Foto: TASS
O bilionário russo Mikhail Prôkhorov pode ter fracassado na corrida presencial do início deste ano, mas, pelo menos, ajudou a construir um novo perfil político: o de sua irmã.
Irina Prokhorova administra uma instituição de caridade que fundou com Mikhail, bem como a editora Nôvoie Literaturnoie Obozrenie (do russo, "Nova Resenha Literária").
Durante a campanha dele para presidente, porém, ganhou destaque também como uma poderosa e convincente defensora dos ideais liberais. A eloquência e a paixão transmitida por Prokhorova levaram alguns observadores políticos a sugerir que ela mesma se candidatasse ao cargo.
Ativistas da oposição como Boris Nemtsov admiraram seu desempenho como substituta do irmão em alguns debates. Em um deles, Irina ficou famosa ao emudecer o diretor de cinema Nikita Mikhalkov, um defensor de longa data do presidente Vladímir Pútin.
Alguns analistas arriscaram dizer que os eleitores preferiam ela ao irmão, uma vez que ele é mais conhecido fora da Rússia como o playboy do mundo ocidental dono do New Jersey Nets, time de basquete da NBA.
Mas Prokhorova ressalta se ver como uma figura cultural no futuro, e jamais política. Além disso, afirma ser contra o atual presidente Vladímir Pútin, e acredita que seus anos no poder empurraram a “cultura russa à beira de uma crise”.
No futuro, ela diz que gostaria de medir a grandeza da Rússia não pelo tamanho de seu orçamento militar, mas por seu crescimento cultural.
Casa na Arbat
Irina Prokhorova e seu irmão Mikhail cresceram num lar de intelectuais. Os olhos de Irina brilham quando fala sobre a atmosfera de “alegria e liberdade” que permeava a casa de seus pais.
Ela se lembra das festas dançantes no gracioso apartamento na Arbat, uma das mais famosas, e na época poética, ruas de Moscou – atualmente lotada de vendedores e turistas.
“Minha família me ensinou a respeitar a esfera individual, por isso nunca encontrarei paz em nossa sociedade, que não conserva esse tipo de respeito”, diz. “O medo das repressões de Stálin assombrou nossos pais até o fim de suas vidas. Esse tipo de trauma não foi superado pela geração seguinte: ainda somos assombrados pelos fantasmas daquela época.”
Enquanto Mikhail, 47, possui uma fortuna estimada em mais de 13 bilhões de dólares e já escandalizou a Rússia com festas grandiosas, sua irmã mais velha Irina, 56, é uma mulher de família vestida de maneira conservadora.
Ela diz ter dado o melhor de si para educar a filha modestamente, como uma garota comum, e não parte da nova geração de crianças mimadas da Rússia. A biblioteca da família, repleta de volumes lidos e relidos de Jack London, Ivan Turguenev, Guy de Maupassant e Anton Tchekhov, está entre os maiores tesouros de Prokhorova.
“Meus pais ficaram em filas enormes por longas horas para conseguir algumas dessas obras”, conta.
Isolamento
Prokhorova se formou na Universidade Estatal de Moscou e sua tese final sobre as fantasias de J. R. Tolkien levantou suspeitas no final da era soviética.
“Havia um clima de escândalo no ar, mas superei meu medo e expressei como Tolkien era um escritor realista que, de forma alegórica, lutava pelo triunfo da justiça social”, relembra.
Depois de se formar, Prokhorova continuou tentando abrir mentes sobre a crítica literária na academia soviética. “A maioria dos temas que propus acabaram sendo inevitavelmente vetados”, conta.
No entanto, a perestroika trouxe novos ares. Prokhorova e alguns de seus colegas de faculdade se tornaram críticos renomados e entraram para a história como a última geração soviética.
“Creio que o profundo trauma do isolamento cultural inspirou minha decisão de ter uma editora”, diz.
Nos centros e nos grotões
Após o empenho na oposição política, Irina voltou a seu trabalho cultural. A fundação dos Prôkhorovs agora está formando jovens diretores de teatro e cinema, escritores e designers nas províncias.
Para o satirista russo Víktor Chenderovitch, os Prôkhorovs sabem os limites do ativismo político e cultural na Rússia, e não ultrapassam essas barreiras.
“Verdade seja dita, Mikhail iria imediatamente acabar na prisão se tivesse extrapolado os limites e passaria anos atrás das grades junto com outros críticos do regime de Pútin, como Mikhail Khodorkóvski,” disse Chenderovitch.
Prokhorova acredita no impacto de seu trabalho. A Nova Resenha Literária, fundada em 1992, a editora se tornou um laboratório destinado a pesquisar tendências intelectuais. Assim, deu origem a diversos títulos, novos jornais e conferências literárias anuais. “Nossa grande meta é tentar criar uma história ‘alternativa’”, conclui.
Anna Nemtsova é correspondente em Moscou da Newsweek e do The Daily Beast.
Todos os direitos reservados por Rossiyskaya Gazeta.
Assine
a nossa newsletter!
Receba em seu e-mail as principais notícias da Rússia na newsletter: