Principal obra de Lev Tolstói se soma a outras obras traduzidas diretamente nos anos 2000 Foto: ULLSEIN BILD / Vostock-photo
Quando Rubens Figueiredo traduziu Anna Kariênina, obra do conde russo Lev Tolstói (1828-1910, também grafado como “Liev” no Brasil) publicada no final de 2005 no Brasil, trilhou um caminho sem volta. “Depois de fazer Anna Kariênina e Ressurreição, o Guerra e Paz se tornou quase uma obrigação”, diz.
Publicado pela primeira vez em 1868 na Rússia (veja principais edições abaixo), o romance épico Guerra e Paz conta a história da invasão napoleônica da Rússia tsarista sob o ponto de vista de cinco famílias aristocráticas do país. A obra teve 36 milhões de exemplares vendidos somente na União Soviética, segundo dados da revista russa Kompiuart de março de 2000.
Escolha da especialista
Edições mais notáveis de Guerra e Paz na Rússia
Galina Aleksêieva, diretora do departamento de pesquisa e do Museu Tolstói de Iásnaia Poliana , indica as três principais edições da obra mais famosa do escritor russo
“Amais interessante é esta primeira edição, que saiu entre 1868 e 1869 pela editora Ris, em Moscou. Inicialmente, o romance saiu na revista “Rúski Vestnik”, e a primeira publicação em livro foi esta, que já é uma raridade, e não se encontra em qualquer biblioteca russa. Depois, surgiram centenas de edições pelo mundo.”
“A edição de 1983 que saiu pela série Monumentos Literários da editora Akademia Nauka é digna de nota por utilizar a primeira redação da obra, que teve algumas variantes (que somam 5 mil páginas de manuscritos armazenadas hoje em Moscou). A preparação é da famosa crítica Evelina Zaibentshur, já falecida.”
“A edição de luxo de 2008, lançada em razão dos 180 anos de Tolstói, saiu pela editora Béli Gorod, na série Monumentos da Literatura Mundial. É ilustrada belissimamente com retratos dos heróis da guerra de 1812, com desenhos maravilhosos feitos ainda durante a vida de Tolstói para a obra e de artistas contemporâneos.”
Apesar das diversas edições em português no Brasil - desde 1958 pela editora Globo, até 1974 pelo Círculo do Livro, e em 2007 pela L&PM -, uma das principais características da publicação de Guerra e Paz pela Cosac Naify neste mês é que a obra ganhou sua primeira tradução direta do russo no país. Até poucos anos atrás, as obras russas eram trazidas para o Brasil já de traduções para outras línguas, como o francês, e ficavam mais sujeitas a mudanças de sentido e de construção.
“O lançamento é um acontecimento muito importante para a literatura mundial, já que este romance ocupa o primeiro lugar na literatura universal”, afirma a russa rElena Vássina, professora de letras russas na Universidade de São Paulo.
Tradutor “oficial”
Escritor premiado, inclusive com o Portugal Telecom de Literatura 2011 por seu Passageiro do Fim do Dia, Figueiredo tornou-se também uma marca como tradutor de Lev Tolstói no Brasil. “Ele é uma figura muito importante, conhecido e premiado como escritor, e tem uma imagem literária muito peculiar. É uma sorte da literatura russa tê-lo como tradutor”, afirma Vássina.
Uma das grandes preocupações de Figueiredo é a de manter o estilo do autor, inclusive com recursos desprezados por alguns editores, como a repetição de palavras, que muitas vezes geram trechos totalmente reescritos em suas versões traduzidas.
“A principal dificuldade decorreu do esforço de preservar ao máximo os traços de linguagem relevantes para o significado geral da obra e para as preocupações do escritor”, diz Figueiredo.
Por ser uma obra densa, cheia de personagens históricos, a editora também preparou materiais extras anexados ao título. São cinco mapas, uma lista de personagens históricos, militares e outras figuras reais que permeiam o romance, além de uma apresentação do próprio Figueiredo e sugestões de leitura para o leitor que se interessar em saber mais sobre Tolstói e Guerra e Paz.
“A gente fez uma revisão especial e trabalhou com quatro pessoas no texto. Contratamos um editor-assistente só para este livro, para acompanhar tudo, e que elaborou, por exemplo, essas listas e mapas”, conta o diretor editorial da Cosac, Cassiano Elek Machado.
A primeira fornada sairá em uma edição especial de 7 mil exemplares – um número considerado alto para o Brasil, onde lançamentos geralmente têm tiragem inicial de 3 mil. A obra virá em dois tomos numa caixa e, apesar das mais de 2 mil páginas, seu tamanho regular será garantido pelo uso de papel-bíblia, mais fino e leve.
“É um livro que começou a ser criado há mais de quatro anos. Só a tradução durou três anos, e depois teve de seis a sete meses de edição. Então, ao longo desse processo a gente foi recriando o projeto até chegar em um formato menor, com papel mais fino, para a leitura ficar mais confortável”, explica Machado.
Um século tolstoiano
Guerra e Paz é o sexto livro de Tolstói pela editora, e uma realização importante numa longa lista de publicações diretas do russo ao longo de 2011. Do conde, só neste ano, ainda pode-se conferir os lançamentos A Nova Antologia do Conto Russo, da editora 34, Os Últimos Dias de Tolstói (coletânea de cartas, ensaios etc.), da Cia das Letras, Contos de Sebastópol, da editora Hedra, e Contos Para o Povo, a ser lançado até o final de 2011 pela editora Ateliê.
Guerra e Paz no Brasil
Em edição especial com tiragem de 7 mil exemplares, primeira tradução direta do romance épico de Tolstói sai no Brasil pela editora Cosac Naify. A obra vem em dois tomos em uma caixa e tem tamanho reduzido devido ao uso de papel-bíblia, mais fino, para tornar a leitura de suas mais de 2536 páginas mais confortável. Custa R$ 198.
Além disso, o ano foi marcado pela visita ao Brasil, em setembro, de Vladímir Tolstói, tataraneto do escritor e diretor do Museu Tolstói de Iásnaia Poliana, a propriedade rural do conde. “No seminário dedicado a Tolstói com a participação de Vladímir, ele disse que, se o século 20 foi de Dostoiévski, com muitas leituras e traduções do autor, o século 21 é de Tolstói”, conta Vássina.
Enquanto isso, Fiódor Dostoiévski, o escritor russo contemporâneo de Tolstói, continua a ser um dos sucessos do catálogo da editora 34, que produziu boa parte das traduções de sua obra. Com o avanço da Cosac sobre os títulos de Tolstói, criou-se uma espécie de contrato subliminar entre as editoras.
“Cada editora pegou um autor para trabalhar: a gente sempre com Tolstói, e eles com Dostoiévski. Não é um acordo por escrito, mas é quase um acordo informal de que a gente evitaria entrar no terreno do Dostoiévski e eles no do Tolstói”, conta Machado, que tem apenas um título do escritor peterburguense em seu catálogo: Uma Criatura Dócil.
Mais que de um escritor ou de outro, o século 21 tem se mostrado o da literatura russa no Brasil. “Mesmo sendo um tipo de tradução que não é o mais comum de se fazer, porque tem muito mais gente traduzindo do inglês, do francês, do italiano etc., a resposta do público à literatura russa é muito boa”, afirma Machado.
Todos os direitos reservados por Rossiyskaya Gazeta.
Assine
a nossa newsletter!
Receba em seu e-mail as principais notícias da Rússia na newsletter: