Khomus tem como análogo no Brasil o berimbau de índio
Nikolai DiakonovUma lenda khakassiana diz que cada povo indígena recebeu, certa vez, um dom dos espíritos – um instrumento musical, juntamente com a habilidade de tocá-lo e a missão de preservar sua forma tradicional pelos tempos.
Os altais têm o khomus, os iacutos tocam também outro tipo de harpa, chamada vargan, os khakassianos exploram os sons do tchatkhan.
Já o tchatkhan e o tchagandan, que são típicos dos tuvanos, são instrumentos de múltiplas cordas. As do tchatkhan são feitas de crina de cavalo, e sua a estrutura é fabricada com madeira.
Como a maioria dos instrumentos tradicionais, o tchagandan, o khomus, o khobirakh e o choor (um tipo de flauta) devem ser tocados em cabanas tradicionais, como yurt ou chum, para uma plateia de 20 pessoas ou menos. Isso porque a potência de seu som se perde em um espaço para apresentações contemporâneo.
Os artesãos também levam em conta as necessidades dos artistas e, para preservar o som original do instrumento, usam apenas materiais naturais. “Nas montanhas, encontra-se tudo que você precisa - madeira e animais. Preferimos crinas de cavalo, ou seus tendões e intestinos secos”, conta um dos especialistas, Piotr Topoiev.
Segundo ele, 90% dos instrumentos tradicionais são feitos à mão. Na época soviética, houve tentativas de montar produção em massa de khomuses, choors e tchagandans, mas os instrumentos finais nunca foram populares devido à qualidade de som ruim.
É por isso que quem deseja incluir um instrumento musical siberiano em sua coleção começa procurando por um artesão e, em seguida, espera pacientemente a sua vez, o que pode levar vários anos.
A escassez de instrumentos também pode gerar acontecimentos inusitados: quando em turnê, o grupo Ulger geralmente se dá por falta de alguns de seus instrumentos, que desaparecem sem deixar vestígios no mercado global de raridades.
(Vídeo: YouTube/ORPHOLOGIST)
Khaidji, o guardião das lendas
Uma das profissões tradicionais em Altai e no sul da Sibéria é a de khaidji, um contador de histórias que recita longos textos rítmicos ao som de instrumentos de cordas. Entre os contos, os gêneros mais comuns são lendas heroicas ou sobre espíritos, xamãs e deuses. A história quebrada em várias noites, como se fossem episódios de uma novela.
Buriates, tuvanos, altais, khakassianos, nganasans e iacutos acreditam que os contadores de histórias possam curar e prever o futuro: ao contar uma lenda, eles entram em um estado alterado de consciência e são assombrados por visões.
Tambor do xamã: o espelho do mundo
O tambor é mais do que um instrumento musical para os povos indígenas da Sibéria; é o principal objeto sagrado no arsenal do xamã, um item essencial para se entrar em transe. Os povos do Norte, como os tchuktchi, os nganasans e os esquimós, usam tambores tanto para entretenimento como para rituais religiosos. Já os nativos do sul siberiano, entre eles buriates, khakassianos, tuvanos e altais, acreditam que qualquer um que toque o tambor sagrado, salvo o próprio xamã, será amaldiçoado.
Os tambores são feitos com peles de animais esticadas e amarradas a uma moldura de madeira, que pode ser elíptica ou redonda, ou conter “nervuras” e cavidades ressonantes adicionais. O tamanho do instrumento também varia: há tambores tão grandes quanto uma pessoa, com dezenas de quilos, assim como menores, de 50 centímetros.
Tambores variam de tamanho, material e formato Foto: RIA Nôvosti/Aleksandr Kriajev
Decorados com sinos e pratos de metal, esses tambor têm uma aparência festiva. Nas mãos do dono, tornam-se um cometa brilhante com uma cauda de fitas multicoloridas. Os ornamentos também enriquecem o som do instrumento – a batida estrondosa do tambor é complementada por um tinido e farfalhar que imita os sons da natureza. A baqueta especial usada para tocar o tambor é também enfeitada com peles e moedas.
O tambor representa a estrutura do universo. A superfície externa do instrumento retrata os mundos superior, intermediário e inferior, e a alça lembra o Homem Vitruviano, de da Vinci. Os xamãs veem seu tambor como um corcel que os conduz pelo universo.
A grande família do khomus
Os instrumentos musicais siberianos têm muito em comum com outros de origens diversas. O khomus iacuto, por exemplo, tem parentes na Noruega (onde se toca o munnharpe), no Japão (mukkuri), no Irã (zanburak) e em Camboja (angkut).
Esse tipo de instrumento musical, com mais de 5.000 anos de história, também possui análogos na África e na América Latina – no caso do Brasil, o berimbau de índio.
Quando se trata do khomus iacuto, porém, apenas os experientes conseguem apreciar a maneira inusitada de tocá-lo: é preciso pressionar o khomus contra a boca com a mão esquerda, enquanto o braço direito permanece dobrado e a mão direita é erguida ao mesmo nível da cabeça, com o dedo indicador para baixo e posicionado em frente à saída do som.
Habilidade para tocar khomus é por si só uma arte Foto: Dmítri Ternovski
Enquanto tocam, os iacutos fazem sons para imitar o cavalgar dos cavalos, o uivo dos lobos, o grito dos falcões ou o assobio do vento:
(Vídeo: YouTube/✣ ᵀᵊᵑᴿᶤ • Spirit of the Steppe ✣)
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