Em palestra em São Paulo, descendentes de Vigótski explicam como teoria do pensador ajuda a evitar, entender e recuperar jovens criminosos. Foto: Divulgação
Dos três aos sete anos de idade ninguém consegue cometer crimes. Mas, o que as crianças vivenciam nessa faixa de idade determina como serão no futuro. É o período em que elas formam seu cabedal de emoções e de interesses que poderão torná-las criminosas ou não.
Essa tese foi defendida nas palestras dos três mais viscerais seguidores de Lev Semionovitch Vigótski (1896-1934): sua neta, Elena Kravtsova, o marido Guennádi Kravtsov e o filho do casal, Oleg Kravtsov.
Os três vieram especialmente de Moscou a São Paulo no sábado passado (20), a convite do Ipaf (Instituto de Psicologia Aplicada e Formação Lev Vigótski).
Comportamento criminoso
Doutor em Psicologia Criminal, de um centro especializado em pesquisa criminal na Universidade Estatal de Humanidades de Moscou, Oleg Kravtsov se dirigiu a uma plateia de 200 psicólogos e educadores, na maioria mulheres, em inglês.
Ele recorreu aos ensinamentos do bisavô para explicar porque um adolescente envereda pelo crime, mesmo quando vive em uma boa família, sem problemas financeiros.
“O ambiente influencia, mas não é determinante. O problema está no desenvolvimento da personalidade dele”, afirmou Oleg. “O comportamento criminoso é característica de seu desenvolvimento.”
Oleg afirma que o adolescente comete crimes porque alguém lhe mostrou como fazer - seja quem esteja próximo, como os amigos, seja por meios externos, como o cinema e a televisão.
Para se aproximar do adolescente é preciso entendê-lo. Mas como entender um jovem na idade da transição?
“Vigótski diz que a chave para entender o adolescente é entender qual é o seu interesse”, explica Oleg.
Os interesses
São quatro os tipos de interesse do adolescente, de acordo com Vigótsky. O primeiro é o interesse egocêntrico, centrado na sua aparência, na sua posição na sociedade, na sua autorrealização.
“Os adolescentes precisam de espaço para sua autorrealização. Às vezes eles optam pelo comportamento criminoso para mostrar quem são.”
O segundo tipo é o interesse conectado com o futuro, o terceiro, o interesse por desafios, e o quarto, o interesse romântico.
“Se um adolescente comete crimes, tem algum interesse não desenvolvido”, explica Oleg.
De acordo com ele, os interesses devem ser desenvolvidos na criança desde cedo. “A única forma de fazê-lo é por meio de um grupo social, seja de dez pessoas ou de duas que se reúnem para fazer coisas interessantes.”
O professor “tolo”
O pai de Oleg, Guennádi Kravtsov, doutor pela Universidade Estatal de Humanidades de Moscou, dirige há vinte anos, a Escola-Chave (Key School) que emprega no dia a dia as ideias de Vigótski.
Lá, crianças de três a sete anos frequentam aulas não tradicionais, nas quais são ajudadas a descobrir e desenvolver seus interesses.
O que é uma aula não tradicional? Começa com os alunos não agrupados pela mesma faixa etária.
“Classes da mesma idade facilitam o trabalho do professor, mas para as crianças é ruim”, explica Guennádi.
“Para elas é mais enriquecedor conviver com amigos de várias idades, o que, aliás, foi uma característica que se perdeu no tempo, quando famílias de avós, pais, filhos e primos viviam juntos e as crianças podiam aprender experiências variadas e criar seus interesses.”
Além disso, há dois professores na classe. Um deles fica à frente dos alunos; o outro, atrás. Este faz o papel do “adulto tolo”, que não consegue apreender ensinamentos simples do professor, como, por exemplo, responder “bom dia” quando uma pessoa diz “bom dia”.
Assim, as crianças passam a ensinar o “adulto tolo” tornando-se momentaneamente suas professoras.
Todas as situações em classe ou fora dela giram em torno de criatividade e liberdade.
Neta de Vigótski e doutora pela Universidade Estatal de Humanidades de Moscou, Elena Kravtsova defende que a brincadeira é essencial na educação, dada a riqueza de experiências proporcionadas.
“Não é correto colocar a brincadeira como algo que a criança faz antes de ir à escola. A brincadeira tem que estar na escola, pois faz parte do processo educativo”, diz.
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