Russos visitam maior campo de refugiados sírios na Turquia

Foto: RG

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Na pequena província turca de Kilis, localizada a cinco quilômetros da fronteira com a Síria, encontra-se o maior campo de refugiados sírios. Ao contrário do receio inicial, os jornalistas que visitavam o local com aprovação da diplomacia turca encontraram um vilarejo tranquilo e bem estruturado.

Ao chegarmos no vilarejo, o representante turco Suphi Athan pediu para não dizermos a ninguém que éramos russos. A intenção era evitar “reações indesejadas”.

Na verdade, ele não acreditava que jornalistas russos se atrevessem a chegar ao campo de refugiados sírios até que nos viu com seus próprios olhos.

O intérprete contratado para nos acompanhar também demonstrou certo medo ao dizer que se colocava em grande risco pela nossa equipe. No fim de contas, resolvemos que um de nós iria se apresentar como jornalista ucraniano e o outro, como russo.

No entanto, o campo de refugiados está localizado em uma zona neutra. Ocupa uma área de trinta e seis hectares e não se parece em nada com os campos de refugiados de guerra vistos antes.

Ali não há tendas nem enormes filas de pessoas aguardando sua vez de receber alimento. Também não existem mulheres aos prantos nem crianças imundas pedindo esmolas.

 

Infraestrutura moderna

 

Mais de dois mil contêineres pintados com tinta branca formam um pequeno vilarejo.

Além de duas escolas com capacidade para cinco mil alunos cada, há duas mesquitas, lojas, hospital, pequenos mercados, agência bancária, playgrounds, centro de imprensa e uma delegacia de polícia.  O local conta até com pontos de acesso gratuito à internet.

Cada casa-contêiner, por sua vez, está equipada com ar condicionado e sistema de esgoto e abastecimento de água. Sobre diversos contêineres pode-se ver ainda antenas de TV por satélite.

No total, 11 mil pessoas, moram na vila em sua maioria, crianças e velhos, procedentes das províncias fronteiriças do norte da Síria. Os homens são poucos, já que assumiram participação ativa no conflito.

O campo foi construído no ano passado e custou à Turquia US $ 35 milhões, absorvendo vários outros milhões para sua manutenção mensal, como pagamento dos salários de policiais, contas dos serviços públicos e subsídios aos refugiados.

Como a Turquia tem oito campos de refugiados como esse, abrigando assim mais de 40 mil refugiados, não é difícil imaginar quão pesado é o fardo carregado atualmente pelo país.

Retrato social

 

Curiosamente, os habitantes desses campos não têm condição de refugiado e são chamados pela diplomacia turca de “pessoas temporariamente sob proteção”.

Entende-se que, em um futuro próximo, os sírios abrigados no território turco poderão voltar a seu país. Todavia, seu retorno só será possível quando o regime de Assad for derrubado.

Quase todos os habitantes dos campos de refugiados têm familiares entre os rebeldes e não escondem isso.

Abdoul Karim, engenheiro eletricista, diz que foi  empresário bem sucedido e não teve grandes problemas com o regime de Assad, permitindo-se, por vezes, criticá-lo.

No segundo trimestre deste ano, ele, sua esposa e filhos pequenos deixaram Aleppo, enquanto seus dois filhos mais velhos ficaram na cidade para “lutar pela liberdade”.

E liberdade é uma questão delicada para muitos que vivem como refugiados. “Inicialmente, eu e muitos outros nos manifestávamos pacificamente nas ruas”, explica o jovem de 25 anos chamado Fahed, ex-pintor em Latakia e agora combatente do “exército sírio livre”.

“Nem pensávamos em pegar em armas esperando que a mudança democrática pudesse ser feita por meios pacíficos. Mas a polícia começou a dispersar violentamente nossas manifestações pacíficas e nos ameaçar de prisão e até de morte. Eles não nos deixaram nenhuma escolha: tínhamos de começar a lutar ou morrer”, completa Fahed.

Realidade pós-guerra

Na praça, no meio do campo, fomos rodeados por habitantes locais que começaram a nos bombardear com perguntas. Sem saber de que país éramos, eles gritavam que o Ocidente e, em particular, os EUA abandonaram seu país a sua sorte e pararam de ajudá-los em armas e dinheiro.

Perguntamos a nosso guia se existiam entre os rebeldes sírios efetivos da rede terrorista Al-Qaeda como fazia crer a propaganda oficial do regime de Assad. “Sim, existem”, respondeu ele sem hesitar. “Porque eles são muçulmanos e não podem observar tranquilamente como seus irmãos estão morrendo. Conheço também pessoas do Paquistão e do Afeganistão que estão lutando no nosso lado”, completou.

Segundo ele, se o atual regime realmente cair, a população deve esperar tempos difíceis. “No primeiro momento, teremos muitas dificuldades, mas aos poucos saberemos construir uma sociedade mais justa”, disse.

Na manhã seguinte, fomos de novo ao campo de refugiados sírios em Kilis. O local parecia desabitado: durante o mês sagrado do ramadã, os muçulmanos preferem não sair de suas casas. O silêncio era, contudo, enganoso. A apenas 300 metros do local, a guerra na Síria continuava provocando vítimas.

Originalmente publicado em  www.rg.ru

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