Crescer com os pés no chão

PIB da China medido pela paridade de poder de compra deve ultrapassar o dos EUA em 2014 ou 2015, mas dados exigem cautela Foto: Konstantin Zavrájin/RG

PIB da China medido pela paridade de poder de compra deve ultrapassar o dos EUA em 2014 ou 2015, mas dados exigem cautela Foto: Konstantin Zavrájin/RG

Futuro de crescimento econômico não está garantido para nenhum país, mas será o resultado da adoção de políticas públicas e estratégias empresariais que conduzam ao aumento da produtividade geral da economia.

O Banco Mundial divulgou há pouco um estudo prevendo que o PIB da China, medido pelo método da PPC (paridade de poder de compra), deve ultrapassar o dos Estados Unidos em 2014 ou 2015. Há uma década, o banco de investimento Goldman Sachs, criador do acrônimo Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), tinha previsto a ultrapassagem do PIB nominal (medido em dólares, com base na taxa de câmbio real entre os países) dos EUA pelo da China em algum momento da década de 2020.

No ranking de 2013 do FMI (Fundo Monetário Internacional), o PIB nominal chinês é a metade do americano, enquanto no ranking do Banco Mundial de 2012, o PIB nominal chinês corresponde a cerca de um terço do americano.

Pelo método PPC, se uma cesta básica custa US$ 100 no país A e a mesma cesta básica US$ 20 no país B, um dólar no país B tem maior poder de compra do que no país A. Portanto, pelo método da PPC, os valores dos bens e serviços no país B devem ser ajustados para que um dólar tenha o mesmo poder de compra nos dois países. Esse tipo de cálculo inflou o PIB chinês da noite para o dia e gerou grande mídia no mundo inteiro, mas a realidade é um pouco mais complexa.

Ao importar tecnologia dos EUA ou armamentos de Israel, a China tem de pagar em dólar. Quando adquire minas na África, importa Porsches ou financia estudantes numa universidade americana, a China também paga em dólar. Então, o método da PPC é útil para ilustrar o poder de compra relativo a uma cesta básica doméstica, mas não reflete o real poder de compra das nações, já que a maior parte dos fluxos financeiros internacionais é denominada em dólar ou euro.

Segundo estudo da consultoria PWC, se tomarmos os países do G7 (EUA, Japão, Canadá, Alemanha, França, Reino Unido e Itália), seu PIB nominal conjunto é atualmente o dobro do dos países do E7 (Brasil, China, Índia, Rússia, México, Indonésia e Turquia) e 20% maior se calculado pelo método PPC. Em 2050, a estimativa é de que o PIB do E7 seja 50% maior do que o do G7 em termos nominais e, se medido pelo método da PPC, 75% maior. Já em 2017, medido pelo método da PPC, o PIB do E7 deverá ultrapassar o do G7.

Tendências

Essas previsões são úteis porque iluminam tendências em curso, mas não podem ser tomadas ao pé da letra e virarem motivo de comemoração antecipada por parte dos países do E7 ou dos Brics ou de qualquer outro agrupamento. Primeiro, porque os preços relativos no E7 tendem a aumentar mais do que no G7, um fenômeno já observado no passado em outros países emergentes, como Japão e Coreia do Sul, fazendo com que o PIB nominal tenda a convergir para o medido pelo método da PPC. Segundo, porque projeções lineares não dão conta do fato de que a realidade é, em geral, quântica, no sentido de que avança de forma não linear.

Não custa lembrar que, durante a Guerra do Vietnã, a previsão era de declínio econômico e político dos EUA. No governo Jimmy Carter e com a crise do petróleo a partir de 1979, o "declínio americano" voltou à ordem do dia, só sendo superado por volta de 1984, já no governo Reagan. Depois, falou-se na ascensão global do Japão, com crescimento do PIB de dois dígitos, o que terminou numa prolongada depressão a partir de meados dos anos 90.

Agora, sobretudo a partir de 2008, fala-se na ascensão da China como o próximo número um. Mas o crescimento chinês tem se baseado em mão de obra abundante e barata, o que deve acabar em breve na China, por razões demográficas (envelhecimento da população) e sociais (pressão por melhores salários à medida que o país cresce). Um novo tipo de crescimento baseado em aumento da produtividade requer inovação e empreendedorismo, o que, por sua vez, tem vicejado sobretudo onde há liberdade. A China tem pela frente, portanto, grandes desafios para continuar crescendo de forma acelerada.

O futuro é, por definição, imprevisível. Embora as empresas e os governos devam preparar cenários que os orientem em suas ações presentes, devemos estar sempre preparados para lidar com eventos extraordinários que alterem em graus variados o curso esperado dos acontecimentos. Em outras palavras, um futuro de crescimento econômico não está garantido para nenhum país, mas será o resultado da adoção de políticas públicas e estratégias empresariais que conduzam ao aumento da produtividade geral da economia.

Não adianta ficarmos alardeando previsões e cenários favoráveis, os quais somente se concretizarão mediante decisões corretas e trabalho árduo. Devemos sonhar alto enquanto indivíduos, empresas e nações, mas manter os pés no chão. 

 

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