Você conseguiria viver em um ‘tchum’? (FOTOS)

Pável Kuzmitchev
Os nômades do Extremo Norte passam toda a vida em movimento, seguindo e pastoreando suas renas. Assim, há séculos eles levam sua cabana portátil de pele animal pelo Ártico, assim como todos os seus pertences, com a ajuda de um trenó.

Além de seus residentes urbanos e rurais, o Extremo Norte da Rússia também tem habitantes que levam um estilo de vida nômade. Eles são principalmente criadores de renas. As renas estão constantemente migrando em busca de comida e, assim, seus criadores precisam se mudar com elas.

O maior número de nômades russos vive na Península de Iamal, na Sibéria. São cerca de 10 mil pessoas de povos indígenas setentrionais ali: os nenets, os khanti e os selkup. Uma vez por ano, eles vão com seus “tchums” para a cidade de Salekhard para comemorar o “Dia do Pastor de Renas”. É quando os cidadãos urbanos conseguem espiar os “tchums” em todos os detalhes.

O “tchum” é a morada tradicional dos povos do Norte. Sua forma cônica é adequada para as duras condições do Ártico. Essa forma lhe rende estabiliade durante as tempestades de neve, pois assim a neve desliza facilmente. Além disso, o “tchum” é rapidamente aquecido por dentro e sua forma faz com que seja muito rápido para montar e desmontar.

É assim que é o processo de montagem de um “tchum” dos nenets:

No passado, nas famílias nenets, o “tchum” era montado pelas mulheres, mas hoje em dia essa tradição não existe mais: toda a família participa na construção da habitação.

“Geralmente levamos uma hora no verão para erguer e montar nosso ‘tchum’ e três horas no inverno, se houver muita neve”, conta Mariam, uma jovem da aldeia Aksarka de Iamal.

O “tchum” que ela abriu para os visitantes tem cerca de 40 varas e 80 peles de rena. “Neste ‘tchum’ cabem oito pessoas confortavelmente”, afirma, acrescentando que antigamente as famílias eram maiores, com 10 filhos, e hoje em dia têm no máximo cinco ou seis. Por isso, há espaço de sobra no “tchum” e, com cortinas, você pode isolar uma “sala” separada (chamada de “polog”).

Um “tchum” médio tem de 5 a 8 metros de diâmetro em sua base. O chão é feito de tábuas de madeira cobertas com pele de rena. A zona central é ocupada pela lareira - uma estufa metálica que aquece o interior e também serve de fogão. Em geral, há uma mesa ao lado, em torno da qual se reúnem familiares e convidados.

“O ‘tchum’ é feito de materiais totalmente naturais”, conta Mariam. “Fazemos nossas próprias hastes. Estamos na floresta de tundras, então não há problema em encontrar árvores. As renas também são nossas e aos poucos vamos acumulando suas peles. Mas, se você colocar isso em termos monetários, o custo de um ‘tchum’ assim é de quase 1,2 milhão de rublos (aproximadamente US$ 15.000, ou seja, equivalente ao preço de um apartamento de um quarto em uma cidade pequena russa).

“Quando os filhos crescem e querem constituir família, eles constroem um novo ‘tchum’. Hoje, os jovens se casam por volta dos 25 anos e os pais costumam ajudá-los com o ‘tchum’”, conta Anna, de outro assentamento.

Além disso, há um subsídio disponível em Iamal conhecido como “capital material do tchum”: depois do nascimento de um terceiro filho, a pessoa pode receber um kit de montagem de “tchum” com fogão, hastes, tábuas para o chão, peles de rena, lonas e trenó.

Os povos nativos do Norte também seguem rituais específicos relacionados a suas moradias. "A mulher não deve andar atrás do fogão e da lareira, que consideramos um lugar sagrado", diz Galina, do acampamento nômade de Minlei, perto de Salekhard. “Também não se pode andar ao redor do ‘tchum’ e, se precisar corrigir alguma coisa, primeiro você tem que ir para um lado e depois para o outro.”

A vida dentro de malas

“Somos nômades e há algumas pastagens onde ficamos uma semana, outras onde nos instalamos por um ou dois meses e outras ainda onde paramos apenas um dia. No inverno, ficamos quatro meses no mesmo lugar, de janeiro a abril”, conta Nikolai, do distrito de Priurálski.

Essa migração se chama “kastlanie” na língua local. Há séculos as rotas são as mesmas: os grupos seguem hoje os rastros deixados por seus ancestrais, cujos vestígios permanecem na tundra. Os criadores de renas também podem calcular com antecedência quando estarão perto de aldeias, onde podem repor seus estoques de alimentos e outros itens essenciais.

Na atualidade, eles têm motoneves, veículos motorizados, laptops e telefones celulares, além de transmissores portáteis e geradores a gasolina. Mas esses nativos dizem que o mais importante de tudo é sua sensação de liberdade.

“Quando você está na cidade, depende do tempo. Não precisamos levantar de acordo com o relógio e sair correndo para pegar o ônibus. Não vamos deixar o chefe esperando. Vivemos seguindo o destino”, diz Galina.

Além de seus “tchums”, as famílias de criadores de renas em Iamal hoje têm suas próprias casas ou apartamentos nas cidades. Por exemplo, um membro da família pode trabalhar na aldeia e outro pode se mudar para a cidade para se aposentar, enquanto outros parentes continuam migrando com as renas - mas todos se visitam. E todos eles se lembram da floresta e da tundra com muito carinho.

“Você provavelmente não entenderá como as coisas são de verdade. Para entender, você tem que viver um pouco lá. Vamos passear com as renas?”, convida Anna.

LEIA TAMBÉM: Como os guerreiros tchuktchi repeliram os russos e os forçaram a negociar?

O Russia Beyond está agora também no Telegram! Para conferir todas as novidades, siga-nos gratuitamente em https://t.me/russiabeyond_br

Autorizamos a reprodução de todos os nossos textos sob a condição de que se publique juntamente o link ativo para o original do Russia Beyond.

Leia mais

Este site utiliza cookies. Clique aqui para saber mais.

Aceitar cookies