Turismo nos rincões da Rússia

Apesar da pouca infraestrutura, locações russas atraem visitantes Foto: ALAMY/LEGION MEDIA

Apesar da pouca infraestrutura, locações russas atraem visitantes Foto: ALAMY/LEGION MEDIA

Maria Guerassimova acaba de voltar a seu apartamento em Moscou depois de uma viagem de duas semanas ao lago Baikal, na Rússia Central. A empresa de consultoria onde trabalha envia todos seus funcionários para um passeio pela taiga com o intuito de melhorar o espírito de equipe. De volta à capital, Guerassimova já sonha com a próxima viagem: “Na próxima vez, irei à península Kamtchatka”.

Apesar da pouca infraestrutura, locações russas atraem visitantes 

No imaginário russo, viajar ao campo, atividade muito popular na União Soviética dos anos 1980, significa carregar nas costas uma mochila de 50 quilos, montar a barraca de acampamento sobre um formigueiro e cantar acompanhado de violão perto de uma fogueira.

Estado vai injetar R$ 83,9 milhões em 12 áreas prioritárias do ecoturismo nacional

“A taiga não é uma savana onde se pode ver um elefante a cada quilômetro. Além disso, o bisão é um animal que não se deixa fotografar. Aqui você anda uns 700 quilômetros e só vê mosquitos”, reclama uma colega de Guerassimova a quem a viagem não causou tanto entusiasmo.

Há tempos o ecoturismo é um meio de diversão comum em muitos países, e cidadãos urbanos do mundo todo se embrenham na natureza em busca do ar puro das montanhas e da tranquilidade dos bosques. A prática, apesar de crescente, ainda é nova para os russos.

A Organização Mundial do Turismo estima que o faturamento anual do setor supere o equivalente a

R$ 2,3 bilhões. Desses, entre 10% e 20% correspondem ao ecoturismo, que atrai cada vez mais gente.

As paisagens russas, apesar do grande potencial para o desenvolvimento desse tipo de turismo, têm um nível de preservação longe do ideal.

No país, o turismo verde não só é viável, mas também se tornou um mercado imprescindível para muitas regiões. O problema latente agora está em satisfazer os interesses do homem e preservar a natureza.

Além de não oferecerem o impressionante espetáculo de animais selvagens soltos na natureza para observação, como na África, a enorme extensão da Rússia, por vezes, afasta turistas potenciais.

Existem algumas exceções, como Primórski, a ilha Sakhalin e as ilhas Kurilas, regiões muito próximas ao Japão e à Coreia do Sul, além da Carélia, que faz fronteira com a Finlândia, e o istmo da Curlândia, situado quase no centro da Europa.

De um modo geral, contudo, deve-se somar ao preço das excursões o custo dos voos de longa distância. Fora isso, nas reservas que têm potencial turístico há pouquíssimos aeroportos internacionais. O principal meio de transporte para o ecoturista alcançar a península Kamtchatka ou na região oriental russa da Iakútia é o helicóptero.

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Infraestrutura

Acesso a áreas potenciais é dificultado pela falta de aeroportos, estradas e motoristas

Para prestar um serviço de qualidade aos turistas, ainda é preciso desenvolver uma infraestrutura adequada que responda às necessidades de transporte, comunicação, hospedagem e assistência médica. Uma rota ecológica moderna deve permitir aos turistas desfrutar de uma estadia confortável, sem que isso cause danos ao meio ambiente.

Na Rússia em geral, entretanto, a natureza só tem sido preservada em áreas onde não há população permanente ou complexos habitacionais modernos com água quente e esgoto. A falta de motoristas qualificados é outro problema, pois a quantidade de autoescolas dedicadas à formação de especialistas no setor é insuficiente.

Hoje, a Academia de Turismo da Rússia e a Universidade Internacional Independente de Ecologia e Ciências Políticas são os únicos centros que oferecem formação acadêmica específica relacionada ao setor.

Voluntarismo

Guerassimova e seus colegas de trabalho viajaram até a reserva natural de Tankhôi, na região oriental da Buriátia. O local integrará a Grande Trilha do Baikal, com uma série de rotas ao redor do lago ligando reservas especialmente protegidas da região. Por iniciativa própria, voluntários e funcionários da reserva natural do Baikal construíram trilhas especiais para cadeirantes.

Nos últimos anos, a exploração descontrolada do local provocou uma deterioração alarmante do ecossistema do lago. Além disso, o financiamento público dos projetos de revitalização está em fase muito preliminar.

Em uma reunião recente, o primeiro-ministro, Vladímir Pútin, e o ministro dos Recursos Naturais e do Meio Ambiente, Iúri Trutnev, decidiram canalizar investimentos em programas que visem a melhorar as áreas de algumas reservas naturais durante o período de 2013 a 2020. Foram selecionadas 12 áreas prioritárias: dez reservas naturais e dois parques nacionais. A previsão é que, até o ano de 2013, o número de visitas praticamente dobre, passando de 6,5 para 12 milhões.

A iniciativa, porém, não agradou ambientalistas. “Quando discutiram esse tipo do turismo tão na moda, o primeiro-ministro e o ministro do Meio Ambiente se esqueceram dos problemas reais das áreas protegidas, como os baixos salários dos funcionários, a degradação do meio ambiente, a falta de recursos materiais e as constantes tentativas de reduzir o território dessas áreas”, diz Mikhail Kreindlin, diretor de um projeto do Greenpeace na Rússia para as áreas naturais especialmente protegidas.  

Enquanto ecologistas batem de frente com o governo, os ecoturistas russos trabalham voluntariamente na construção de vias para deficientes, na limpeza dos rios e na proteção de espécies ameaçadas de extinção.

Em agosto, um grupo de voluntários limpou algumas baías do mar de Barents. “Creio que só existam duas maneiras de impedir que o homem continue prejudicando o meio ambiente”, diz um dos participantes da operação, Dmítri Dementiev. “A primeira é proibir aos cidadãos o acesso a toda essa beleza natural, aplicando um sistema quase militar que restrinja a liberdade de circulação pelo país. A segunda, e mais desejável, é que cada um de nós, de maneira individual e coletiva, se conscientize da importância de respeitar a natureza.”


 

Na URSS, o campo era o caminho

Em nenhum outro país do mundo o turismo de ação e esportes - equivalente ao turismo de aventura dos países ocidentais - desenvolveu-se tanto como na União Soviética. Em 1989, cerca de 20 milhões de pessoas, entre estudantes, jovens trabalhadores e outros setores da população de renda relativamente baixa, usavam seu tempo livre em excursões ao campo ou às montanhas.

A partir de 1990, a demanda por viagens desse tipo dentro do país diminuiu consideravelmente já que, depois de décadas sem poder viajar ao exterior, os russos preferiam visitar outros países nas férias.

Outra razão para a queda do turismo interno foi a interrupção do financiamento público na década de 1990.

Nos últimos anos, o governo tem se esforçado para recuperar o tempo perdido, e em 2010 o assunto foi debatido em uma viagem do primeiro-ministro Vladímir Pútin à península Kamtchatka.

No final de agosto deste ano, Pútin e o ministro dos Recursos Naturais e do Meio Ambiente, Iúri Trutnev, reuniram-se para debater o assunto. No encontro, os líderes assinaram um acordo de investimento de 1,5 bilhões de rublos (R$ 83,9 milhões) para melhoria de 12 áreas protegidas.

Pútin e Trutnev também examinaram outros programas voltados à promoção desse novo mercado turístico, aos quais serão destinados até 2020 cerca de 800 milhões de rublos anuais (R$ 44,7 milhões).

 

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