“Clima de negócios e imprensa livre são essenciais para economia”

"Os principais empecilhos à economia russa não são as sanções, mas os baixos preços do petróleo"

"Os principais empecilhos à economia russa não são as sanções, mas os baixos preços do petróleo"

Valery Sharifulin / TASS
Para ex-vice-presidente do Banco Central da Rússia, crise no setor não foi causada por sanções.

Economistas passaram a falar em um degelo nas relações entre a Rússia e o Ocidente. O sr. acredita que a crise poderia ter uma virada neste momento?

Pessoalmente, não vejo nenhuma aproximação. Há, sim, um limitado diálogo sobre a Síria, mas os problemas nessas relações são muito mais profundos e, enquanto os Acordos de Minsk não forem implementados por completo, as sanções serão mantidas.

Quais seriam as consequências de um levantamento das sanções para a economia russa?

Os principais empecilhos à economia russa não são as sanções, mas os baixos preços do petróleo. Ainda em 2013, quando eles subiam e não havia sanções, verificou-se um crescimento econômico total de 1,3%.

Não podemos culpar fatores externos por tudo. As sanções à tecnologia energética praticamente não funcionam porque recaem sobre a produção offshore, que quase não é rentável diante dos preços do petróleo.

Já as sanções financeiras, se fossem levantadas, poderiam melhorar, a curto prazo, a situação. Mas, sem investimento, não é possível alcançar o crescimento a longo prazo.

Há um ano, quando o rublo despencou, muitos falaram de uma derrocada da Rússia...

Então, muitos fatores ao mesmo tempo: a queda dos preços do petróleo, a imposição de sanções e o pico do pagamento da dívida externa. Isso levou ao colapso da moeda nacional.

Mas o papel dos mercados financeiros não deve ser supervalorizado, e tornou-se evidente que a política competente do Banco Central acalmaria a situação.

As previsões apocalípticas foram proferidas por aqueles que não entendem o funcionamento do sistema monetário.

É claro que a ligeira alta dos preços do petróleo no início do ano colaborou um pouco. Além disso, o Banco Central está evitando erros cometidos no ano passado.

Mas seu maior problema, atualmente, é fazer com que a sociedade compreenda suas atividades e sua atuação na gerência das expectativas de inflação.

Todos os setores da economia russa vivem uma situação ruim equiparável?

Existem diferenças significativas. A situação da indústria da defesa não poderia estar melhor, com uma carteira de encomendas que não para de crescer. O crescimento da produção industrial nos últimos meses se explica, em partes, por isso.

O setor agrícola vai bem, e o sistema de subsídios agrícolas criado no início dos anos  2000 tem funcionado, na medida do possível. Graças a ele, a indústria tem crescido, em média, 2% ou 3% ao ano.

Mas, claro, a proibição das importações também colaborou. Os setores primário e de transportes também se mantiveram estáveis porque a demanda por matérias-primas provenientes da Rússia praticamente não diminuiu.

O pior cenário está no mercado consumidor: no comércio, na indústria automobilística, em projetos de desenvolvimento e no setor imobiliário.

Neste ano, a Rússia ficou em 51º lugar no ranking Doing Business, enquanto, há 5 anos, ficou em 120º. Isso se explica pelas reformas?

Claro que houve reformas bem-sucedidas, tanto nos sistemas eletrônicos de impostos e alfândega, como na aceleração de outros procedimentos burocráticos.

Mas esse tipo de ranking costuma medir parâmetros muito técnicos: quanto tempo leva e qual o preço de determinado serviço público. A qualidade das instituições, por sua vez, é ignorada.

O fato de os tribunais russos trabalharem mais rápido do que, por exemplo, os dos EUA, não nos permite afirmar - como faz a classificação do Doing Business - que seja mais fácil defender um contrato ou uma propriedade na Rússia.

Quais perspectivas o sr. vê para a economia russa em 2016?

É difícil ter previsões a curto prazo, muita coisa depende de fatores pontuais. Mas é raro ter uma economia em recessão por mais de dois anos sem que qualquer catástrofe aconteça. Por isso, a Rússia deve voltar a crescer. Mas sem mauores investimentos, essa dinâmica será bastante instável.

Anteriormente, o clima de investimentos na Rússia não estava muito melhor que agora. Mesmo assim, havia crescimento...

Essa falta de crescimento começou nos últimos 10 anos e foi marcada pelo caso Yukos [com a prisão, em 2003, do proprietário da petrolífera, Mikhail Khodorkóvski].

A economia não é algo maleável. Ela depende não só das decisões de alguns investidores, mas de milhares de empresários. Por isso, casos como o da Yukos afetam permanentemente a economia.

Antes do início da crise financeira mundial, bancos e empresas russas podiam pegar empréstimos anuais no exterior de valor equivalente a 7% a 10% do PIB. Assim, a economia cresceu.

Depois da crise, em 2010 a 2011, o país sofreu o efeito dominó e só em 2012 voltamos aos níveis pré-crise. A partir de então, não houve mais crescimento.

A alta do petróleo ajudaria?

É evidente que nossa dependência do petróleo é imensa, mas ela não deve ser supervalorizada.

Se o preço subir para US$ 100/barril, a situação certamente melhorará por um ano ou dois. Mas, na essência, nada muda.

É preciso melhorar as condições para se fazer negócios no país, aumentar a segurança jurídica, a competição política e os veículos de imprensa independentes. Sem isso, a economia russa terá dificuldades para sair do buraco.

Raio-X: Serguêi Aleksáchenko

Ex-ministro das Finanças (1993-1995) e ex-vice-presidente do Banco Central da Rússia (1995-1998), Serguêi Aleksáchenko foi nomeado especialista-sênior da Comissão de Reformas Econômicas do Conselho de Ministros da URSS em 1990, ainda aos 31 anos.

Em 1991, passou a compor o conselho de diretores da União de Produção Científica da URSS, cargo que ocupou até 1993.

Após o ministério das Finanças e o Banco Central, fez parte de diversos outros conselhos diretores. É pesquisador da Escola Superior de Economia de Moscou.da sigla em russo, Universidada Estatal de Moscou)

 

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