Três previsões (nem tão?) utópicas de Sorókin

Sorókin, que completou 62 anos nesta segunda (7), participou da Flip em 2014.

Sorókin, que completou 62 anos nesta segunda (7), participou da Flip em 2014.

Serguêi Fadeitchev/TASS
Publicado no Brasil pela 34, escritor é afamado por obra polêmica e completou 62 anos nessa segunda-feira (7). Entre livros que fazem as vezes de lenha de forno para cozinha e “pulgas” que leem o cérebro, suas utopias projetam uma realidade extremada.

Com uma carreira cujo início remonta aos anos 1980, Vladímir Sorókin tem a obra associada desde sempre ao choque e ao sensacionalismo.

Mestre de diversos estilos literários, ele adorava desconstruir seus textos, baixando-os ao nível de uma ultraviolência absurda.  

Sorókin estava bem em seu lugarzinho, descrevendo massacres, perversão e coprofagia (o ato de se alimentar de excrementos), e, assim, sua reputação era um tanto escandalosa.

Mas, a partir de 2006, com  o romance “O dia do Oprítchnik”, ele mudou de abordagem, concentrando-se em descrever o mundo imaginário de um futuro não tão distante.

A ação de seus últimos romances, “Telluria” (2013) e “Manaraga” (2017) ocorre na segunda metade do século 21.

O mapa-múndi no futuro distópico de Sorókin é bem diferente do nosso: muitos países europeus, entre eles a Rússia, foram divididos em Estados menores, e a vida é bem selvagem.

Mas o progresso nunca para, então esse mundo estranho ainda vê algumas tecnologias revolucionárias.

Unhas de telúrio

O telúrio é um elemento químico que existe no mundo real, mas o metal homônimo do romance de Sorókin é bem diferente.

O telúrio de Sorókin é a droga perfeita para colocar uma pessoa em um estado de êxtase sem fim, levando à uma alta na energia e no intelcto, alegria extrema e até comunicação com os mortos.

“É uma super droga e um caminho espiritual ao mesmo tempo”, descreveu o próprio Sorókin em entrevista.

Para conseguir uma dose de telúrio, é preciso que uma pessoa martele pregos na sua cabeça para que o metal entre em contato direto com o cérebro. Claro que apenas especialistas podem realizar a operação. Eles são chamados carpinteiros e viagem por toda a Eurásia fazendo esse serviço por montes de dinheiro.

O telúrio em si é muito caro, proibido em muitos países e simplesmente perigoso. Há 12% de chances de não sobreviver a uma martelada. Mas isso não impede muita gente do mundo Telluria de buscar o metal precioso e curtir seus efeitos.

Supergadgets

Esqueça smartphones e tablets. No futuro, se Sorókin estiver correto, a humanidade vai usar gadgets muito mais impressionantes.

As “úmnitsas” (“as inteligentes”) são gadgets com inteligência artificial que podem falar com seus donos e mudar de tamanho e de formato.  

Em “Telluria”, Sorókin descreve as “úmnitsas” em forma de livros, imagens, echarpes e outros. Além disso, as pessoas podem se comunicar por meio de hologramas, não apenas vendo, mas também tocando fisicamente seus interlocutores, que estão do outro lado do mundo.

Em “Manaraga”, o escritor cita gadgets ainda mais avançados: as pulgas. Elas são implantes minúsculos no cabelo humano ou direto no cérebro, e dão acesso a toda a informação do mundo.

“Com minhas pulgas, consigo ler em 12 línguas ou fazer qualquer leitura científica”, gaba-se o protagonista de “Manaraga”. Quando um inimigo o rapta e retira suas pulgas por meio de uma cirurgia, ele se vê completamente desolado. No mundo atual, onde as pessoas têm dependido profundamente de gadgets, o cenário não parece distante.

Book-n-grill

A profissão do protagonista de “Manaraga” é bem estranha, aliás: ele ganha a vida queimando livros. De acordo com Sorókin, os livros de papel quase desaparecerão no futuro, substituídos pelas versões digitais, e apenas algumas poucas cópias serão mantidas em museus sob proteção estatal.

Mas como tudo o que é proibido é mais gostoso, caçadores de tesouros roubam esses livros raros e cozinham sobre eles, usando o papel como combustível.

O ato é considerado muito exótico, e uma forma de diversão cara apenas para os ricos. O passatempo tem até nome: 'book-n-grill'.

Além disso, é muito importante saber sobre qual livro cozinhar - romances de detetives baratos não são páreos para um bife delicioso, mas só um romance de Tolstói ou algo do gênero.

Sorókin diz que, com essa metáfora, quis refletir sobre o futuro dos livros. “Acredito que a humanidade não eliminará totalmente os livros impressos. Isso é uma parte do nosso mundo que não pode ser completamente destruída”, disse em entrevista.

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