morreu depois de uma “pressão resoluta” por um grupo de altos funcionários soviéticos que se revoltaram e até ameaçaram o líder soviético.

“Os camaradas de Stálin não estavam satisfeitos com planos para deportar judeus soviéticos para a Sibéria”, disse Khruschov. Isso aconteceu no momento do chamado ‘Complô dos médicos’, cujas vítimas eram principalmente judeus.

Khruschov não foi o único a fazer tais alegações. Como destaca Kostirtchenko, esse argumento foi repetido pelo escritor soviético Iliá Ehrenburg em conversa com o filósofo francês Jean-Paul Sartre. A descrição de Ehrenburg traz muitos detalhes. Ele afirma que, tendo enfrentado forte oposição ao seu plano, Stálin ficou enfurecido.

Capa do jornal francês 'l'Humanite' em 7 de março de 1953, noticiando a morte de Stálin

Mas os presentes não ficaram intimidados e, pelo contrário, ameaçaram chamar o Exército para o Kremlin se Stálin não revogasse sua decisão de exilar os judeus. Um conspirador, judeu, rasgou seu cartão do Partido e jogou-o contra o rosto do líder. Em meio à humilhação, Stálin teria tido um acidente vascular cerebral e morreu.

Com essa carga de dramaticidade, pode-se argumentar que há tanta evidência histórica nesse relato como no filme recém-lançado. Os historiadores concordam que não há provas de nenhum plano para deportar os judeus nos arquivos pessoais de Stálin ou do Partido. Também não está claro se Khruschov citou essa história novamente. Não há referência aos planos de deportação em suas memórias publicadas no Ocidente nos anos 1970, e a história pode ser mera tentativa de embelezar a imagem do sucessor de Stálin. 

O homem com um machado

Acredita-se também que o papel de Nikita Khruschov na morte de Stálin não tenha se limitado ao de um oficial rebelde – ele teria sido o arquiteto principal do plano de assassinato. Certa vez, Khruschov fez declarações públicas que poderiam ser entendidas como um indicativo de que a morte do líder soviético foi premeditada.

Khruschov e Stálin em 1936

Em um evento público em julho de 1963, ao receber uma delegação da Hungria, Khruschov começou a falar sobre Stálin e acrescentou: “Houve muitos ditadores brutais na história humana, mas todos morreram de um machado, assim como também ganharam poder com um machado”. Na posterior transcrição do discurso, publicada nos jornais soviéticos da época, esses trecho acabou sendo omitido.

O historiador Aleksandr Duguin acredita que a pessoa com o machado era o próprio Khruschov. Pouco antes de sua morte, Stálin pretendia demitir o ministro da Segurança de Estado, Semion Ignatiev, e seu patrono, Khruschov. Por isso, Khruschov teria decidido agir primeiro liderando uma conspiração contra Stálin. Os conspiradores não só assassinaram Stálin, mas também mataram Lavrentiy Beria, o poderoso chefe da polícia secreta soviética. No último caso, porém, foi um pouco diferente: Beria foi preso três meses após a morte de Stálin, condenado à morte e executado.

Da dir. à esq.: Nikita Khruschov e Lavrentyi Beria entre outros oficiais no funeral de Stálin

Envenenado por Beria

Lavrentiy Beria também é outra figura amistosa na morte de Stálin. Como a segunda pessoa mais poderosa do país, é plausível que Beria tenha medo de uma potencial purga e que ele poderia ser sido um dos principais alvos. Assim, Beria teria tomado a iniciativa.

De acordo com o livro do historiador Nikolai Dobryukha “Como Stálin foi Morto”, Beria intoxicou Stálin usando venenos raros de serpente ou aranha. Para fundamentar a tese, Dobryukha cita as palavras do ministro dos Negócios Estrangeiros sob Stálin, Viatcheslav Molotov. Ele relatou que, após a morte do líder, Beria disse ter sido o responsável por “salvar todos vocês [oficiais soviéticos] de Stálin”. Mas, ainda que seja verdade, a posterior prisão de Beria escancarou o nível de gratidão dessas autoridades.

Máscara mortuária de Iossef Stálin em exposição no Museu de História Política Russa, em Petersburgo

A morte de Stálin, provavelmente, não deixará de ser motivo de especulação, mas uma coisa é certa – depois de terem recebido a notícia sobre o acidente vascular cerebral de Stálin, as autoridades não se apressaram em chamar médicos. Outro detalhe estranho é que, de acordo com o anúncio oficial, o líder soviético teve um acidente vascular cerebral no Kremlin, quando, na verdade, isso aconteceu em sua datcha.

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