Ilustração: Aleksêi Iorch
Ainda em novembro de 2011, Medvedev participou de três eventos no Extremo Oriente. Presidiu em Khabarovsk uma sessão do Conselho de Estado que discutiu o aumento do papel das regiões na modernização da economia, encontrou-se com a imprensa do Extremo Oriente, também em Khabarovsk, e visitou o comitê público formado por partidários e membros regionais do Rússia Unida, em Iakútia.
As três reuniões foram praticamente idênticas, e fechadas pelo encontro do Rússia Unida. A coletiva a jornalistas foi anunciada como a primeira de uma série a ser realizada ao longo do mês. A principal ideia passada por Medvedev é que a Rússia já avançou muito em seu esforço rumo à modernização e poderia conquistar mais ainda por meio de um desenvolvimento econômico inovador, reduzindo a dependência do país por matérias-primas e melhorando suas instituições políticas.
Em todas essas reuniões, Medvedev não se comportou como presidente nem como primeiro-ministro.
Enquanto o premiê Vladímir Pútin atribuiu recursos financeiros do governo e fez promessas concretas quando presidiu minicongressos do Rússia Unida, o papel de Medvedev tem sido pintar um quadro positivo da atual conjuntura e agir como “o motor moral do desenvolvimento”, como ele mesmo diz.
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As regalias que Medvedev proporciona custam pouco e são, em sua maioria, de natureza simbólica – como, por exemplo, dar anualmente aos aposentados e estudantes do Extremo Oriente viagens grátis à porção europeia da Rússia, algo que Pútin havia prometido vários anos atrás – sem entregar.
As palavras de Medvedev aos governadores, que atuam como lobistas regionais durante a campanha eleitoral, são um slogan apropriado para a debate sobre modernização. O presidente disse: “A Rússia é um país onde é impossível sobreviver sem grandes projetos que ajam como um motor para o desenvolvimento”.
Embora seja discutível se são realmente “motores do desenvolvimento”, é inegável que projetos tais como o Nord Stream (o gasoduto do mar Báltico), os Jogos Olímpicos de Sôtchi 2014 e os planos para a chamada “Grande Moscou” (que vão transferir os prédios administrativos do governo para fora do centro da capital) fornecem um mecanismo pelo qual Pútin pode canalizar as receitas de gás e petróleo do país às contas bancárias de seus amigos oligarcas.
Do mesmo modo, o plano para desenvolver o turismo no Cáucaso do Norte é uma maneira eficaz para o governo de Moscou comprar a lealdade das elites políticas locais e seus amigos.
A prática tornou-se marca registrada do mandato Pútin-Medvedev. Os benefícios foram distribuídos de modo a satisfazer o apetite cada vez maior da elite empresarial fiel a Pútin, tais como o empresário do setor energético Guennádi Timtchenko, Arkádi e Boris Rotenberg, e o diretor do Banco Rossia, Iúri Kovaltchuk. Esses indivíduos, conhecidos como “oligarcas negros”, cuja prosperidade depende de suas estreitas alianças com o Kremlin, têm ganhado força considerável desde 2008.
Enquanto isso, o mesmo período foi marcado por contratempos para os “oligarcas brancos” da velha guarda, proprietários de grandes empresas reconhecidas internacionalmente.
Eles receberam uma importante injeção de fundos do Estado durante a crise econômica, mas pagaram por isso com a sensível perda de controle sobre seus ativos.
Durante a reunião de Medvedev com os governadores da região oriental da Rússia –encontro que era basicamente uma reunião do Conselho Federal –, vários outros grandes e extremamente onerosos projetos foram mencionados: uma ferrovia de alta velocidade de Moscou a Iekaterinburgo, uma terceira linha na ferrovia Transiberiana, uma ponte para a ilha Sakhalin, entre outros.
Nenhum oligarca tem interesses instituídos em muitos desses projetos clientelistas, aparentemente transformando-os em “programas do povo” a serem explorados pela elite política regional. E, como todos sabem, esses projetos não são concebidos para serem implantados, mas para criar a impressão de que as propostas de todos vêm sendo ouvidas e levadas a sério.
O que é impressionante é a forma como esses projetos, no valor de bilhões de dólares, se materializam repentinamente pouco antes das eleições para satisfazer o crescente apetite da elite política e econômica.
Aplicar dinheiro de forma imprudente em projetos de alto valor como esses também acaba reduzindo o conflito entre os clãs políticos, que seriam resultado da disputa por recursos limitados – sobretudo porque o dinheiro é prometido em nível regional, e não federal.
O importante é que Medvedev, seja na qualidade de vice-primeiro-ministro, quando dirigiu projetos nacionais de 2006 a 2008, ou como presidente, passou anos como uma espécie de diretor de relações públicas trabalhando dentro da limitada autoridade que lhe é concedida.
E nada mudou agora que ele é o principal candidato a primeiro-ministro.
Seu papel continua o mesmo no sistema político dominado por um único indivíduo: seu cargo pode mudar, mas, na essência, ele permanecerá um mero animador de torcida para os projetos executados pela “Rússia Ltda.”, liderada por Pútin.
Nikolai Petrov é acadêmico do Centro Carnegie de Moscou.
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