A torta de Arkhangelsk

Uma arte pictórica peculiar, que abrange desde a iconografia do norte até as não menos famosas pinturas decorativas dos artigos de uso doméstico, foi preservada Foto: Lori / Legion Media

Uma arte pictórica peculiar, que abrange desde a iconografia do norte até as não menos famosas pinturas decorativas dos artigos de uso doméstico, foi preservada Foto: Lori / Legion Media

O “ribnik” é um prato de peixe tão simples, austero e harmonioso como o caráter do local onde foi criada: a província de Arkhangelsk, no litoral norte da Rússia Europeia.

Os habitantes da província de Arkhangelsk, unidade federativa russa às margens do Mar Branco, até hoje se destacam da massa dos russos devido a seu dialeto e caráter peculiar.

No norte da Rússia nunca existiu o regime de servidão e o povo local, que desde tempos imemoráveis se ocupava da pesca, caça e do comércio com a Escandinávia, sempre se distinguiu por sua coragem e engenhosidade.

Ainda hoje, traços do antigo modo de vida desse povo podem ser descobertos nas florestas remotas de Arkhangelsk. Ali, podem ser encontrados os adeptos da ortodoxia anterior à reforma, os "velhos crentes", cujos costumes patriarcais remontam ao século 18.

Uma arte pictórica peculiar, que abrange desde a iconografia do norte até as não menos famosas pinturas decorativas dos artigos de uso doméstico, foi preservada. Da mesma maneira, sobrevive a antiga culinária russa.

Uma das pérolas da culinária local é o ribnik, uma receita artesanal na qual a massa que será assada é recheada com um peixe praticamente inteiro com cabeça e barbatanas.

Duas condições são indispensáveis para essa receita: o peixe deve ter poucas espinhas e estar muito fresco. 

O “ribnik” deve ser consumido quente. Quando frio, perde seu atrativo Foto: Lori/Legion Media

Para que o produto da pescaria do dia esteja pronto para o recheio, ele deve ser limpo, as vísceras retiradas, acrescido de sal, pimenta e um pouco de cebola crua.

Como o ribnik é um prato sobretudo de pescadores, o peixe a ser usado pode ser de variedades distintas.

À beira-mar, pode ser utilizado o alabote, o lobo marinho, assustador na aparência, mas de sabor muito suave, e o bacalhau, que quando fresco é radicalmente diferente do entediante habitante das geladeiras que conhecemos.

Junto a rios e lagos do Norte os representantes da família Coregonidae (de peixes brancos) são reconhecidos como os reis do ribnik, desde o peixe branco lacustre, de tamanho razoável, até o pequenino coregono branco, cujo comprimento não ultrapassa a palma da mão.

O “ribnik” da cidade de Arkhangelsk é uma torta fechada na qual a massa de farinha de trigo, de centeio ou mista, recobre o recheio de todos os lados, sendo que a camada superior da torta pronta é cortada, retirada e servida separadamente.

Existe um segundo segredo em relação a este prato: ele não pode ser preparado em qualquer lugar, nem é qualquer fogo que lhe serve. O verdadeiro “ribnik” só fica perfeito se for assado no forno do fogão russo.

Uma construção maciça, o fogão russo, por vezes, ocupa a metade da moradia. Projetado para funcionar em um clima frio de 40 graus negativos, essa estrutura tem numerosas particularidades de design, sendo a principal delas a disposição da tubulação de saída, que não se encontra atrás da câmera onde é queimado o combustível, mas sim na frente dela.

Seu forno demora muito para aquecer, mas conserva o calor por um tempo ainda mais longo. Seu peculiar regime de temperatura permite que nele sejam preparados pratos desconhecidos além dos limites da culinária russa.

É precisamente no forno do fogão russo que a massa, que para o “ribnik” é relativamente grossa, com no mínimo um centímetro de espessura, fica perfeitamente assada: por baixo de uma crostinha crocante encontra-se uma camada tenra e porosa, impregnada de aroma do peixe.

O “ribnik” deve ser consumido quente. Quando frio, perde seu atrativo. Infelizmente, os fogões russos são pouco utilizados atualmente e a chance de encontrar um “ribnik" legítimo, e não sua imitação, feita em um forno comum, existe apenas nas remotas regiões do Norte. 

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