Enquanto filmava Zinmi, de 8 anos, Vitáli Mânski, que havia concordado trabalhar em conjunto com diretores norte-coreanos, deixava a câmera ligada em segredo enquanto as cenas eram preparadas para parecerem reais.
Аleksandra IvânovaMenção honrosa na competição internacional do É Tudo Verdade 2016, filme "Sob o Sol", de Vitáli Mânski retrata o dia a dia de uma família norte-coreana, revelando os segredos da máquina de propaganda do país. O diretor falou com a Gazeta Russa sobre o título:
Por que você decidiu filmar na Coreia do Norte?
Sempre me interessei pela questão do por que existem sociedades totalitárias. Por que o homem não cede tão fácil sua única vida, cede-a a esse sistema? Lidar com isso com a ajuda do cinema documental baseado em arquivos e lembranças é difícil. Por isso eu voltei minha atenção aos países onde esses regimes se mantiveram. Apesar de que eu não tinha nenhuma esperança de rodar um filme sobre a Coreia do Norte. Eu pensei sobre isso, almejei isso, e como resultado meu desejo se tornou realidade.
Como você conseguiu acordar com os camaradas da Coreia do Norte sobre a filmagem?
As negociações duraram quase dois anos. Posso caracterizar os acordos com os norte-coreanos como um constante escutar e captar suas posições. Todos os acordos levaram a que, um dia após o outro, nós concordássemos com suas condições e exigências.
Mânski posa em frente a monumento em Pyongyang. Foto: Aleksandra Ivânova
Tanto o roteiro quanto os protagonistas do filme foram indicados justamente pela Coreia do Norte?
O roteiro do filme em si é sobre a vida de pessoas reais, com seus diálogos, cenas de suas vidas, mas essas foram escritas pelos camaradas norte-coreanos antes. Apesar de conseguir escolher eu mesmo a personagem principal, me deram só 10 minutos para fazê-lo em um encontro com 5 candidatas.
Argumentaram que s meninas estavam muito ocupadas. Mas eu consegui dar de 2 a 3 perguntas e já com base nelas escolhi a Zinmi. Ela disse que seu pai era jornalista: eu pensei que fosse conseguir ir com ele a algum lugar, filmar alguma coisa interessante. A mãe trabalhava no refeitório da fábrica.
Eles viviam perto da estação de trem, em um apartamento de um quarto, ela, a mãe, o pai, a avó e o avô...
Mas quando chegamos para filmar, me disseram que o pai dela já não era jornalista, que trabalhava como engenheiro em uma fábrica-modelo de costuras, que a mãe era funcionária em uma fábrica-modelo de laticínios. E eles viviam, os três, em um apartamento chique de três quartos no melhor prédio de Pyongyang, com vista para o rio e para os monumentos à Ideologia Juche.
Mas, durante as filmagens, eu percebi que os móveis do apartamento eram completamente novos, os armários estavam vazios, o banheiro não era usado. Imediatamente surgiu a desconfiança de que o apartamento chique tinha sido cedido para o período das gravações.
Você teve ajudantes norte-coreanos?
Havia cinco pessoas acompanhando, que formalmente eram considerados nossos ajudantes, mas na verdade não faziam nada do que pedíamos. Nós também percebemos que por todo lado havia um grupo perto de nós que se repetia e fazia de conta que não estava conosco. Era o segundo grupo de acompanhantes que nos foi destacado.
Fonte: YouTube/ PÖFF
Como você conseguiu chegar a um acordo com os atores?
Não tivemos problemas com ninguém, porque eles não prestavam atenção aos nossos desejos e sim, 100%, em se submeter às ordens que lhes davam os acompanhantes das filmagens. E justamente essa situação os protege de problemas hipotéticos que poderiam surgir na Coreia do Norte.
Não era possível surgir nenhuma reclamação sobre o governo por parte dos personagens por um motivo simples: eles não faziam nada por vontade própria, só cumpriam ordens. Ao ponto de lhes dizerem até como e onde se levantarem, como olhar etc.
Em uma entrevista você disse que o ministro da Cultura da Federação da Rússia pediu que fosse retirado dos créditos do filme após Pyongyang proibir sua exibição. Isso foi iesperado para você?
Eu não imaginei isso, porque considerava que a Rússia fosse um Estado soberano, sim, e no filme não infringimos a legislação russa. Além disso, eu já tive experiência semelhante, quando rodei um filme sobre o Dalai Lama. Então, a embaixada da China emitiu um comunicado afirmando ser inadmissível que os russos fizessem um filme sobre Dalai Lama, e ainda mais que o incluíssem no programa do festival Estatal.
Mas, então, a chefia do Festival de Moscou respondeu que era só da nossa conta os filmes que passávamos e, como resultado, o filme continuou a ser exibido e continuou na competição.
Aparentemente, a Rússia era ainda outro país em 2008, e em 2015 ela já havia mudado muito.
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