Pedro, o Grande, era chamado de "trabalhador do trono" por Púchkin. Guache da Galeria Tretiakóv.
Global Look PressPedro, o Grande, fez da Rússia não apenas uma grande potência - ampliando as fronteiras, vencendo a Guerra do Norte, entrando no Mar Báltico e fundando São Petersburgo – mas também uma civilização de fino trato. Foi justamente ele, educado na França e na Holanda, quem obrigou os boiardos ignorantes a deixarem para trás as vestimentas medievais e comer usando garfo e faca.
Para explicar a todos como convinha se portar em sociedade, era preciso produzir um manual com linhas gerais. Assim, mediante decreto do tsar, criou-se o “Espelho Honesto da Juventude”. O livro foi publicado há 300 anos e tinha duas partes: na primeira, continha um guia de como ler e contar corretamente, a segunda focava na etiqueta. Compilamos a segunda parte abaixo:
1. Respeito aos pais e uma mãozinha aos inimigos
Nas primeiras linhas do “Espelho”, os autores ressaltam o respeito ao pai e à mãe. “Quando os pais ordenam algo, é preciso escutar com grande respeito, como um pajem ou um criado”, ensina o livro. Os nobres quase sempre deviam seu sucesso a seus pais, já que os títulos e a fortuna eram hereditários, e estes deviam ser uma autoridade inquestionável: Pedro, o Grande recomenda aos jovens que “não falem sem que seja pedido” diante dos mais velhos e que só se refiram a esses com profundo respeito.
O “Espelho” prescreve que o nobre se porte de maneira cortês até mesmo com os inimigos, não os difamando, e que guardem sua antipatia para si. “Sempre louve os inimigos à distância e, quando eles estão perto, respeite-os e ajude no que for preciso. Da mesma maneira, não fale nada de mal dos mortos”, lê-se no tomo.
2. Simplicidade e diligência para a Rússia crescer
Pedro, o Grande recomenda evitar grandes avaliações de si próprio, pelo menos em público: “Nunca se elogie, nem se deprecie”. Neste mesmo ponto, ele desaconselha o leitor a se gabar de sua linhagem, mesmo que essa seja muito ilustre - no final das contas, isso não é seu mérito. “É preciso esperar que as pessoas em volta o elogiem.”
A obra escrita a mando de Pedro – o qual o poeta Púchkin chamava de “trabalhador no trono” – relembra especificamente o amor ao trabalho. “O jovem nobre deve ser vigoroso, diligente, assíduo e irriquieto, como o pêndulo nos relógios.” O texto ainda diz que se o nobre for esforçado, seus criados também o serão e a Rússia crescerá e florescerá.
3. As moças, a piedade e a castidade
Pedro clama que os jovens da nobreza, de ambos os sexos, sejam verdadeiros cristãos, respeitem o clero e compareçam às missas, além de evitar sucumbir às tentações. “Devassidão, jogo e bebedeiras devem ser evitados. Eles não levam a nada, exceto um grande infortúnio.”
No trecho de “Espelho” dedicado às jovens moças, os autores repetem diversas vezes a importância da castidade e da abstinência antes do casamento. Com repulsa, eles descrevem o comportamento da “moça indecente”: “Ela ri e fala com todos, corre pelas ruas, senta-se com outros homens, canta músicas depravadas. Ela se deleita e se embebeda, percorre as mesas e as cadeiras”. Hoje isso parece a descrição de um baile de formatura qualquer, mas, no século 18, era inaceitável.
4. Modos à mesa para os “porcos”
Do livro, infere-se que os modos à mesa não eram o forte dos nobres russos no começo do século 18. “Não se agarre ao prato antes, não se empanturre como um porco”, recomenda o texto. “Seja o último a pegar o prato quando este for oferecido. Pegue a menor porção e dê o resto para alguém”. A lista de proibições vai além: o nobre não deve lamber os dedos, roer os ossos, limpar a boca com a mão, se coçar, fazer ruídos e fungar.
Mas Pedro, que adorava banquetes tumultuosos na juventude, não proíbe o álcool. Ele apenas recomenda que se “rejeite a bebida álcoolica quando é oferecida e depois a aceite com uma saudação”. Mas relembra que nunca se deve abusar do álcool.
5. Higiene
A ideia de etiqueta no século 18 era bem distinta da de hoje, e trazia noções como a seguinte: “Se as pessoas estiverem de pé ou sentadas em círculo, ninguém deve cuspir dentro do círculo, apenas fora”. De acordo com o “Espelho”, porém, se uma pessoa resolver cuspir deve cobrir todos os rastros: esfregar com o pé ou cuspir em um lenço e jogá-lo pela janela disfarçadamente.
Neste ponto, Pedro também aconselha o leitor a não fungar ou “puxar o ranho e repugnantemente engoli-lo”. Pelo contrário, o representante da nobreza deve assoar seu nariz silenciosamente. O “Espelho” condena os que “assoam o nariz como se estivessem tocando corneta e, assim, assustam as criancinhas”.
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