Além do trigo, a madeira é outra matéria-prima abundante na Rússia e os avanços científicos nessa área poderiam resultar em divisas futuras para a economia do país Foto: ITAR-TASS
A busca mundial por fontes limpas de energia, ainda que novas jazidas de petróleo estejam sendo descobertas e o xisto entre em cena em alguns países, poderia contar com um esforço mais decisivo da Rússia. A despeito de possuir enormes reservas de hidrocarbonetos, há massa crítica suficiente entre seus centros de pesquisas, sobretudo para o que se chama hoje de biocombustíveis de 2ª geração.
A afirmação é do físico russo Ígor Polikarpov, uma das principais autoridades em bioenergia do Brasil, conhecedor das pesquisas daquele país no avançado campo dos combustíveis extraídos da palha e resíduos de várias biomassas – cientificamente conhecido por lignocelulose ou simplesmente etanol celulósico.
“Há [na Rússia] uma tradição científica e industrial que não deve ser menosprezada”, afirma o professor titular do Instituto de Física de São Carlos (Ifsc) da Universidade de São Paulo (USP) e vice-diretor da Rede USP de Bioenergia.
Na verdade, uma tradição que remonta à Segunda Guerra Mundial, quando para suprir suas necessidades energéticas os russos, tanto quantos os alemães, desenvolveram e produziram o etanol celulósico da madeira, fato pouco conhecido da historiografia.
“Aquelas plantas devem ter sido desativadas nos anos 50 ou 60, mas, apesar da sua tecnologia não ser eficiente para as necessidades de alta produtividade requerida hoje, o conhecimento ficou”, diz Polikarpov, nascido em Ulianovsk, na Rússia Central, e criado em Minsk, Bielorússia, desde os 10 anos.
Radicado no Brasil desde 1995, o especialista em biocombustíveis de 2ª geração cita os Institutos de Física da Academia de Ciências Russa em São Petesburgo e da Universidade de Moscou, bem como o Instituto de Química da última, como pólos de estudos científicos avançados com os quais sua unidade discute possibilidades de colaboração.
O domínio desses centros nos estudos de enzimas, em especial sob as lideranças dos renomados professores Arkádi Sinítsin e Aleksandr Golubev, área à qual Igor Polikarpov também se dedica, é de onde poderia vir a contribuição bastante importante à produção do etanol celulósico.
"Isso porque a rota tecnológica mais eficiente para quebrar os açúcares a serem transformado em etanol e encontrados nas fibras de algumas biomassas é a “rota enzimática”, afirma.
Além do conhecimento sobre esse biocombustível adquirido ao longo de décadas nas plantas existentes durante a Segunda Guerra Mudial - ainda que pela rota de hidrólise ácida - os trabalhos russos em enzimologia já propiciaram a produção de vários compostos químicos a partir da biomassa, como o furfural, derivado do farelo de cereais.
O cientista da USP lembra que no Brasil, país pioneiro na aplicação mercadológica do biocombustível convencional de 1ª geração, o etanol celulósico, também da cana de açúcar, já começa a entrar no mercado.
Mas os estudos não param entre os vários grupos espalhados em centros acadêmicos do país, boa parte dos quais em parcerias com empresas. Isso porque há necessidade de tornar as enzimas, hoje desenvolvidas por empresas de bioctecnologia como a dinamarquesa Novozymes, mais eficientes e mais baratas.
“Mais eficiente para dar mais produtividade ao etanol e de custo mais baixo para os produtores, de modo a tornar o combustível mas barato”, completa.
O mesmo ocorre em muitos países que Polikarpov identifica como ricos em reservas naturais, entre os quais o Canadá e os Estados Unidos, além do próprio Brasil com as novas descobertas de petróleo, mas cujos governos continuam incentivando as universidades e a formação de parcerias com o setor privado. Na sua opinião, o governo russo deveria adotar os projetos como uma política de governo.
Apesar de ser uma economia baseada no petróleo, e não possuir biomassas em abundância como o Brasil – além do trigo, a madeira é outra matéria-prima abundante na Rússia – os avanços científicos nessa área poderiam resultar em divisas futuras para a economia do país. “E ajudar no combate à poluição global”, arremata.
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