Ilustração: Sergêi Iórch
A resistência de Assad, uma relativa neutralidade dos EUA e a oposição da Rússia e da China a uma solução militar para a crise síria congelam a situação no país, que está no centro das atenções do Ocidente, Turquia, Israel e das monarquias sunitas.
Ações enérgicas de uma das partes beligerantes podem impulsionar a deterioração da situação no Oriente Médio.
A guerra civil na Síria apresenta sinais de uma virada. Em uma reunião em Doha, no Catar, a oposição síria anunciou que iria se unir sob a égide da CNS (Coalizão Nacional Síria). Agora, as forças externas que apoiam a oposição síria têm uma oportunidade formal de aplicar o roteiro líbio ao solo sírio e declarar como primeiro passo a CNS como "governo legítimo" do país.
A Liga Árabe não foi tão longe e se limitou a reconhecer a coalizão como porta-voz legítimo dos interesses da oposição. Já as seis monarquias do GCC (Conselho de Cooperação dos Estados Árabes do Golfo) disseram que a CNS é um representante legítimo do povo sírio.
Pouco tempo depois, sua posição foi apoiada pela França. É sintomático que a França tenha sido o primeiro país a reconhecer a oposição líbia e a iniciar uma operação militar contra as tropas de Gaddafi, envolvendo nela os outros países da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
No caso da Síria, a situação é bem diferente. É pouco provável que os Rafale e Mirage atinjam a Síria a partir do território francês. Também é pouco provável que o presidente François Hollande se aventure a enviar seu único porta-aviões à costa da Síria. Toda a aviação naval da França é composta por 23 aviões Rafale M F3 e entre 30 e 40 Super Étandard obsoletos. Essa força é demasiadamente pequena para romper a defesa antiaérea síria.
O mais provável é que Hollande e xeques e reis árabes esperem que uma guerra contra a Síria seja iniciada pelos EUA. Afinal, o vencedor da eleição presidencial americana, Barack Obama, tem agora as mãos desatadas. Mas Washington não se mostra entusiasmada com essas expectativas e continua com apoio exclusivamente político à oposição síria.
Portanto, todo o mundo espera que o regime de Assad venha a cair sob golpes dos rebeldes e que uma intervenção militar externa não seja necessária. Ninguém descarta a hipótese de uma intervenção militar da Otan. Por isso, os rebeldes não param de atacar as instalações da defesa antiaérea síria.
Como a própria oposição não ganha nada com isso, podemos supor que as incursões à defesa antiaérea síria são orquestradas externamente e visam à destruição dos obstáculos a uma eventual intervenção militar externa. Mas como as condições para a mesma ainda não foram criadas e a defesa antiaérea e o exército sírio continuam em condições de atuar, a guerra no país continua a ser civil.
Irã, Israel e EUA
Enquanto isso, a liderança israelense começou a se preparar para atacar o Irã na defesa de sua retaguarda. O Hamas é um dos principais recursos do governo de Teerã para aplicar uma medida de retaliação assimétrica contra Israel.
Ao destruir a infraestrutura militar do grupo e seus estoques de foguetes, os israelenses removeram esse problema da ordem do dia por um longo tempo e reduziram os riscos para sua principal missão: a destruição da infraestrutura nuclear iraniana.
Como a Força Aérea Israelense está com um potencial limitado, o governo do país gostaria de que seu trabalho, pelo menos em parte, no Irã fosse feito pelos EUA. Mas o presidente americano não se declara entusiasmado com essa perspectiva depois que os EUA fizeram o possível para evitar uma operação terrestre israelense na Faixa de Gaza.
Além disso, os EUA disseram que os reparos do porta-aviões Nimitz, que deveria chegar em janeiro de 2013 ao Golfo Pérsico para substituir o Dwight Eisenhower, iriam se prolongar até o verão, pelo menos. Portanto, no período entre dezembro de 2012 e janeiro de 2013, apenas um porta-aviões americano, o John Stennis, estará na região. Isso quando para a realização de um ataque, ainda que limitado, contra o Irã são necessários ao menos três porta-aviões.
Pode ser que o reator do Nimitz, que será removido do serviço em 2018, esteja mesmo com problemas. Mas também pode ser que Washington tenha deixado claro ao governo israelense que seu plano de envolver os EUA no conflito atacando o Irã sem consultas prévias à administração americana, como fez a França na Líbia, não vai dar certo.
Obama não precisa mais pensar na reeleição e está mesmo com as mãos desatadas. Por essa razão, vai tentar evitar o envolvimento de seu país em guerras e conflitos.
Os EUA irão se voltar para o Leste Asiático para conter a expansão chinesa. Portanto, as expectativas de Paris, Riade, Doha, Ancara e Tel-Aviv, de que os EUA comecem a lutar contra a Síria e/ou o Irã, não fazem muito sentido.
Por outro lado, é difícil supor que a demasiadamente tensa situação no Oriente Médio seja resolvida sem uma grande guerra.
O Egito, que tem as forças armadas mais fortes no mundo árabe, dificilmente se colocará ao lado das monarquias. Os exércitos das monarquias são bem armados, mas seus soldados não estão prontos para morrer em uma guerra de verdade.
Os países da Otan, como demonstra a experiência na Líbia, aceitarão participar de forma limitada, e só em operações aéreas, nunca em uma operação terrestre. Nessas circunstâncias, a Turquia dificilmente vai querer parecer menos inteligente do que os outros países e morrer sozinha.
No final das contas, o fator decisivo é a estabilidade do regime de Bashar Assad. O líder sírio, por sinal, não está destruindo seu próprio povo, ao contrário do que fazem crer o Ocidente e, por mais engraçado que pareça, os regimes despóticos medievais árabes liderados pela Arábia Saudita.
Bashar Assad reflete os interesses de boa parte do povo sírio, principalmente as minorias étnicas e religiosas (alauítas, cristãos, curdos), que somam juntas quase metade da população.
Além disso, a liderança síria conseguiu avaliar corretamente a situação internacional e não ficou com medo da "toda-poderosa" Otan.
Cabe notar que a estabilidade psicológica é impossível sem um exército forte, ainda que equipado com material de guerra obsoleto. Essa é a lição fundamental do conflito sírio.
Aleksandr Khramchikhin é vice-diretor do Instituto de Análise Política e Militar
http://vpk-news.ru/articles/13429
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