Um caso raro de simbiose econômica

Ilustração: Niyaz Karim

Ilustração: Niyaz Karim

A venda da TNK-BP, comandada pela petrolífera britânica BP e um quarteto de bilionários russos, para a Rosneft parece à primeira vista um negócio vantajoso para todas as partes. O anúncio foi realizado pelo diretor-executivo da Rosneft, Ígor Sétchin, em uma reunião com o presidente Vladímir Pútin na última segunda-feira (22).

Embora os investidores estrangeiros tenham historicamente receio de fazer negócios na Rússia – pelo menos não a BP em sua rentável, porém problemática, parceria com a TNK – os presságios atuais são bons.

A gigante petrolífera britânica vai obter aquilo que sempre precisou – uma parceria real com o Kremlin – enquanto tenta finalmente se recuperar de um trauma após o derramamento do Golfo do México em 2009 que ameaçou a afundar a companhia de uma vez por todas. Ao alinhar seus interesses com os da Rosneft, a BP torna-se ainda um parceiro privilegiado do Kremlin em novos projetos de exploração.

Por outro lado, a petrolífera russa Rosneft, sob o olhar atento de Setchin, aliado próximo de Pútin, irá ganhar uma produção combinada de mais de 4 milhões de barris por dia por meio da aquisição de toda a produção da TNK-BP, além de domínio de facto sobre o setor de petróleo do país.

Com novas proporções, a Rosneft será capaz de redefinir e ampliar suas metas além das fronteiras atuais. Tudo isso somado ao trabalho conjunto com um parceiro financeiramente astuto e tecnologicamente avançado como a BP, vinculada à Rosneft não só por sua participação acionária, mas também pelo desejo de obter acesso às reservas do Ártico.

Até mesmo os bilionários russos cuja participação será vendida para a Rosneft podem ficar satisfeitos com o futuro acordo. Ao comercializar suas ações ao mesmo tempo que a BP, eles parecem certos de que se trata de uma saída lucrativa e organizada. Evitar a possibilidade de permanecer um parceiro júnior da Rosneft por um período prolongado também será, sem dúvidas, um estímulo para os magnatas concretizarem a venda.

Obviamente, mesmo que os acordos complexos pareçam ter esclarecido as últimas fases da negociação, assinalada pelo encontro de Setchin com Pútin, o problema pode residir nos pormenores.

De acordo com a primeira parte do acordo de duas fases, a empresa britânica irá receber US$ 17,1 bilhões em dinheiro e 12,8% da Rosneft em ações. Na segunda etapa, a BP irá pagar US$ 4,8 bilhões para comprar outra participação de 5,7% na Rosneft.

Enquanto isso, a AAR, o consórcio russo controlado por Mikhail Fridman e German Khan do Alfa Group, Len Blavatnik do Access Industries, e Víktor Vekselberg do Renova, receberá um “pagamento em dinheiro” no valor de US$ 28 bilhões.

Em primeiro lugar, a Rosneft terá que obter empréstimos de bancos ocidentais para financiar a primeira parte da transação com a BP. Mas, com suas conexões no Kremlin, isso pode parecer uma conclusão precipitada, já que ajuda poderia vir como uma garantia soberana.

A segunda parte do acordo, a ser paga para os bilionários da AAR, pode ser mais complicada – e prolongada. Presume-se que os magnatas russos querem ter o dinheiro em suas mãos em pouco tempo. Isto é, enquanto a economia russa continuar relativamente forte em comparação a seus pares europeus e antes que o Kremlin mude de ideia sobre a quantia da transação.

Mas, no fim das contas, o maior beneficiado com o acordo deve ser a própria Rosneft. Com acesso inigualável às reservas do país, a empresa vai finalmente se tornar o que a Rússia tem buscado há muito tempo: um verdadeiro campeão nacional de energia, com um alcance que se estende a todos os cantos do mundo.

A aliança BP-Rosneft pode anunciar uma onda de fusões e aquisições, não apenas no setor de petróleo e gás da Rússia, mas até mesmo em nível internacional. A aquisição da gigante norte-americana Amoco pela BP no final da década de 1990, por  exemplo, gerou uma histeria para consolidação da indústria entre os seus concorrentes.

O acordo é também outro lembrete, embora não necessário, de como é fácil para os empresários de Wall Street e Big Oil virar a página dos infortúnios do passado. Aparentemente, ninguém pareceu dar muita importância à venda frustrada de uma participação da Yukos a uma petrolífera norte-americana em 2003 enquanto as negociações de segunda-feira prosseguiam.

Tim Wall é editor de economia e negócios globais da Gazeta Russa

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