Protestos iminentes ainda abalam governo

Pesquisas públicas mostram que Pútin tem apoio de quase 50% da população Foto: Reuters/Vostock-Photo

Pesquisas públicas mostram que Pútin tem apoio de quase 50% da população Foto: Reuters/Vostock-Photo

Cem primeiros dias de Pútin na presidência provam que crise política na Rússia não foi superada. Apesar do apoio de parte considerável da população, governo está tomando medidas paliativas para conter a agitação pública.

Os inúmeros protestos com que a classe média moscovita respondeu à vitória de Pútin nas eleições e à sua volta ao Kremlin migraram para as redes sociais. Entretanto, os especialistas não excluem a possibilidade de uma nova onda de manifestações nas ruas no segundo semestre deste ano.

A próxima mobilização em massa em Moscou está planejada para o dia 19, data em que se comemora o chamado “golpe de agosto”, ocorrido em 1991.

O receio de uma nova onda de protestos não está fundamentado apenas no tumultuado e, na opinião de muito russos, injusto processo contra o grupo Pussy Riot, mas também em recentes revistas policiais de destacados representantes da oposição.

Além disso, as leis recém-aprovadas que dificultam a atividade das organizações sem fins lucrativos, acentuam a responsabilidade por violações no campo das manifestações de massa e introduzem a imputabilidade criminal por calúnia, geraram certo desconforto em algumas classes sociais.

Mais do que as normas em si, o que causa inquietação é a prática jurídica disseminada na Rússia, segundo a qual atos aparentemente lógicos podem se transformar em mecanismos de repressão das opiniões dissidentes.

“O sistema político têm conseguido evitar medidas abertamente repressivas contra os chamados dissidentes e os participantes dos protestos”, comenta o diretor-geral do Centro de Informações Políticas, Aleksêi Mukhin.

Para abrandar o potencial de confronto, o governo tem tomado medidas não apenas jurídicas, mas também organizacionais. Entre as medidas, está prevista, a partir do início do ano que vem, a transmissão da Televisão Social, cuja política interna do canal não vai depender do Kremlin nem de qualquer partido político.

Paralelamente, a legislação russa foi abastecida também com regras relativamente liberais, como a simplificação das normas de registro de partidos políticos e o restabelecimento, embora com algumas limitações, das eleições diretas para dirigentes regionais.

“Parte significativa do movimento de protesto aceitou as novas regras do jogo. Não causa surpresa o registro de mais de 126 partidos, de modo que a concorrência das elites no decorrer da preparação para as primeiras eleições nas províncias aumentou drasticamente”, afirma o diretor-geral da Agência de Comunicação Política e Econômica, Dmítri Orlov.

  

Também estão sendo criadas, junto aos órgãos da administração governamental, diversas entidades consultivas com a participação oposicionistas de destaque. Para o Conselho Social, ligado ao Ministério da Educação e Ciência, por exemplo, foram convidados um dos mais ativos participantes dos protestos do primeiro semestre deste ano, o escritor Dmítri Bikov.

Precipício econômico

As ações desencontradas dão aos especialistas motivos para duvidar de que, nesses primeiros 100 dias na presidência, Pútin tenha conseguido seguir um sentido único. Nesse contexto, o equilíbrio entre as orientações políticas contrárias pode ser considerado como um razoável sinal de flexibilidade.

Em piores condições, contudo, está a economia, já que ainda não foram iniciadas as esperadas mudanças estruturais.

“A tarefa básica de Pútin é se afastar do modelo econômico aplicado nos últimos doze anos, baseado na exportação de matérias-primas para o Ocidente”, diz o cientista político Pável Sviatenkov.

O especialista acredita que se a economia continuar a se desenvolver nesse mesmo rumo, o setor vai se tornar cada vez mais vulnerável. Além de uma degradação generalizada, inclusive no campo das Forças Armadas e da indústria, surgirá a ameaça de falência do Estado caso os preços do petróleo sofram uma queda muito acentuada.

“Mas é complicado elaborar uma estratégia em época de reconstrução política, pois é necessário assumir determinados compromissos”, diz Vladímir Slatinov, especialista do Instituto de Pesquisas Político-Humanitárias.

Outros especialistas compartilham tal opinião, propondo o desmonte do “poder vertical” criado por Pútin e o desenvolvimento da autonomia administrativa regional e local.

Alguns deles preveem, inclusive, que Pútin cuidará disso em breve, depois de ter realizado a sua principal tarefa nesses primeiros 100 dias: demonstrar a legitimidade de sua presença no posto de presidente.

Resta esperar que a situação não chegue à falência do Estado. Afinal, por trás das manifestações políticas, encontram-se, via de regra, problemas econômicos; e quanto mais profundos esses problemas, mais ativos serão os protestos.

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