Islã político está se revigorando

Ilustração: Aleksêi Iosch

Ilustração: Aleksêi Iosch

Para Evguêni Satanóvski, presidente do Instituto de Estudos sobre o Oriente Médio, isso pode estimular as tentativas de estendê-lo para além da região; visita do ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguêi Lavrov, à Arábia Saudita demonstrou que os atores locais não têm nenhuma intenção de levar em conta a posição russa nem discutir com Moscou a situação na Síria.

Como sempre, a situação no palco de operações militares do Oriente Médio não inspira otimismo. Mas como pode-se falar de otimismo político em relação a uma região abalada, no início do século 21, por transformações tão impetuosas e importantes quanto aquelas que atingiram a Europa no final da segunda década do século 20?

A Primavera Árabe continua se desenvolvendo, atingindo um país após outro, apesar de a onda de quedas dos regimes laicos autoritários que levou ao poder o islã político e não um governo democrático, à exemplo de países ocidentais, ficar parada na Síria. A guerra civil no país virou um confronto entre diferentes comunidades étnicas e religiosas e envolve atores externos, cada um dos quais com seus objetivos e interesses.

Os principais organizadores e patrocinadores dessa guerra são Catar, Turquia e Arábia Saudita, apoiados pelo Ocidente. A Síria está se tornando o principal alvo de voluntários jihadistas internacionalistas. Em caso de queda do regime de  Bashar Assad, o país tem todas as chances de se tornar um "estado inconsistente" ou se desintegrar.  A formação de uma nova "oposição unida" em Doha põe em evidência uma aliança entre Catar, Turquia, EUA, França e a Arábia Saudita, que apoia os grupos salafistas radicais na Síria.

Na opinião dos opositores de Assad, nenhum compromisso com seu regime é   possível. Portanto, quaisquer projetos, inclusive dos russos, voltados para dar fim ao confronto armado na Síria serão bloqueados. A visita do ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguêi Lavrov, à Arábia Saudita demonstrou que os atores locais não têm nenhuma intenção de levar em conta a posição russa nem discutir com Moscou a situação na Síria.

"Primavera Centro-Asiática"

 

O revigoramento do islã político nos países do Oriente Médio pode estimular as tentativas de estendê-lo para além da região.

Nesse contexto, a probabilidade de Uzbequistão e Cazaquistão poderem enfrentar, às vésperas da mudança de geração nos escalões superiores de poder, uma "primavera centro-asiática" preparada no território do Quirguistão ou Tadjiquistão é extremamente grande. Isso significa também que a "islamização democrática" pode atingir também a região autônoma de Xinjiang Uigur, na China, e as regiões do Volga e do Mar Cáspio, na Rússia.

Tecnicamente, não é nada difícil organizar agitações populares e confrontos entre os islamistas e as autoridades locais no interior da Rússia e no noroeste da China sob a bandeira da liberdade religiosa e da justiça social e com o apoio da comunidade internaciona". As organizações salafistas na Ásia Central e na Rússia, assim como os separatistas uigures na China, podem ser utilizados para isso, até porque são financiados a partir dos mesmos centros de influência da Primavera Árabe.

A Rússia tem possibilidades de fazer frente à ameaça islamista em seu território nacional, embora a situação vivida no Cáucaso Setentrional (sobretudo no Daguestão, no Tartaristão e no Bascortostão –repúblicas federadas da Rússia) deixe espaço para a preocupação. A operação antiterrorista em Kazan, centro administrativo do Tartaristão, mostrou a gravidade do problema.

Nessas circunstâncias, uma cooperação com os governos da Ásia Central e da China assume especial relevância face à próxima retirada do contingente de tropas dos EUA (e dos outros países da coalizão) do Afeganistão.

Moscou à parte

As possibilidades de a Rússia influenciar diretamente os países interessados na difusão da Primavera Árabe e no revigoramento do islã político são extremamente limitadas, para não dizer nulas, pelo menos em seus territórios nacionais. O único país interessado em dialogar com a Rússia é a Turquia, que se orienta por seus interesses econômicos e segue suas regras, balançando entre o Ocidente e os países árabes, China e Rússia.

As monarquias do Golfo mostram uma crescente hostilidade em relação a Moscou. A retórica dos veículos impressos e eletrônicos por elas controlados faz lembrar a época da guerra soviético-afegã dos anos 1980. A única diferença é que, na época, estavam com medo da União Soviética e agora não têm medo da Rússia.

O Irã não se sente agradecido à Rússia por seu apoio a longo prazo na ONU nem pela construção da usina nuclear em Busher, apesar da pressão internacional. Ao mesmo tempo, ao contrário das expectativas dos apoiadores da cooperação russo-iraniana, o Irã continua insistindo na revisão das esferas de influência no Mar Cáspio.

Dado que a empresa russa Gazprom está enfrentando uma pressão cada vez maior por parte do Catar e da Argélia no mercado europeu, cujo fornecimento de gás à Europa deve diminuir a dependência dos países do continente em relação à Rússia, as restrições impostas pelo Irã às exportações de petróleo e gás não são um problema grande para Moscou, antes pelo contrário.

Evgeni Satanovski, presidente do Instituto de Estudos sobre o Oriente Médio

Para a versão completa do artigo em russo, clique em: http://vpk-news.ru/articles/13219

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