As armas nucleares são uma séria preocupação para a humanidade hoje, mas, de certo modo, sua criação ajudou a por um ponto final na era das grandes guerras mundiais. A certeza de destruição mútua obrigou as superpotências a abaixar a guarda e buscar um diálogo, enquanto antes os conflitos costumavam prevalecer.
Nuvem radioativa sobre a cidade de Nagasaki (Japão), observada a uma distância de 9,6 km (Foto: Getty Images)
Nos primeiros anos da era atômica, os Estados Unidos lideravam a tecnologia. Em agosto de 1945, Washington demonstrou o poder devastador das armas nucleares ao lançar duas bombas sobre o Japão, enviando, assim, um alerta a países fora do bloco ocidental em formação. No entanto, a situação mudou em 29 de agosto de 1949, quando a União Soviética testou sua própria arma nuclear.
E foi dada a largada
A ideia de que a energia colossal liberada quando o átomo de urânio é dividido poderia ser usada para fins militares foi abordada pela primeira vez por físicos no final dos anos 1930. Os pioneiros foram os alemães, que fizeram mais avanços do que os outros países no desenvolvimento da base teórica para o programa nuclear.
O projeto atômico alemão já estava em funcionamento no verão de 1939. Alguns físicos que fugiram da Alemanha após a ascensão de Hitler rapidamente perceberam a que a conclusão bem-sucedida do projeto poderia levar. Os alemães tinham, portanto, que se antecipar – e quanto mais cedo, melhor.
Em agosto de 1939, o então presidente dos EUA, Franklin Roosevelt, recebeu uma carta do cientista Albert Einstein. O Prêmio Nobel de Física chamou a atenção do para o fato de que os nazistas estavam conduzindo pesquisas para desenvolver uma arma nuclear e propôs que a implementação de um projeto semelhante fosse iniciada em território norte-americano.
Nos dois anos seguintes, verbas significativas foram realocadas para tal finalidade, e algumas das maiores mentes da época, incluindo Niels Bohr e Edward Teller, foram recrutados para a missão.
Primeiro teste com bomba atômica americana, conhecido como Projeto Manhattan, em 16 de julho de 1945 (Foto: AP)
A União Soviética tinha plena ciência de tudo o que estava acontecendo do outro lado do oceano. Os físicos soviéticos sabiam do trabalho de seus colegas estrangeiros, e a inteligência soviética tampouco permaneceu ociosa. Em junho de 1940, por exemplo, eles estavam atentos aos primeiros estudos americanos sobre o urânio 235.
Um ano e meio depois, quando a Grande Guerra Patriótica já havia começado (depois da invasão da Rússia pela Alemanha), chegou uma notícia ainda mais alarmante: a Grã-Bretanha poderia desenvolver uma arma nuclear já em 1943. Isso significava que os alemães, cujas tropas já estavam próximas de Moscou, também deveriam estar perto de possuir uma arma nuclear. E a União Soviética estava atrasada na corrida.
Físicos e espiões em serviço
Informações sobre os avanços dos países ocidentais no desenvolvimento de armas nucleares chegavam constantemente ao Kremlin. O líder soviético Iossef Stálin logo percebeu que se tratava de uma questão vital para o destino da Rússia, e seu veredito foi claro: “Nós não temos a bomba: estamos trabalhando mal!”.
Os alemães haviam sido detidos nos arredores de Moscou, e um avanço no guerra já era esperado. Mas ninguém poderia garantir que a situação não mudaria se os alemães tivessem a ‘superarma” em mãos. As conquistas dos norte-americanos e britânicos também eram vistas com alarde: se tivessem uma bomba atômica, poderiam vencer Hitler por conta própria e, posteriormente, ameaçar a União Soviética.
Em setembro de 1942, a liderança soviética autorizou a fundação de um laboratório especializado para trabalhar no projeto nuclear – este foi, precisamente, o começo da história do programa atômico soviético. A equipe era formada por um grupo pequeno de físicos, porém altamente capacitados, sob o comando geral de Ígor Kurtchatov, que é hoje considerado o pai da bomba atômica soviética.
Iúli Khariton era um dos físicos russos envolvidos no projeto nuclear (Foto: Valentin Tcheredintsev/TASS)
Os serviços de inteligência também cooperavam estreitamente com os cientistas. A rede de espionagem soviética nos EUA mantinha um quadro completo do progresso do projeto atômico americano e até conhecia a localização de seu principal centro de pesquisa. Físicos nucleares norte-americanos que simpatizavam com a URSS também prestaram ajuda significativa. Graças a eles, os projetos da bomba americana já estavam na mesa de Kurtchatov duas semanas depois de ter sido criada, em 1945.
Fim do monopólio americano
A Alemanha nazista acabou sendo derrotada sem o uso de armas nucleares. As bombas atômicas que os americanos lançaram em Hiroshima e Nagasaki, em agosto de 1945, foram, em grande parte, simbólicas. Era a maneira de Washington de proclamar ao mundo inteiro que já possuía a ‘superbomba’ – mensagem esta que tinha Moscou como principal destinatário.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, os antigos aliados da coalizão anti-Hitler se encontraram em lados diferentes das barricadas. Os militares americanos e britânicos elaboraram planos para uma possível guerra contra a URSS. Na época, chegaram a propor o bombardeio de grandes cidades soviéticas com o uso de armas nucleares.
Isso só poderia ser evitado com o fim do monopólio nuclear norte-americano. Duas semanas após a destruição de Hiroshima, um comitê especial foi estabelecido sob as ordens de Stálin para coordenar todo o projeto da bomba atômica. Em outras palavras, isso significava a criação de um superministério com enormes verbas e poderes.
Sob a liderança um dos associados mais próximos de Stálin, Lavrenti Beria, um novo setor industrial nasceu na União Soviética em um curto período de tempo – a indústria atômica. Usinas de enriquecimento de urânio, reatores, centrífugas e fábricas para produzir bombas foram desenvolvidas em poucos anos.
Instalação multimídia criada pela estatal Rosatom para celebrar o 65º aniversário do primeiro artefato nuclear soviético (Foto: Maksim Blinov/RIA Nôvosti)
Na Sibéria e nos Urais, novos complexos industriais foram construídos nas profundezas das montanhas, das quais eram extraídas centenas de toneladas de rocha sólida. Em torno delas surgiram cidades inteiras que não figuravam nos mapas oficias. Somente as pessoas ligadas ao programa atômico sabiam de sua existência.
A liderança em Washington estava convencida de que a URSS não seria capaz de fabricar armas nucleares antes de 1954. No entanto, um teste de armas nucleares no campo de Semipalatinsk (no atual Cazaquistão), ainda em 1949, soou como uma surpresa desagradável para os EUA. A União Soviética havia conseguido acabar com o monopólio nuclear dos norte-americanos e, desse modo, lançar os alicerces para a segurança internacional na qual o mundo repousa até hoje.
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