Pesquisas no Ártico superam obstáculos

De fato, a área da cobertura de gelo no Ártico está reduzido 5% a cada 10 anos e a espessura das geleiras do mar Ártico é metade do que há meio século Foto: Lori/Legion Media

De fato, a área da cobertura de gelo no Ártico está reduzido 5% a cada 10 anos e a espessura das geleiras do mar Ártico é metade do que há meio século Foto: Lori/Legion Media

Parceria entre russa Rosneft e norte-americana Exxon Mobil na busca de hidrocarbonetos indicam importância da região.

No meio do acumulado de notícias sobre a Ucrânia, ficou em segundo plano o anúncio de que o Centro de Pesquisa e Projetos Árticos para Desenvolvimentos no Mar inicia uma expedição de pesquisa no Ártico. Os fundadores do referido centro são dois gigantes do petróleo e gás da Rússia e dos Estados Unidos –a Rosneft e a ExxonMobil.

De acordo com o Serviço Geológico dos EUA, o Ártico concentra cerca de 13% das reservas de petróleo ainda não descobertas no mundo e 30% do gás natural também ainda por descobrir. Mais da metade desses recursos de hidrocarbonetos da região estão na cota russa. E se falamos diretamente do gás, 95% das suas reservas árticas estão no segmento russo.

As possessões russas no Ártico são uma guloseima saborosa demais para ela se recusar a participar da sua exploração. Não foi por acaso que, precisamente a partir de uma discussão de projetos offshore conjuntos, teve início a cooperação da Rosneft com outra gigante do petróleo e gás –a BP britânica. Em 2010, as duas empresas pretendiam inclusive trocar ações entre si. Além disso, a Rosneft e a BP planejavam criar um Centro de Tecnologias do Ártico na Rússia, que, junto com institutos russos e estrangeiros líderes em pesquisa, agências de projetos e universidades, deveria se ocupar do desenvolvimento e implementação de tecnologias e soluções de engenharia mais avançadas para a exploração segura dos recursos de hidrocarbonetos do Ártico.

O fato de a Rosneft ter criado um centro junto com a ExxonMobil e não com a BP é, em grande medida, "mérito" dos bilionários russos acionistas da TNK-BP, que há quatro anos fizeram literalmente gorar um negócio promissor com seu parceiro britânico. A Rosneft e a BP recusaram se unir e o lugar do parceiro ártico para a empresa estatal russa foi ocupado pela ExxonMobil.

Como no espaço

Muitos especialistas comparam a conquista da plataforma continental com a conquista do Espaço em questão de nanotecnologia e eletrônica utilizadas. Na exploração das jazidas do Ártico há complexos meios técnicos: desde navios e plataformas de perfuração até equipamento e aparelhos de geofísica, navegação e muitos outros. Os consórcios de petróleo e gás americanos e europeus possuem a experiência e tecnologia necessárias. Por isso, a cooperação com eles é seguramente vantajosa também para a Rússia porque vai ajudá-la a "capitalizar" de um jeito mais rápido e mais seguro os seus ativos do Ártico.

No entanto, não podemos deixar de admitir que essa tarefa não é tão difícil quanto foi, por exemplo, a conquista do Ártico em si, com a qual os russos souberam lidar tão bem –se não melhor– do que os outros povos nórdicos.

Ainda em meados do século 16, o povo pomors (Grupo etnográfico russo que habita em volta do mar Branco) do norte da Rússia, usando os afluentes dos rios siberianos, navegou até o Oceano Ártico e ao longo de sua costa. E em 1648, um grupo de marinheiros liderado por Fedot Popov e o ataman cossaco (chefe) Semion Dejnev contornou com suas embarcações a Península de Chukotka e atingiu o Oceano Pacífico.

Entre os anos de 1733 e 1742, como resultado da Grande Expedição do Norte, foram traçados no mapa os contornos da costa do Oceano Ártico desde Arkhangelsk até à foz do rio Kolima, o litoral da ilha de Honshu e as Ilhas Curilas. Em 1899, por iniciativa do Almirante Makarov, foi construído o primeiro quebra-gelo de alta potência do mundo, o Ermak, destinado a ser utilizado para a comunicação regular com os rios Ob e Ienisei, através do mar de Kara, e para pesquisas oceânicas até as mais altas latitudes. Em 1914 e 1915, bandeiras russas foram hasteadas na Terra de Francisco José e na ilha Uedinenia.

A Rússia Soviética e mais tarde a União Soviética não ficaram atrás do Império Russo em atividades na região. No dia 10 de março de 1921, Vladímir Lênin assinou o decreto que criava o Instituto Científico e de Pesquisa do Mar. A região de atividade deste Instituto era o Oceano Ártico, com seus mares e estuários, ilhas e costas adjacentes da URSS. A partir de 1923, e em apenas dez anos, foram construídas 19 estações polares radiometeorológicas na costa e nas ilhas do Oceano Ártico. E nas décadas de 30 e 40 foi feita pela primeira vez em um uma única viagem a travessia de toda a Rota do Mar do Norte.

Rota do Mar do Norte

A Rota do Mar do Norte é provavelmente um ativo mais importante no Ártico russo do que as jazidas na plataforma continental. O uso deste corredor, juntamente com a Passagem do Noroeste (localizada na região ártica do Canadá) permite acelerar e simplificar significativamente a troca de mercadorias entre a Europa e a Ásia. Por exemplo, a distância marítima entre Roterdã e Tóquio através do Canal de Suez é de 21,1 mil quilômetros. A rota da Passagem do Noroeste reduz essa distância para 15,9 mil km, enquanto a Rota do Mar do Norte, para 14,1 mil km.

Segundo estimativas de especialistas, a passagem de embarcações pela Rota do Mar do Norte permite uma redução de 40% no tempo de entrega em relação às rotas tradicionais. Resulta daí uma economia de combustível e uma redução do tempo de entrega que, logicamente, vai repercutir na redução dos custos com pessoal e com o frete do navio. Além disso, não existem filas de espera nem limites para o tamanho da embarcação –situação que enfrentam os que enviam e recebem mercadoria através do Canal de Suez.

GNL

O papel da Rota do Mar do Norte tem aumentado significativamente com o aumento do uso de gás natural liquefeito (GNL). Graças a ele, os produtores podem vender "gás natural" de qualquer jazida, independentemente se existem dutos até a ela ou não. E os consumidores se livram dos riscos associados à instabilidade política nos países de trânsito. Neste âmbito, é notável o projeto Yamal LNG, implementado pela empresa russa Novatek em parceria com a francesa Total e a chinesa CNPC.

É claro que o gás oriundo da península de Iamal chegará aos compradores através da Rota do Mar do Norte. Mas, a longo prazo, não podemos descartar a hipótese de as instalações do Yamal LNG virem a ser usadas para liquefazer gás obtido em jazidas da plataforma continental do Ártico.

Ao argumentarem sobre as vantagens da Rota do Mar do Norte, muitos especialistas também mencionam o aquecimento global e o degelo das geleiras, que poderá tornar a rota ártica livre para a navegação comercial durante o ano inteiro (incluindo para grandes petroleiros, que não podem passar nos canais) já no início da década de 2020.

De fato, a área da cobertura de gelo no Ártico está reduzido 5% a cada 10 anos e a espessura das geleiras do mar Ártico é metade do que há meio século. É extremamente importante para a Rússia, no entanto, não só usar eficazmente os recursos do Ártico, mas também ter uma abordagem de cuidado e proteção de modo a manter o equilíbrio ambiental e climático regional existente. Pela mesma razão, é também fundamental ter a divisão das fronteiras do Ártico reconhecida pela comunidade internacional de modo a não deixar qualquer ambiguidade no ar.

Atualmente, elas são definidas com base na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 1982. Segundo este documento, a competência territorial do Estado se aplica apenas à plataforma continental. Quanto ao fundo dos mares e oceanos e seus subsolos, que não estão sob a jurisdição de nenhum país, são considerados patrimônio comum da humanidade. Ou seja, todas as nações do mundo têm direitos iguais de exploração dos recursos naturais aí existentes e qualquer uma delas pode submeter à ONU e a outras organizações internacionais um pedido de exploração dos recursos da plataforma marítima.

Se seguirmos essa lógica em vez de dividirmos o Ártico em setores, como acontecia, por exemplo, antes da adoção da Convenção da ONU, a Rússia perde os direitos soberanos de cerca de 1,7 milhões de quilômetros quadrados de território polar. E, nesse caso, a exploração e captação poderá ser feita por qualquer um. Com todas as consequências que surgem daí, inclusive para o meio ambiente.

 

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