Até que a intervenção nos separe

Ilustração: Niyaz Karim

Ilustração: Niyaz Karim

Repercussão internacional em massacre de Hula pressiona governo russo a sair de cima do muro. Quantas pessoas mais devem morrer para que alguma resolução efetiva seja tomada?

Após as denúncias sobre mortes de mais de cem civis, incluindo crianças, em Hula, os principais países ocidentais expulsaram os diplomatas sírios. O ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan faz, provavelmente, a penúltima tentativa de convencer Bashar Assad a aceitar o plano de paz. Algumas dúvidas, contudo, permanecem em torno da questão principal. Quantos mortos é preciso para a comunidade internacional começar a exercer pressão sobre Bashar Assad?

Aparentemente 10 mil mortos ainda é pouco. E esse número é a estimativa mínima.  O clima de agitação tomou conta de políticos, diplomatas e jornalistas quando a Rússia e a China aderiram à declaração do Conselho da Segurança da ONU que condenava o massacre em Hula. “Moscou se afasta do apoio incondicional do regime de Assad!”, expunham as manchetes nos jornais. 

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Muitos prestaram atenção às declarações de Lavrov de que o destino de Assad não era tão importante como o fim de violência. Na verdade isso não muda nada. 

Mesmo sem provas, as autoridades russas continuam insistindo que  poucas pessoas apenas morreram em Hula pelas mãos de integrantes das forças governamentais e os outros teriam sido assassinados por “terroristas”. Reformulo, então, minha pergunta: Qual é o número aceitável de civis mortos após o bombardeio pela artilharia? 

O governo russo repete as ideias propostas pelo regime de Assad e mitiga as provas dos habitantes de Hula sobre serem vítimas da ‘shabiha’, paramilitares de Assad responsáveis pela intimidação das forças de oposição síria. 
São divulgadas notícias sobre “terroristas estrangeiros” que lutam contra Damasco de igual para igual. “Fanáticos querem tomar poder na Síria!”, dizem. 

Ao mesmo tempo, nunca falam sobre sua recusa de reconhecer como terroristas os verdadeiros terroristas do movimento palestino Hamas ou Hezbollah no Líbano.

Não é surpresa alguma que o Exército Livre da Síria é composto por pessoas muito diferentes, incluindo islamistas. Também é claro que eles têm tanques, armas de todos os tipos e forças aéreas. 

A concepção de que as forças são desiguais e de que o governo carrega maior responsabilidade é uma conclusão baseada no senso comum. Não há duvidas de que Assad já teve muitas oportunidades para cessar o massacre e começar o processo de paz, mas está cada vez mais clara sua falta de disposição para tal. Está chegando a hora da verdade.

O Kremlin tem que decidir se a Rússia está pronta para ficar com seu último cliente no Oriente Médio até o fim. E, dessa vez, não para os contratos militares ou para a base naval em Tartus, mas para impor a compreensão de que soberania é um tipo de licença perpétua para tirania política. 

O Ocidente deverá também respondera pergunta do mundo árabe  sobre qual a diferença entre os caráteres autoritários do regime de Muammar Gadaffi e o de Bashar Assad. Afinal, ainda não se sabe por que a Líbia mereceu uma intervenção estrangeira, e a Síria, não.


Konstantin von Eggert é comentarista da rádio Kommersant FM.

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