Carne brasileira sofre embargo

Paraíba, Mato Grosso do Sul e Pernambuco são Estados brasileiros que sofreram restrições por parte do governo russo/Foto:AP/Fotolink

Paraíba, Mato Grosso do Sul e Pernambuco são Estados brasileiros que sofreram restrições por parte do governo russo/Foto:AP/Fotolink

Prazo dado pela Rússia para que frigoríficos brasileiros se regularizassem venceu em maio. A medida, entretanto, pode ser política, visando a um estímulo para a produção interna de carne.

A reunião da Comissão Brasileiro-Russa de Alto Nível de Cooperação não foi das mais tranquilas. Realizada em Moscou no dia 17 de maio, a discussão girou fundamentalmente em torno do endurecimento do Kremlin sobre as importações de carne brasileira.

Desde 15 de junho, as importações de produtos de origem animal de 85 frigoríficos, dos Estados do Mato Grosso, Paraná e Rio Grande do Sul foram suspensas por autoridadades russas.

De acordo com o secretário do Rosselkhoznadzor (Serviço Federal de Vigilância Veterinária e Fitossanitária da Rússia), Aleksêi Aleksêienko, os brasileiros deveriam ter resolvido, até o dia 20 de maio, irregularidades apontadas anteriormente pelo governo russo na produção e no manuseio da carne exportada para o país. De 2010 a 2011 foram descobertos 31 casos de importação irregular do Brasil para a Rússia envolvendo problemas de documentação e uso de substâncias proibidas no país.

Além disso, os fornecedores deveriam apresentar à vigilância sanitária local garantias de cumprimento das normas. Os documentos, porém, não chegaram ao país no prazo estipulado, de  acordo com o secretário.


Brasileiros acreditam em “fator político”

Para representantes dos produtores, exigências russas são forma de barrar produção brasileira e preparar a produção interna


Durante a reunião, os representantes brasileiros declararam não concordar com o sistema de cotas de importação de carne no país, principalmente por considerarem tais medidas contraditórias aos princípios da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em 2003, a Rússia introduziu um sistema de cotas para países de fora da Comunidade dos Estados Independentes que define diferentes limites aos países exportadores.

Para resolver o impasse, o chefe do Serviço Federal de Vigilância Sanitária e Veterinária da Rússia, Serguêi Dankvert, e o secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura do Brasil, Francisco Sérgio Ferreira Jardim, reuniram-se no final de maio e decidiram que o governo brasileiro conduzirá inspeções em todas as empresas brasileiras fornecedores de carne à Rússia.

“Isso permite que, caso haja um surto de alguma doença no Brasil, as restrições de importação sejam válidas apenas para os Estados e municípios que passam pelo problema, não para todo o país. Atualmente, essas medidas estão em vigor para a Paraíba, onde foi diagnosticada uma epidemia suína; para o município de Dourados, no Mato Grosso do Sul, vítima de um surto de pseudorraiva; e para Pernambuco, onde existe alta incidência de estomatite vesicular”, explica Aleksêienko.

Desde o início de 2010, os inspetores da vigilância sanitária encontraram 31 violações durante as inspeções das cargas enviadas pelo Brasil para a Rússia. Entre as irregularidades estão a falta de autorização russa para importação e o envio de produtos omitidos da lista de envio.

“Hoje, há restrições para a distribuição de itens pecuários de 27 empresas brasileiras. Se compararmos com 2007, a diferença é grande: naquele ano, apenas sete violações foram detectadas”, afirma o secretário.

Como resultado, apesar do aumento do comércio entre os dois países, a distribuição de carne brasileira na Rússia sofreu uma queda nos últimos meses deste ano.

Nos quatro primeiros meses de 2011, a importação do produto caiu 17% em relação ao mesmo período de 2010 (168,3 mil toneladas contra 139,1 mil toneladas). No mesmo período, a participação brasileira nesse mercado, em volume, diminuiu de 30% para 23%.

Em abril, os serviços de vigilância sanitária dos dois países conduziram uma vistoria nas empresas brasileiras produtoras de carne interessadas na distribuição do produto na Rússia e em outros países de sua união aduaneira.

“Durante as inspeções, ficou claro que o Brasil estava flexibilizando a fiscalização. Identificou-se ainda uma piora substancial do sistema designado a garantir o cumprimento das regras”, afirma Aleksêienko.

A ocorrência de doenças no gado russo, entretanto, também não é rara. De acordo com Anna Evanguelêieva, chefe de análise do site especializado Meatinfo.ru, a situação é especialmente complicada com a carne suína, já que os recorrentes surtos de peste africana no sul da Rússia refletiram no total da população animal.

Em 2010, ocorreram no país 70 incidências da doença e nos quatro primeiros meses deste ano foram diagnosticadas 22. Além disso, agora as ocorrências se espalharam também para a região noroeste, com casos em Murmansk, Arkhanguelsk, São Petersburgo e Nijni-Nóvgorod. Mas, ainda que provoque baixas no rebanho, o vírus não é perigoso para humanos.

Produção interna

De acordo com a imprensa local, as medidas da vigilância sanitária russa visam, indiretamente, a um aumento na produção interna.

Além do embargo, no ano passado, o Kremlin alterou os procedimentos de inclusão de novas empresas brasileiras na lista de fornecedores de carne e derivados para o país.

Segundo o secretário do órgão, entretanto, a Rússia não tem condições de se estabelecer no setor, que foi abalado pela crise dos anos 90. “O interesse russo em manter as importações do Brasil continua, e só impomos uma condição, prevista por nossa legislação: a segurança do produto”, afirma Aleksêienko.

Segundo especialistas, entretanto, há uma motivação política por parte do Kremlin para proteger a produção doméstica.

“No ano passado, tivemos o conflito do frango ‘clorado’ americano. Naquele período, o volume de produto importado era enorme e as empresas nacionais do setor também avançaram bastante. Mas era preciso impulsioná-las ainda mais, aumentar os números – resultado que foi obtido após o embargo. Hoje, é exatamente este segmento que apresenta os melhores índices no mercado local”, relembra Evanguelêieva.

Dados do setor

De acordo com o site especializado Meatinfo.ru, a produção de frango na Rússia cresceu 11% em 2010 e sua importação caiu 31%. Segundo Evanguelêieva, chefe de análise do site, neste ano a produção interna suprirá totalmente a demanda do mercado doméstico.

Ao mesmo tempo, observa-se uma tendência de crescimento nas exportações. Enquanto o país exportou 4,4 mil toneladas do produto entre janeiro a abril de 2010, no período equivalente de 2011 o índice registrado foi de 6,5 mil toneladas.

Ainda de acordo com Evanguelêieva, o Brasil lidera as remessas de carne bovina e suína para a Rússia, compreendendo respectivamente 38% e 28% das importações. A venda do frango brasileiro representa 27% das entradas, cifra superada apenas pelos EUA.

A criação de suínos na Rússia também demonstra bons resultados: no ano passado, o crescimento foi de 7% e o volume de importações diminuiu 1%.

Nesse setor, porém, a dependência das importações ainda é sentida. No que se refere à produção de carne bovina, os indicadores caíram e o volume das importações subiu.

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