“Situação atual é parecida com a crise de 1986 na URSS”, diz Vladímir Mau

Mau: "Hoje, a Rússia está sendo afetada por várias crises" Foto: PhotoXPress

Mau: "Hoje, a Rússia está sendo afetada por várias crises" Foto: PhotoXPress

Desde setembro de 2014, quando os preços do petróleo começaram a despencar, a moeda nacional russa passou a sofreu uma drástica desvalorização. Em entrevista à Gazeta Russa, o reitor da Academia Presidencial da Economia Nacional e Administração Pública da Rússia e um dos responsáveis pelas reformas econômicas da Rússia no início dos anos 1990, Vladímir Mau, faz uma analogia entre a atual situação econômica e a crise na União Soviética no final da década de 1980.

Devido a queda dos preços do petróleo e consequente desvalorização do rublo, a economia nacional estancou. Como o senhor caracteriza essa nova realidade?

Como chefe de uma instituição orçamental e maior universidade da Rússia, prezo pelos altos preços do petróleo. Mas, como historiador econômico, sou a favor de preços moderadamente baixos, porque excesso de renda sempre estraga a qualidade das instituições. No século 16, o aumento de receita da Espanha na forma de prata e ouro levou ao colapso do Estado mais poderoso da Europa. Devemos entender que a crise atual na Rússia é, acima de tudo, uma ótima razão para repensar a política macroeconômica do país.

Como a queda dos preços do petróleo pode ajudar o país a reduzir sua dependência das exportações de matérias-primas e a realizar uma reforma econômica?

Se os preços do petróleo permanecerem baixos, será possível afirmar que a Rússia se livrou da “doença holandesa”. Isto é, quando a produção de outros bens, além de matérias-primas, não é rentável. Isso permitiria suprimir a inflação sem perder competitividade das empresas, porque o rublo se tornará mais forte. A Rússia também poderia simplificar a lei de imigração, porque o país se tornou menos atraente para os imigrantes.

Qual é a razão principal da atual crise econômica? 

Hoje, a Rússia está sendo afetada por várias crises. Em primeiro lugar, há uma crise na estrutura global, que provoca mudanças profundas nas economias e no curso político de países desenvolvidos. Também há uma crise do modelo de crescimento econômico da Rússia dos anos 2000, que se baseou no aumento da demanda e do consumo. Além disso, a situação geopolítica se deteriorou muito, a economia russa está sofrendo com as sanções setoriais, principalmente na área financeira. A queda dos preços do petróleo só intensificou ainda mais a situação.

Qual é a diferença entre a situação atual e a crise econômica de 2008? 

Em 2008 e 2009, a Rússia estava procurando uma saída da crise econômica junto com o mundo inteiro. Hoje, ninguém pode nos ajudar. Na verdade, a situação atual é muito parecida com a crise da União Soviética de 1986. Agora, a Rússia está sofrendo por causa de problemas externos: sanções econômicas, queda dos preços do petróleo. Em 1986, a URSS também sofreu com a queda dos preços do petróleo. Além disso, a campanha antialcoolismo privou o orçamento de sua segunda maior fonte de renda. Naquela época, o governo soviético lutou contra a crise financeira com ajuda de empréstimos estrangeiros. A URSS entrou na crise com uma economia equilibrada, mas, quatro anos depois, o Estado entrou em colapso, embora, durante dois anos, o PIB do país estivesse crescendo. Porém, é preciso admitir que a URSS tinha um sistema econômico muito mais rígido e quase sem reservas.

Vários economistas afirmam que a Rússia poderia responder à crise com um cenário de mobilização ou liberalização da economia. Qual seria o mais adequado?

A liberalização da economia é uma opção mais comum em todo o mundo. O melhor e maior exemplo é a China, que começou a liberalizar a economia em 1978, e especialmente após as manifestações de estudantes em 1989, quando sanções econômicas foram impostas contra o país. O rápido crescimento de investimentos e do PIB da China é o resultado dessa liberalização. Há outros exemplos de crescimento acelerado provocado pela liberalização, como Chile, Finlândia, Irlanda, África do Sul e Polônia. Mas eu não posso dar nenhum exemplo de rápido crescimento provocado pelo modelo de mobilização durante os últimos 50 anos.

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