1. Lev Gumilióv era filho de um casal proeminente de poetas: Nikolái Gumilióv e Anna Akhmátova. Seu pai tinha raízes na nobreza e era um dos mais famosos poetas russos no início do século 20. Em 1921, na Rússia pós-revolucionária, quando Lev tinha apenas 9 anos de idade, Nikolai foi preso acusado de participar em uma conspiração monarquista. Oficial do exército com experiência na Primeira Guerra Mundial, ele foi sentenciado à morte e executado. A suposta participação do pai em uma “conspiração contrarrevolucionária” estigmatizou Lev e sua mãe, Anna Akhmátova, na Rússia soviética.
2. Outra poeta icônica, Anna Akhmátova tinha relações difíceis com o filho. Quando ele era pequeno, foi criado basicamente pela avó. Mas quando terminou a escola ele foi a Leningrado para viver com a mãe e seu novo marido.
3. Gumilióv estudou história na Universidade de Leningrado (hoje, São Petersburgo). De acordo com seus colegas, ele não tentava se imiscuir com os colegas e costumava destacar suas origens nobres. Em 1935, Lev foi preso pela primeira vez. Depois da prisão, Gumilióv reconheceu ter “sentimentos terroristas”, já que supostamente dizia que “ainda havia membros da nobreza na Rússia sonhando com bombas”.
A polícia também encontrou um poema satírico de Óssip Mandelchtám, “O epigrama de Stálin”, copiado com a letra de Gumilióv. Ali constavam as palavras “os bigodes da barata estão gritando” e “todo assassinato para ele é um deleite”.
Então, o novo marido de sua mãe também foi preso. Akhmátova escreveu a Stálin, suplicando que ele libertasse seus entes, e o líder comunista ordenou que isso fosse feito.
4. Gumilióv foi preso novamente em 1938, acusado de organizar um grupo contrarrevolucionário de jovens. O nome de seu pai também foi mencionado como inimigo do regime soviético.
No julgamento, ele refutou todas as acusações. Akhmátova escreveu novamente a Stálin, mas, desta vez, em vão. Gumilióv foi condenado a cinco anos nos campos de trabalho forçado da Sibéria oriental.
5. Após cumprir a sentença, ele se uniu ao Exército Vermelho em 1944, já perto do final da Sehunda Guerra Mundial. Gumilióv participou então da batalha por Berlim e chegou a receber algumas distinções.
6. Após o término da guerra, Gumilióv recebeu seu diploma de historiador e defendeu uma tese de doutorado sobre os turcos na Antiguidade. Mas já em 1949 ele foi preso novamente, no período em que sua mãe estava sob a mira das críticas das autoridades soviéticas. Imaginava-se que ela também fosse ser presa, mas isto não aconteceu.
Gumilióv costumava dizer ter sido preso, primeiramente por causa de seu pai e, depois, da mãe. Então ele recebeu sua sentença mais longa, de 10 anos em campos de trabalho forçado.
Aos 40 anos, Gumilióv passou a ter problemas de saúde, um após o outro. Logo depois da condenação, ele escreveu não ter esperanças de sobreviver a ela. Mas ele sobreviveu e trabalhou, parte do tempo, como bibliotecário. Gumilióv foi libertado em 1956, após a famosa campanha de desestalinização lançada pelo então líder soviético Nikita Khruschov.
7. Nesses anos, sua relação com a mãe tornou-se mais tensa que nunca, e Gumilióv a culpava por não ajudá-lo.
Ele não gostava de um dos poemas mais famosos escritos por Akhmátova, “Requiem”, que tocava o assunto das prisões. Ele afirmava que os versos se tratavam mais dos sentimentos da mãe que do sofrimento nas prisões. “Marido na cova, filho preso. Por favor, rezem por mim”, lia-se no poema.
8. Após ser libertado do campo prisional, Gumilióv continuou sua atividade de pesquisador, com especial interesse na história dos nômades da Ásia Central e das estepes, ao redor da qual criou uma de suas ideias mais disseminadas, o conceito de “passionárnost” (traduzida para o português como “passionaridade”, a teoria descreve o nível de atividades típico de determinado grupo étnico, e especialmente de seus líderes, para se expandir em um certo momento histórico e o modelo de como suas atividades mudam).
Gumilióv afirmava que todo grupo étnico em sua história passava pelos mesmos estágios do nascimento ao clímax e daí para a inércia. Segundo a teoria, quando a “passionaridade” de uma etnia atinge seu máximo, ela produz líderes veementes e realiza grandes conquistas.
9. Gumilióv aproximou-se muito dos trabalhos do Eurasianismo, cuja teoria prega que a civilização russa não é uma entidade europeia real, mas sim um fenômeno geopolítico e cultural eurasiático.
Gumilióv considerava os russos uma “superetnia” que, de alguma maneira, abarcava as influências de turcos e mongóis. O historiador ressaltou a importância da aliança entre os russos e outros povos das estepes eurasiática orientais. Esta aliança ajudaria a Rússia a se opor a impactos destrutivos da Europa.
10. Os pontos de vista de Gumilióv foram recebidos na URSS com grande ceticismo. Mas a situação mudou no final dos anos 1980, com a Perestroika de Gorbatchov, quando sua obra passou a ser publicada massivamente. Ao mesmo tempo, a teoria da “passionaridade” étnica é frequentemente criticada devido às dificuldades em se constatá-la.