Com os olhos para o Ártico e para o aquecimento global

Todas as cidades do Ártico estão sobre o permafrost ártico Foto: Alamy / Legion Media

Todas as cidades do Ártico estão sobre o permafrost ártico Foto: Alamy / Legion Media

No final de maio, a Rússia comemora o Dia Polar. Apesar do feriado em honra dos pesquisadores polares ter sido aprovado somente no ano passado, todo o desenvolvimento da história da Rússia está intimamente ligada com os territórios do Norte.

O Ártico russo é lar para cerca de 7 milhões de pessoas –aproximadamente 5% da população russa. Lá há dezenas de cidades, seis das quais em que a população é composta por mais de 100 mil habitantes: Murmansk, Vorkuta, Urengoi, Norilsk, Iakutsk e Magadan. Estas cidades possuem uma população que supera a de todas as outras regiões árticas de outros países combinadas.

Hoje, o Ártico é responsável por mais de 90% da produção de gás russo e dois terços da produção de petróleo. Além disso, de acordo com um relatório do Greenpeace feito em 2009, os investimentos russos na região superam os de todos os outros países que possuem regiões árticas em 62%, somando US$ 140 bilhões.

Após um período de ostracismo durante os anos de 1990, a região é novamente uma prioridade para a Rússia, juntamente com o Extremo Oriente e o Cáucaso. E o desenvolvimento do Ártico depende das mudanças climáticas e do ambiente.

Aquecimento global

“Observa-se no território da Rússia um aumento duas vezes mais intenso do aquecimento em comparação com a média global”, afirma o diretor do Observatório Geofísico de Vladímir Kattsov.

De acordo com os dados do Instituto de Hidrometeorologia (Rosgidrometra), o aquecimento está ocorrendo ainda mais rapidamente. Se a partir 1976 a temperatura média na Rússia cresceu 0,43 graus em dez anos, na costa do Oceano Ártico a média foi positiva de 0,8 no mesmo período.

Hoje acredita-se que o aquecimento global trará benefícios para a região ártica, como, por exemplo, a possibilidade de se desenvolver a agricultura no Círculo Polar Ártico, adaptando cada vez mais a região para a vida humana.

“A agricultura necessita não somente de temperatura amena, mas de bom solo. No Ártico, não há húmus e a qualidade do solo não permite grandes rendimentos”, afirmou à Gazeta Russa o diretor do programa Clima e Economia da Fundação WWF na Rússia, Aleksêi Kokorin. Para que se forme o solo negro (tchernozion) no Ártico serão necessários muitos milênios.

O permafrost está derretendo?

Todas as cidades do Ártico estão sobre o permafrost ártico. Permafrost é a camada superior da crosta terrestre que fica congelada por mais de dois anos seguidos e onde se localiza cerca de 60% do território russo.

Aleksêi Kiziakov, funcionário sênior da Faculdade de Geografia da Universidade de Moscou, afirma que, além do fato de o aquecimento global estar derretendo o permafrost, ele sofre também influência de outros fatores, como a precipitação atmosférica e a distribuição da cobertura de neve sazonal, bem como o tipo de vegetação e a composição geológica dos sedimentos superficiais.

No entanto, de acordo com o vice-diretor do Instituto Permafrost da Academia Russa de Ciências, Victor Shepelev, as afirmações sobre o desaparecimento iminente do permafrost como resultado de mudanças climáticas globais estão exageradas.

" O nosso instituto está literalmente fundado sobre permafrost [o Instituto está localizado em Iakutsk], debaixo de nós há 300 metros de gelo”, afirmou Shepelev. “E de acordo com nossas observações, o permafrost não irá derreter no longo prazo, muito menos desaparecer completamente.”

O permafrost tem um potencial enorme de acumular gelo. Seria necessário um efeito térmico colossal para que o tirasse um pouco do equilíbrio. Por enquanto, os cientistas não conseguem determinar nada, mas, de qualquer forma, muitos já concordam que o permafrost é ameaçado mais pelo ser humano do que pelos processos naturais.

“Em certas regiões observa-se que o impacto humano sobre o permafrost é significativamente mais elevado do que o efeito causado pelo aumento da temperatura”,  afirma Kiziakov.

“Como exemplo pode-se citar que parte do derretimento é causado pelo vazamento de água quente e outros erros de engenharia cometidos durante as prospecções”, completa Shepelev.

Mudanças no hábito de vida

O aquecimento global está também mudando o modo de vida dos povos indígenas do Norte, alterando as rotas de migração de renas e transformando partes do permafrost em pântanos.

Se antigamente a tundra vivia coberta de neve até o início de maio, agora no final de abril não se vê mais neve. Devido à finura da lâmina de neve, os criadores de rena não seguem pelos caminhos tradicionais do inverno. Além disso, essa fina camada de neve derretida se transforma em gelo, dificultando que as renas comam o musgo localizado logo abaixo. Assim, na primavera deste ano, mais de 60 mil renas morreram na Península de Iamal.

Mas o gênio humano conseguiu superar as dificuldades. “A solução é simples: precisamos de um trator que quebre a lâmina de gelo e crie rachaduras na crosta”, afirma Kokorin. “Para antecipar possíveis consequências negativas, nós precisaremos criar mapas na área a cada 10 km² para compreender bem os problemas e fornecer soluções.”

Manter o Ártico limpo

Juntamente com os eventos das mudanças climáticas no Ártico russo, há outros fatores antrópicos adicionais que incluem a poluição química, a pesca predatória, o alto crescimento populacional e as mudanças econômicas e de infraestrutura.

“Atualmente, a posição mais enfática do governo russo é manter a limpeza no Ártico. Na verdade, ele está mais limpo [do que antes]. Uma das ilhas da Terra de Franz Josef – Alexandra– está completamente descontaminada", disse à Gazeta Russa Artur Chilingarov, representante especial da Presidência da Rússia para assuntos do Ártico e Antártida.

O problema é que os territórios do Extremo Norte foram utilizados pela União Soviética como bases militares e  de enterro de resíduos químicos e nucleares. Somente da Ilha de Alexandra foram retirados mais de 50 mil tambores de aço com mais de 5.000 toneladas de resíduos pesados em 2012.

Estão na espera para serem descontaminadas toda a costa ártica, as ilhas de Graham Bell, outras da região de Franz Josef, Wrangel e as Ilhas Nova Sibéria.

A ilha de Graham Bell era anteriormente um campo de pouso e hoje um depósito de petróleo (300 mil barris) que passará por um processo de desativação.

Planeja-se descontaminar a região de Franz Josef em 8 anos com uma despesa de cerca de 8,5 bilhões de rublos (cerca de US$ 250 milhões).

A fim de reverter a situação ecológica no Ártico, a operação Limpeza de Primavera, que durará até 2025, possui um orçamento de 22,9 bilhões de rublos (cerca de US$ 670 milhões), dos quais 21,7 bilhões (cerca de US$ 633 milhões) provém do orçamento federal russo.

 

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