Mikhail Chôlokhov ganhou notoriedade com seu romance épico em quatro volumes “O Don Tranquilo” (1928-1932) sobre os cossacos do Don durante a Primeira Guerra Mundial e a subsequente Guerra Civil. Item obrigatório da literatura clássica russa, seu autor estava envolto em mistério, controvérsia e, ao mesmo tempo, louvor.
1. Famoso pela origem cossaca, escritor não era realmente cossaco
Chôlokhov passou parte de sua infância em um “khutor” cossaco, ou seja, um propriedade rural ou conjunto de propriedades cossacas. Mas não foi exatamente ali que ele nasceu.
Apesar de Chôlokhov ter escrito tão vividamente e extensivamente sobre os cossacos, ele não era realmente um deles. Seu pai era um gerente de classe média de um moinho a vapor, enquanto a mãe era uma camponesa que foi serva antes do casamento.
Chôlokhov nasceu como filho ilegítimo, já que a mãe foi forçada a se casar com outro homem. Seus pais puderam se casar somente após a morte do padrasto do escritor.
2. Vai uma mãozinha de Sartre?
Em 1964, o escritor e filósofo francês Jean-Paul Sartre rejeitou o prêmio Nobel de literatura, escrevendo uma declaração em que expressava pesar pelo prêmio anterior não ter sido dedicado a Chôlokhov.
“A única obra soviética a receber o prêmio foi um livro publicado no exterior e proibido no próprio país”, disse o francês, referindo-se a “Doutor Jivago”, de Borís Pasternak, que ganhou o Nobel de 1958.
Acredita-se que a declaração tenha influenciado o comitê do Nobel, e o prêmio foi concedido a Chôlokhov no ano seguinte “pelo poder artístico e integridade com a qual em seu épico do Don ele conferiu expressão a uma fase histórica na vida do povo russo”.
3. Adaptações cinematográficas de “O Don Tranquilo”
O romance foi adaptado para as telas três vezes na Rússia durante o século 20 (em 1930, 1958 e 1992). A versão de 1958 foi feita pelo renomado diretor Serguêi Guerássimov e recebeu inúmeros prêmios internacionais.
De fama equiparável, Serguêi Bondartchuk, que já levou uma estatueta do Oscar e um Globo de Ouro por sua versão de “Guerra e Paz”, dirigiu a terceira adaptação da obra de Chôlokhov.
O filme foi uma coprodução da URSS, Reino Unido e Itália. Mas o produtor italiano faliu, e um banco italiano tomou quase todo o filme como parte dos procedimentos.
Bondartchuk morreu sem ver seu filme nas telas, mas seu filho, Fiódor produziu postumamente uma versão reduzida dele para a TV.
4. A misteriosa libertação da prisão
Chôlokhov começou a trabalhar aos 15 anos de idade em diversas profissões, desde porteiro a professor escolar. Em 1922, trabalhando como inspetor fiscal em uma aldeia, ele foi preso por aceitar propina e sentenciado à morte em um tribunal.
Seu pai pagou a enorme fiança e produziu um novo certificado para o tribunal afirmando que Chôlokhov tinha 15 anos de idade, e não 17. A sentença de morte foi transformada em um ano de colônia penal para menores.
Chôlokhov estavam sendo escoltado para a colônia, mas nunca chegou e nunca passou qualquer tempo lá. Não se sabe exatamente o que aconteceu durante a viagem.
5. Alegações de plágio
Alguns críticos duvidaram que Chôlokhov fosse o real autor de “O Don Tranquilo”, alegando que ele teria tomado crédito sobre a obra de um oficial do Exército Branco morto pelos bolcheviques.
As dúvidas também foram fomentadas pela sutileza, profundidade e extensão da obra, que, segundo eles, não poderia ter sido escrita por um rapaz de 21 anos e pouca educação formal.
Os apoiadores de Chôlokhov responderam apontando para jovens gênios, como Johann Goethe, Thomas Mann e John Keats, assim como o pouco educado Maksím Górki e Ivan Búnin (que também foi laureado com o Nobel).
A questão foi finalmente resolvida em 1984, quando o eslavista Geir Kjetsaa e seus colegas conduziram profundos testes linguísticos sobre o trabalho que apoiaram a autoria de Chôlokhov.
6. A rixa entre Chôlokhov e Soljenítsin
Estes dois autores, ambos laureados com o Nobel, tiveram uma relação espinhosa. Chôlokhov escreveu uma crítica altamente crítica da obra de Soljenítsin “Um dia na vida de Ivan Denissovitch”, e este respondeu reacendendo as acusações de plágio contra o çprimeiro.
Chôlokhov, por sua vez, apoiou a perseguição de Soljenítsin e assinou a infame carta enviada por um grupo de escritores soviéticos ao editor do jornal “Pravda”, em 321 de agosto de 1973. Nela, Sojenítsin e Sákharov eram acusados de tentar “gerar desconfiança quanto ao estado soviético de políticas pacíficas”.
Além disso, Chôlokhov, que apoiava o Partido Comunista, se opunha a conceder o Prêmio Lênin ao romance de Soljenítsin “Um dia na vida de Ivan Deníssovitch”.
Posteriormente, os escritores passaram a se recusar a comentar as obras um do outro.
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