Vladímir Pútin e Silvio Berlusconi: afagos mútuos Foto: TASS
Enquanto o novo primeiro-ministro italiano, Mario Monti, realizava consultas para transformar o legado político de Berlusconi, o ex-premiê fez uma série de contatos telefônicos com alguns dos principais líderes mundiais, incluindo o presidente americano Barack Obama, a chanceler alemã, Angela Merkel, e os primeiros-ministros da Grã-Bretanha, Cameron, e da Rússia, Vladímir Pútin. Por fim, conversou com o presidente russo Dmítri Medvedev, que também enviou-lhe uma carta para agradecer sua importância no fortalecimento das relações bilaterais, descrevendo-o como “um dos políticos mais experientes e influentes do mundo”.
No dia anterior ao pedido de renúncia, Pútin já havia se pronunciado sobre o amigo pessoal de longa data durante um evento na Rússia. Apesar dos escândalos protagonizados por Berlusconi, o premiê russo se referiu a ele como “um dos melhores políticos da Europa e um dos últimos moicanos da política”.
“Medvedev e Pútin são gratos a Berlusconi porque ele, entre outros líderes europeus, auxiliou no processo de reconhecimento da Federação Russa pela Otan antes mesmo de qualquer decisão formal”, disse à Gazeta Russa Rosario Alessandrello, presidente da Câmara de Comércio Ítalo-Russa e da Fundação Itália- Rússia. Segundo ele, o bom relacionamento entre os dois países durante o governo Berlusconi contribuiu para a estabilização das relações da Federação Russa com a União Europeia e com os EUA.
Na crise desencadeada com a ocupação da Ossétia do Sul pela Geórgia, em 2008, a intervenção da Itália, sob Berlusconi, ajudou a evitar um possível confronto com os EUA e Europa. “O Estado italiano avalizou a promessa assumida pela Rússia de retirar suas tropas das regiões separatistas”, disse Alessandrello, “sem falar na crise de gás natural gerada pela disputa comercial entre Rússia e Ucrânia em 2009, quando o governo italiano se comprometeu a dar continuidade ao fornecimento de gás ao Ocidente”. A proposta da gigante italiana do setor de energia Eni para criação de um consórcio com participação russa que financiasse e garantisse a provisão de gás à Europa só não foi adiante porque o fornecimento de gás à Ucrânia acabou sendo reestabelecido.
Embora sejam parceiros antigos, a cooperação entre a Itália e a Rússia vinha sendo intensificada por numerosas reuniões com seus líderes e acordos estabelecidos entre empresas de ambos os países. A italiana Eni e a companhia de energia russa Gazprom, por exemplo, assinaram, em setembro, um contrato que prevê “a cessão de 50% da participação da Eni (33,3%) a Gazprom no consórcio que explora a jazida petrolífera libanesa Elephant”, conforme comunicado oficial da Eni. O acordo, estipulado em fevereiro, havia sido temporariamente suspenso por causa da revolta contra o ex-ditador do Líbano, Muammar Gaddafi.
Os relatórios do Ministério de Relações Exteriores italiano também indicam que, paralelamente à sólida parceria no setor energético, nos últimos dois anos foram assinados acordos nas áreas da justiça, agricultura, educação, turismo e até no setor espacial.
“Tais iniciativas se estendem ainda ao campo da cultura”, completou Annalisa Seoni, secretária-geral da Associação Itália-Rússia. O memorando de entendimento de 2009 que definiu 2011 como Ano da Rússia na Itália, bem como Ano da Itália na Rússia, vem estimulando o desenvolvimento de eventos culturais significativos nas principais cidades italianas e russas – como as recentes apresentações da orquestra do teatro milanês La Scala na reinauguração do Teatro Bolshoi, em Moscou.
Entretanto, os cidadãos italianos não parecem tão satisfeitos com as condutas de Berlusconi. “Uma das figuras políticas mais experientes do mundo?”, brincou Giuseppe Rolando, 38, funcionário de um banco em Turim, norte da Itália. “Diria que é mais um grande empresário usando a carreira política para aumentar sua riqueza pessoal.” Em setembro, o tradicional jornal La Repubblica divulgou uma pesquisa realizada pelo Ipr Marketing sobre o nível de confiança da população no então primeiro-ministro na qual apenas 24% dos entrevistados afirmavam apoiar Berlusconi – 5% a menos do que o índice registrado em junho deste ano e 22% inferior a março de 2010.
Atualmente o país amarga uma dívida de 120% do valor do PIB. “Ele é responsável pelo empobrecimento do país, devido à falta de um plano de desenvolvimento adequado que incluísse proteção ao emprego, educação pública e política social”, disse Rolando. De acordo com outra pesquisa, realizada pelo instituto Piepoli e publicada no jornal La Stampa no dia seguinte à renúncia, 68% dos entrevistados concordavam com o pedido de demissão.
Ainda assim, Berlusconi sugeriu que não tem planos de largar completamente a política. Em entrevista à imprensa italiana no último dia 18, seis dias após o anúncio oficial, o ex-primeiro-ministro
declarou que durante os próximos meses vai trabalhar no Parlamento e em seu partido, Povo da Liberdade (PDL), para preparar a campanha eleitoral de 2013. Ao que tudo indica, diferentemente do filme estrelado por Daniel Day-Lewis e baseado no romance homônimo de James
Fenimore, esse “último moicano” ainda promete uma longa sequência.
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