De estudante de letras a superstar do futebol

Em sua romaria a jogos de futebol pelo país, Odomiro assistiu até partida do Kamaz na terceira divisão Foto: arquivo pessoal

Em sua romaria a jogos de futebol pelo país, Odomiro assistiu até partida do Kamaz na terceira divisão Foto: arquivo pessoal

Brasileiro conta como viajou à Rússia para pesquisar escritor niilista e se tornou atração do futebol local. Em "romaria" por jogos, o doutorando em Literatura e Cultura Russa pela Universidade de São Paulo acabou dando entrevistas para uma série de sites especializados no esporte e angariou fãs, que queriam tirar fotos com ele no meio das partidas.

Quando estive na Rússia pela primeira vez, há três anos, estagiando como professor de inglês na remota cidade de Naberejnie Tchelni, assisti a meu primeiro jogo de futebol no país: o Kamaz Naberejnie, da cidade de Tchelni, contra o Lutch-Enérguia, de Vladivostok.

Mesmo com a temperatura de dois graus negativos, o pequeno estádio estava lotado, e a torcida local, satisfeita pelo time disputar a segunda divisão - com possibilidades de ascender à liga principal, onde se encontram os gigantes milionários do futebol russo.

Vi dois jogos do Kamaz pela segundona e a semifinal da Copa da Rússia, em Moscou, entre CSKA e Spartak. Um belíssimo jogo que terminou nos pênaltis, com a vitória dos cavaleiros moscovitas do CSKA, após um emocionante 3 a 3 no tempo normal e prorrogação.

Assisti ao jogo na geral do CSKA e me impressionava como os torcedores não deixavam de apoiar o time em momento algum. Já daquela vez foi especial.

Alvirrubros

Como torcedor do Náutico, até hoje não entendo como não simpatizei com o Spartak Moscou, já que ostentamos as mesmas cores. Apesar de os alvirrubros moscovitas possuírem a maior torcida do país, a maioria dos meus grandes amigos eram torcedores do CSKA ou do Rubin Kazan.

Odomiro ganhou uma camisa autografada pelo meia croata Marko Livaja na apresentação dos novos reforços do Rubin Kazan Foto: arquivo pessoal

Desta vez, em 2014, voltei à Rússia para estudar. Estabeleci-me na cidade de Kazan, da qual já gostava e onde tinha amigos. Vim para melhorar o russo e para ler “Tempos Difíceis”, do escritor niilista Vassíli Sleptsov.

Kazan é uma cidade de um milhão e duzentos mil habitantes, capital da República do Tartaristão. Cidade de tradição religiosa mista ortodoxa e muçulmana, e de boa conservação do patrimônio histórico e cultural.

Mas Kazan faz questão de aparecer para o mundo também como uma cidade de motivação esportiva. O clube da basquete da cidade, o Uniks, participa - e bem! - da Liga Europeia; o time de vôlei, Dinamo, também é internacionalmente conhecido; e o Ak Bars já foi campeão da fortíssima liga de hóquei do Leste europeu (KHL) em quatro oportunidades. 

No ano passado, a cidade de Kazan também recebeu os jogos universitários Universíade, e em 2015 sediará o Mundial de Esportes Aquáticos. Ou seja, a cidade tem vocação para o desporto!

Como apaixonado por futebol, porém, era sempre o Rubin que me fazia lembrar de Kazan. O clube da cidade sempre participa de competições europeias. Entre seus feitos memoráveis, estão a vitória por 2 a 1 contra o Barcelona, no Nou Camp, e a classificação contra o Atlético de Madrid, na Liga Europa.

O Rubin também já foi campeão russo das temporadas 2008 e 2009. Assim, quando cheguei à cidade procurei saber quais jogos do clube combinariam com minha estadia e, para minha surpresa, dei de cara com três clássicos contra os moscovitas Spartak, Lokomotiv e CSKA.

Superstar até na terceira divisão

O que eu não imaginava é que a população local tinha tanto carinho pelo futebol brasileiro - principalmente após a péssima apresentação do esquadrão canarinho na Copa.

Minha aventura começou quando, indo à Biblioteca Nacional do Tartaristão, desci do ônibus na estação Kremlióvskaia, onde ficam o Kremlin e o Estádio Central. Ali, vi um grupo de animadoras de torcida com bandeiras do Rubin, além de uma pequena aglomeração na porta da loja oficial do clube e um palco.

Depois de dar entrevistas a sites especializados, o brasileiro foi reconhecido por torcedores na abertura da Arena Kazan, que quiseram tirar fotos com ele Foto: arquivo pessoal

Curioso, fui ver do que se tratava. Escolhi aleatoriamente um senhor para perguntar o que acontecia e ele me disse que era a apresentação dos novos reforços do Rubin, que começaria dentro de vinte minutos.

“Que interessante! Ficarei para assistir”, pensei. O senhor perguntou de onde eu era e respondi que do Brasil. “Você torce pro Rubin?”. Respondi que sim, claro, pois estava morando na cidade e tinha intenção de ver os jogos com a torcida local.

O tal senhor, por coincidência, era diretor do clube, e me convidou para dentro da loja para que eu concedesse uma entrevista para o site oficial do clube.

Ganhei cachecol do time (por coincidência, estava vestindo uma camisa do Náutico no mesmo dia) e, após a apresentação, o meia croata Marko Livaja, contratação de peso para a temporada 2014-2015, presenteou-me com sua camisa autografada.

Após o ocorrido, fui convidado pelo site local “Kazan First” para falar sobre futebol russo, brasileiro e expectativas para a próxima Copa, que será aqui na Rússia.

Fui a dois jogos do Rubin, mas não dei muita sorte. No primeiro, uma sonora goleada de 4 a 0 para o Spartak e, no segundo, um empate em 1 a 1 contra o Lokomotiv.

Por sinal, este último jogo marcou a inauguração da Arena Kazan – um estádio lindo, com capacidade para 43 mil torcedores e que será um dos palcos da Copa 2018.

Tudo funcionou de modo impecável: a segurança para entrar no estádio é digna de um aeroporto internacional; o estacionamento, amplo, os banheiros, limpos e vários bares dão conta da alimentação da torcida (desde pipoca e chocolate até sushis!).

Funcionamento da Arena Kazan é impecável, de acordo com doutorando, e serve "de pipoca a sushi" Foto: arquivo pessoal

O ingresso não foi caro - para ver o jogo na arquibancada inferior, próximo aos jogadores, paguei 300 rublos, algo em torno de 20 reais. Foi muito engraçado andar pelas dependências da Arena e ser reconhecido pelos torcedores: “Ei, você é o brasileiro que torce pro Rubin! Posso tirar uma foto com você?”.

Minha experiência como torcedor na Rússia ainda não acabou. Ainda verei Rubin contra CSKA e a estreia do Ak Bars na liga de hóquei. Também estive em Naberejnie Tchelni para rever os amigos e assisti a um jogo do Kamaz pela terceira divisão do campeonato russo. Após ser reconhecido como brasileiro, ganhei flâmulas do clube, camisa da torcida e o ingresso.

Por fim, quero sublinhar que os russos amam o futebol. Os estádios estão sempre cheios (na primeira divisão, pelo menos) e eles cantam o jogo inteiro! Também possuem um imenso respeito pelo nosso futebol e carinho pelo povo brasileiro.

A Copa 2018 vem aí e a Rússia, certamente, estará bem preparada para receber todo o mundo.

 

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